A candidata Tabata Amaral (PSB) emerge como uma peça-chave na disputa pela Prefeitura de São Paulo na última semana de campanha em 2024. Ao contrário do que costuma ocorrer nas semanas finais, a candidata não ‘derreteu’ nas pesquisas e pode influenciar a definição do segundo turno, de acordo com especialistas ouvidos pelo site IstoÉ.

Nos últimos dias, Tabata viu seu apoio crescer nas pesquisas, o que acendeu um alerta nos adversários. Internamente, as campanhas avaliam como remotas as chances da deputada chegar ao segundo turno. A preocupação é que o eleitorado de Tabata ‘desvie’ votos importantes de outros candidatos na reta final.

Na pesquisa da Quaest, Tabata subiu de 8% para 11% em apenas uma semana. Na Atlas, também oscilou positivamente em 1,1 ponto percentual entre os dias 23 e 30 de setembro.

O cientista político e professor da ESPM Paulo Ramirez acredita que o crescimento se deve aos acenos mais moderados da candidata do PSB em meio às brigas protagonizadas pelos adversários nos debates. Ele ainda vê a naturalidade de Tabata ao se expressar e a firmeza em ataques contra Pablo Marçal (PRTB) como outros pontos favoráveis à campanha da deputada.

“Entre os fatores que colaboram para o crescimento da Tabata está a briga generalizada entre Marçal, Boulos e Nunes. Isso faz com que ela atraia o voto dos mais moderados, dos femininos e de alguns religiosos após se declarar evangélica”, afirma.

“Paralelo a isso, ela tomou algumas atitudes mais agressivas que a colocaram como protagonista nas últimas semanas. Ela falou palavrão do debate, atacou o Marçal, o Nunes, mesmo que suavemente ela conseguiu atrair maior visibilidade à sua candidatura”, completa.

Yuri Sanches, diretor da Atlas Intel, avalia que os ataques a Marçal fazem parte de uma estratégia bem elaborada pela campanha, que envolve as rebatidas de provocações do ex-coach. Ele ainda vê o foco na apresentação de propostas nos debates como mais um exemplo para a subida nas pesquisas.

“Acredito que o trunfo da Tabata seja ter conduzido a campanha de maneira muito hábil, se destacando seja em termos de propostas durante os debates — coisa que vimos pouco dos demais candidatos– mas também no enfrentamento direto, principalmente ao Marçal”, avalia.

Tabata ainda tem conquistado votos importantes no centro financeiro do país: a Faria Lima. Esse público é foco das três principais campanhas, sendo que duas delas buscam o protagonismo entre os banqueiros. Fugindo de todas as previsões, o Brazil Journal, um dos mais conceituados do mercado financeiro, publicou um editorial em que declarou apoio à deputada.

O “fator Tabata” deve incomodar, principalmente, Ricardo Nunes (MDB). O atual prefeito divide os votos do campo de centro com a parlamentar. Na avaliação de Bruno Soller, diretor da Real Big Data, Nunes tem um voto instável e, com o desenrolar da semana, pode enfraquecer a campanha do emedebista.

“A Tabata é muito importante nessa reta final. Ela pode atrapalhar o [Guilherme] Boulos (PSOL), ela pode atrapalhar o Nunes e definir o cenário, sim”, afirma.

“Nunes tem um voto muito pouco convicto. É um voto de rejeição dos dois lados. Isso faz com que a Tabata cresça. Mas esses votos do Nunes também podem ir para o Marçal, já que existem muitos bolsonaristas que ainda dão aquele voto envergonhado”, completa.

Caso isso se concretize, a deputada poderá ajudar Pablo Marçal a alçar uma vaga no segundo turno com Guilherme Boulos (PSOL). A ajuda improvável pode vir após Marçal e Tabata protagonizarem diversos enfrentamentos após falas misóginas do ex-coach e de acusações envolvendo o suposto abandono da parlamentar ao pai.

Para tentar reverter a baixa porcentagem nas pesquisas, Tabata resolveu mudar sua estratégia e passou a mirar nos líderes na disputa, além de Marçal. Ao falar de Nunes, a deputada atacou a gestão educacional do prefeito, com foco maior nos índices do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

Ela ainda surpreendeu e tirou um coelho da cartola ao investir em Boulos nos últimos dias. A aliada do ministro Márcio França (Empreendedorismo) chegou a atacar o psolista ao questioná-lo sobre aborto e o regime de Nicolás Maduro.

Mesmo com a tentativa, especialistas acreditam que a estratégia pode não dar certo. Ao contrário de Ricardo Nunes, Boulos tem seus votos consolidados e já arma um movimento com artistas para o voto útil, o que poderá prejudicar a deputada no dia 6 de outubro.

“Boulos tem seus votos mais consolidados. Acho muito difícil ele perder votos nessa reta final. Mas a Tabata pode ajudar o Pablo arrancando os votos do Nunes”, opina Soller.

“Eu não acredito que um possível crescimento da Tabata Amaral faça Boulos ser gravemente prejudicado. O eleitorado do psolista tem um certo piso, existem argumentos para manter essa base mobilizada, o que dificulta um movimento de migração para a Tabata ou para outro candidato”, afirma Yuri Sanches.

O diretor da Atlas Intel ainda vê potencial de crescimento de Tabata após o debate da TV Globo, que será realizado na quinta-feira, 3. Na visão dele, uma possível confusão pode desgastar ainda mais a imagem de candidatos “briguentos” e afugentar os eleitores indecisos.

“Acredito que a Tabata possa crescer no último debate da Globo caso ele seja muito caótico, se os candidatos não discutirem propostas e seguirem esticando a corda da paciência do eleitor com um show de horrores, como a gente já viu acontecer”.

“Isso pode esgarçar a paciência do eleitor, e muitos acabam deixando para a última hora a decisão do voto, o que pode beneficiar um candidato que consiga articular de uma forma mais moderada, mais objetiva e efetiva, com um comportamento que os eleitores julguem como mais sério para um prefeito de São Paulo”, completa Yuri Sanches.

Apesar dos pontos favoráveis, Paulo Ramirez vê dificuldades no caminho para Tabata chegar ao segundo turno. O cientista político acredita que ela pode ter forte influência na escolha de apoios, mesmo que os acordos tendem a ser protagonizados pelas executivas nacionais.

“Mesmo com o crescimento dela, é muito difícil que ela consiga chegar ao segundo turno. Ela terá um papel importante para as alianças do segundo turno. É preciso analisar o movimento dela de apoio, já que o segundo turno deve ser modelado pelas alianças nacionais. Provavelmente, o PSB da Tabata deve ir com Boulos”, ressalta.

Debate da Globo e reações de Marçal

O debate da Globo é outro fator que pode ser decisivo para os rumos da última semana de campanha. O encontro deve sanar as dúvidas dos eleitores, principalmente entre os que ainda não decidiram o voto.

As pesquisas espontâneas apontam para uma tendência de mudança de votos. Ou seja, os eleitores apontam para um candidato na espontânea, mas abrem a possibilidade de trocar seu candidato quando se apresenta os nomes dos postulantes.

Nesse cenário, o mais afetado também pode ser Nunes. O atual prefeito tem o apoio oficial do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas não tem 100% dos bolsonaristas, que se dividem entre a campanha do emedebista e a de Marçal.

“Nessa reta final, há um empate triplo na espontânea, que mostra mais decisão no voto. O que podemos tirar disso: existe um público que fala na estimulada em um nome, mas que pode mudar de voto. Por exemplo, muita gente poderá migrar seu voto do Nunes para o Marçal”, aponta Bruno Soller.

É pensando na disputa desses votos que os candidatos estão moldando suas estratégias para o encontro de quinta-feira. O principal foco é aumentar a rejeição do adversário, além do interesse no voto útil.

Boulos e Nunes devem manter os ataques moderados entre si, com foco maior no passado. O emedebista deve associar o adversário às invasões de propriedades privadas, enquanto a tendência do psolista é manter as reiteradas citações sobre problemas na gestão e investigações que rondam o prefeito.

Entre os três primeiros, a incógnita fica com Marçal. A promessa de se tornar um novo candidato e realçar suas propostas não foi para frente, e o candidato do PRTB intensificou ataques contra os adversários nos últimos dias.

No debate do UOL/Folha, o ex-coach voltou a associar Boulos ao uso de drogas, retomou as acusações de violência doméstica contra Nunes e investiu em atacar Tabata. O embate com a deputada tinha cessado após o início oficial da campanha, em agosto, após as falas polêmicas que afastaram o público feminino de sua candidatura.

Entre os ataques, Marçal chamou Tabata de “talarica” e afirmou que “mulher inteligente não vota em mulher”. Nas redes sociais, o candidato do PRTB ironizou o projeto Pé de Meia, após a autoria do projeto – que a parlamentar se credita – ser colocada em xeque.

“Muito dessa reta final será definida  com base na estratégia que Marçal vai adotar tanto nos debates quanto na comunicação. Pode ser que ele escorregue novamente e faça com que essa base bolsonarista migre novamente para o Ricardo Nunes, mas ao meu ver é uma base sólida, garante uma competitividade muito grande em relação ao Nunes”, afirma Sanches.

Soller compartilha da opinião e vê o debate como crucial para a definição de quem vai ao segundo turno na disputa em São Paulo.

“É preciso esperar para ver como o Marçal vai se comportar no debate da TV Globo. Se ele fizer um enfrentamento contra a própria Globo, ele poderá angariar votos dos bolsonaristas. Não descarto a possibilidade do Marçal no segundo turno”, avalia.

Paulo Ramirez ainda acredita haver gordura de votos para Marçal, o que pode ser determinante para o manter na disputa. Seja qual for o resultado, o professor da ESPM avalia que as propostas devem ficar de lado no segundo turno e o foco deve ser na rejeição do adversário.

“É fato que parte do eleitorado bolsonarista tem sabotado as pesquisas de opinião ultimamente e isso pode favorecer o Marçal. Ele pode ter alguns votos armazenados ou até mesmo os votos envergonhados. Pode ser que tenhamos alguma surpresa com os números de domingo”.

“A tendência é que a gente tenha uma espécie de terceiro turno da campanha presidencial aqui em São Paulo. Porém, Lula e Bolsonaro têm altos índices de rejeição na cidade, o que pode transformar o segundo turno em uma disputa baseada em rejeição e não necessariamente em propostas”, completa Ramirez.