TCU alerta risco em estratégia do governo de considerar piso da meta para limitar orçamento

O Tribunal de Contas da União (TCU) alertou o governo que o risco de descumprimento da meta anual de resultado primário se eleva com a estratégia da equipe econômica de limitar o orçamento tendo como referência o piso inferior da banda fiscal, e não o centro da meta. O arcabouço fiscal admite que o resultado fiscal ao fim do ano seja pior que o alvo definido em 0,25 ponto porcentual. Neste ano, isso significa que a União pode registrar um déficit de R$ 28,8 bilhões, tendo em vista a meta de zerar o rombo do primário. Até agora, o governo tem conseguido manter o déficit dentro dessa tolerância, concluindo, por isso, que não haveria necessidade de limitação de empenho e de movimentação financeira do orçamento.

Esse comportamento, contudo, levantou uma preocupação na área técnica da Corte de Contas. A análise foi feita no processo de acompanhamento sobre o 1º relatório bimestral de avaliação de Receitas e Despesas, julgado ontem pelo plenário do TCU. No documento escrutinado pelo tribunal, divulgado em março, o governo havia projetado um déficit primário de R$ 9,3 bilhões (-0,08% do PIB), resultado inferior ao centro da meta, mas superior ao limite interior da banda. A única ação tomada à época foi a realização de um bloqueio de R$ 2,9 bilhões, mas em razão do excesso de despesas sujeitas ao limite – movimento que foi revertido no 2º relatório bimestral.

“Diante de tais projeções atualizadas, a publicação conclui que, ‘considerando o limite inferior da meta de resultado primário, as projeções não indicam necessidade de limitação de empenho e de movimentação financeira’. Nota-se, portanto, que o Poder Executivo está considerando o atingimento do limite inferior do intervalo de tolerância da meta fiscal, e não o centro da meta em si, para definir pela necessidade ou não da aplicação da limitação de empenho e movimentação financeira”, observou a área técnica do TCU, para quem, além de elevar o risco de descumprimento das metas anuais, a estratégia pode afetar a credibilidade das regras fiscais e comprometer a gestão fiscal dos próximos anos.

Questionada pela Corte, a Secretária de Orçamento Federal (SOF) confirmou o procedimento. Ao tribunal, a SOF afirmou que a limitação de empenho e movimentação financeira tem como referência a possibilidade de descumprimento da meta, o que ocorrerá somente se for ultrapassado o limite inferior do intervalo de tolerância, de acordo com o arcabouço fiscal.

“Nesse contexto, alega-se que, como o cumprimento da meta fiscal estaria comprometido somente se projetado resultado primário menor que o limite inferior, apenas nesse caso a impositividade de execução da despesa se sujeitaria à regra fiscal. Ou seja, dado que o cumprimento da meta de resultado primário se dá legalmente na observância do limite inferior, então este se torna o patamar de referência para adoção de medidas de limitação de empenho. Dessa forma, o instrumento de limitação de empenho somente poderia ser utilizado no caso de projetado descumprimento do limite inferior da meta fiscal”, descreveu a unidade técnica, observando que a Secretaria do Tesouro Nacional fez registro ao TCU no mesmo sentido.

A Corte de Contas, por sua vez, avaliou que, ao conduzir a política fiscal tendo como foco o limite inferior da meta, ainda que amparado na lei, o governo assume um risco mais elevado de descumprimento do alvo. Isso porque, em que pese o instituto da limitação de empenho e movimentação financeira exista exatamente para preservar o atingimento das metas fiscais, ele possuiria limitações, escreveram os técnicos, em avaliação que foi validada pelos ministros do TCU. Um limitação estaria, por exemplo, no caso de frustrações de receitas relevantes ocorridas nas últimas semanas do ano, em que pode não haver tempo hábil para o governo promover um contingenciamento extemporâneo.

“Oportuno também enfatizar que, com o advento do Regime Fiscal Sustentável, as consequências diante de eventual descumprimento da meta de resultado primário se tornaram mais rígidas”, observou o TCU. Esse foi o único alerta feito pelo plenário da Corte de Contas sobre o 1º relatório bimestral do governo.

No documento relativo ao segundo bimestre, divulgado em maio, a equipe econômica anunciou a reversão do bloqueio de R$ 2,9 bilhões em despesas discricionárias, em razão de um espaço aberto no limite de gastos, embora tenha revisado para pior estimativa de déficit primário de 2024, de R$ 9,3 bilhões para R$ 14,5 bilhões.