Os talibãs exigem uma nova Constituição para o Afeganistão e propuseram um “sistema islâmico inclusivo” para dirigir o país – disse um de seus representantes durante uma reunião realizada em Moscou, nesta terça-feira (5), com figuras políticas afegãs.
A mesa de diálogo entre talibãs e opositores ao governo de Cabul aconteceu em Moscou apenas uma semana depois de uma rodada de negociações entre os talibãs e negociadores dos Estados Unidos em Doha.
Tanto as conversas de Doha quanto as de Moscou excluíram a participação do governo afegão, que fica, na prática, de fora das tratativas para pôr fim a um sangrento conflito de 17 anos.
Talibãs oraram junto com figuras políticas, com as quais mantiveram um duro embate. Entre elas, estava o ex-presidente Hamid Karzai. Na sequência, discutiram uma visão conjunta para o futuro do país.
“A Constituição atual do governo de Cabul não é válida. Foi importada do Ocidente. É confusa e contraditória e, além disso, é um obstáculo para a paz”, disse o chefe do escritório político mantido pelos talibãs no Catar, Sher Mohammad Abbas Stanikzai.
“A nova Constituição será redigida pelos ulemás (autoridades religiosas) e universitários em um ambiente livre. Queremos uma Constituição islâmica”, acrescentou.
Os talibãs iniciaram conversas com enviados dos Estados Unidos em Doha, no final de janeiro. Negam-se a discutir com as autoridades afegãs, porém, por considerá-las “marionetes” de Washington.
Segundo Stanikzai, os talibãs – que governaram o Afeganistão entre 1996 e 2001 aplicando uma interpretação radical do Islã – “não desejam o monopólio do poder, mas um sistema islâmico inclusivo”.
O conflito no Afeganistão deixou milhares de mortos e feridos, mas Stanikzai garantiu que, se as conversas de paz avançarem, as organizações humanitárias poderão entrar “sem risco” nos territórios controlados pelos talibãs.
Já Muhammad Ghulam Jalal, líder da diáspora afegã e um dos organizadores da reunião em Moscou, declarou que “as partes estão prontas para um acordo. É um bom começo”.
A reunião incluiu duas mulheres, que participaram da delegação que representava a oposição ao governo. Durante sua “gestão”, os talibãs se tornaram conhecidos pelas severas restrições impostas à atividade pública das mulheres.
Talibãs e representantes dos Estados Unidos devem ter uma nova rodada de conversas em Doha, em 25 de fevereiro.
– Rede de mulheres pede garantias
Uma rede de mulheres afegãs pediu, nesta terça, às autoridades de seu país que velem para que suas liberdades, dificilmente garantidas, não sejam afetadas nas negociações em curso com os talibãs.
Em um comunicado divulgado antes da reunião em Moscou, a rede afegã de mulheres, que conta com 3.500 inscritas e 125 organizações, disse que não aceitará uma paz em detrimento da liberdade das mulheres.
“Nos últimos 17 anos, as mulheres afegãs conseguiram avanços com dificuldades. Não queremos perdê-los. Se eles (os talibãs) voltarem e impuserem restrições aos (direitos das) mulheres, não aceitaremos”, disse à AFP a coordenadora da rede, Mashal Roshan.
“É nosso direito ir para a escola e trabalhar, e todo mundo deveria respeitar isso”, acrescentou.
“Não é necessário reinterpretar a vida das mulheres afegãs. Em virtude de sua interpretação brutal da ‘sharia’, os talibãs confinaram as mulheres a suas casas, não autorizando-as a sair a não ser que seja sob custódia masculina e escondidas sob uma burca”, acrescentou o comunicado.
Durante a permanência dos talibãs no poder no Afeganistão (1996-2001), a escola era proibida para as meninas, as mulheres não podiam trabalhar, e seus movimentos eram bastante restringidos.
Por meio de seu porta-voz, Zabihullah Mujahid, os talibãs disseram recentemente à AFP que “não se opõem” à educação das meninas e ao trabalho das mulheres.