Por dois votos a um, o Tribunal de Contas do Município (TCM) de São Paulo decidiu que a Prefeitura da capital só poderá fazer a concessão do Estádio do Pacaembu, na zona oeste, se republicar o edital de licitação do processo, dar novos prazos para empresas interessadas em apresentar propostas e formalizar, com o governo do Estado, a posse do estádio, cuja propriedade passou a ser alvo de dúvidas. Na prática, a concessão do Pacaembu, bandeira de governo da gestão Bruno Covas (PSDB), foi liberada, mas só poderá ser retomada quando a Prefeitura acatar as novas condições.

O impasse, que se mantém há um mês, deixa em suspenso a possível concessão a uma empresa privada que, por um prazo de 15 anos, iria administrar o complexo esportivo e fazer obras para aumentar as receitas geradas no local. É um contrato estimado em R$ 675 milhões.

Entre as empresas interessadas, há o grupo WTorre, que já administra o Allianz Parque, a arena do Palmeiras, também na zona oeste; a Universidade Brasil, que tem entre os associados no projeto o time do Santos; e duas construtoras. Contrários à concessão, moradores do bairro do Pacaembu, que temem que a concessão poderia trazer de volta ao estádio grandes shows.

O governador Márcio França (PSB), adversário político do ex-prefeito João Doria (PSDB) na disputa pelo governo do Estado, já havia se manifestado contra a concessão, que seria a primeira a sair do Plano Municipal de Desestatização prometido por Doria e, agora, tocado pelo seu ex-vice, Bruno Covas.

A licitação deveria ter ocorrido há três semanas, mas foi suspensa pelo TCM após um questionamento técnico: parte dos conselheiros acharam irregular o fato de o edital da licitação permitir que os consórcios interessados no contrato usarem, para preencher os requisitos de capacidade técnica, atestados de outras empresas. A licitação exige que uma empresa com experiência em gestão de estádios faça parte do negócio.

Na sessão desta quarta, que criou essas condicionantes para a liberação da licitação, o relator do processo no TCM, Domingos Dissei, havia decidido que a licitação deveria seguir, mas terminou sendo voto vencido, o que já havia ocorrido nas sessões de julgamento anteriores.

Dissei citou parecer técnico feito pela assessora jurídica chefe do tribunal, Egle dos Santos Monteiro, para liberar o processo. “Entendo que o certame poderia ter continuidade tão somente se condicionado à apresentação por todos os licitantes de declaração expressa e sob as penas da lei, de que não fizeram uso do referido dispositivo”, escreveu a assessora.

Ou seja: se as quatro empresas interessadas não quisessem usar um atestado técnico de uma terceira empresa, a licitação poderia seguir.

“Diante dos elementos carreados aos autos e dos bem lançados pareceres dos Órgãos Técnico e Especializado deste Tribunal, fundamentado nos argumentos da Assessoria jurídica de Controle Externo, cujas razões incorporo, acolho a solução proposta pela dra. Egle dos Santos Monteiro, e voto pela revogação da suspensão da concorrência, para permitir a continuidade do certame”, escreveu Dissei, em seu voto.

Ocorre que os conselheiros Edson Simões e Maurício Faria tiveram entendimento diferente. Citando também os problemas apontados pelo corpo técnico do órgão, eles decidiram que a continuidade só poderia ocorrer se quatro mudanças fossem adotadas pela Prefeitura: além de uma republicação do edital, com as mudanças nas exigências de capacitação, os conselheiros pedem que a Prefeitura dê novos prazos para recebimento de propostas e ainda torne nulo o ato de recebimento de envelopes já feito pela Prefeitura há duas semanas. E cita necessidade de solução da questão da posse do estádio.

O conselheiro Roberto Braguim não participou da sessão. Com dois votos a um, o presidente do TCM, João Antônio, não precisou votar. Dissei foi, mais uma vez, voto vencido.

Concessão divide conselheiros

A Prefeitura é contrária às mudanças no edital pedidas pelo TCM e vinha afirmando que o edital estava redigido de forma a ser menos restritivo, para facilitar a participação de mais empresas e, assim, estimular a competição. Por isso desobrigava que a empresa com capacidade para gerenciar estádios tivesse, obrigatoriamente, de fazer parte do consórcio que poderia assumir a concessão do Pacaembu.

A suspensão inicial da licitação se deu após atritos entre os conselheiros. O relator Dissei havia se manifestado pela liberação da licitação e nem levaria o assunto ao plenário, como é praxe no TCM, mas os demais conselheiros decidiram também se manifestar sobre o assunto e suspenderam a licitação.

O impasse inicial foi acrescido de outro ponto visto com ressalvas pelos conselheiros. No último dia 16, após a determinação de suspensão do edital, a Prefeitura decidiu receber os envelopes das propostas comerciais de empresas interessadas. E quatro grupos deixaram seus envelopes em poder da Secretaria Municipal de Esportes. Mas, por causa da suspensão do TCM, os envelopes foram lacrados, sem que se conhecesse a proposta vencedora. Agora, essa sessão terá de ser anulada para que o processo prossiga.

Naquela mesma data, o governador do Márcio França divulgou nota trazendo a questão da propriedade do estádio. Embora tivesse sido construído pela Prefeitura, o terreno do Pacaembu foi doado ao governo do Estado, e a transferência da posse para a Prefeitura nunca foi formalizada, segundo técnicos dos dois governos e, também, segundo apuração preliminar do próprio TCM.

A Prefeitura não irá comentar, por ora, a decisão do TCM. O jornal O Estado de S. Paulo questionou também o governo do Estado sobre o tema e aguarda uma manifestação.