Mais uma vez o Supremo Tribunal Federal (STF) foi obrigado a intervir nas tramoias da Câmara. Apenas nos seis primeiros votos, do total de dez, a decisão foi unânime contra as “emendas do relator”. Não havia a opção de se ficar omisso frente ao escândalo. O orçamento secreto – que privilegia os amigos do governo – foi instaurado na presidência do deputado Arthur Lira e faz estragos a cada votação. O método garante que o posicionamento do parlamentar seja guiado exclusivamente pelos ganhos pessoais. Só isso já deveria ser alvo de investigação, mas pode ser ainda mais grave, é comum que as emendas sejam vinculadas com a corrupção. A decisão arruinou as mutretas secretas do Centrão.

A deputada Joice Hasselmann comemorou a decisão. “O STF melou o mensalão do Bolsonaro, que se transformou na maior safadeza política da história recente”. O mesmo sentimento demonstrou o deputado Marcelo Freixo, que destacou o dever do STF proteger a Constituição. “Quem está interferindo no Congresso é o presidente Bolsonaro, que está usando como emendas de relator para comprar apoio parlamentar”. O senador Alessandro Vieira afirmou que “as emendas do relator são ilegais. Parabéns para cada cidadão que se mobilizou”. Antes da sessão do STF, o mandatário havia reclamado da mobilização da Corte.

O tema caminha em paralelo a votação da PEC dos Precatórios. A ministra Rosa Weber colocou prazo de 24 horas para que a Câmara divulgue os trâmites que possibilitaram a aprovação em primeiro turno da PEC dos Precatórios. Mas o Congresso fez a votação em segundo turno e ratificou a aprovação da PEC dos Calotes. A ligação entre a aprovação da PEC dos Precatórios e orçamento secreto é clara. Embora, alguns partidos tenham mudado a orientação, o resultado foi ainda mais folgado para o governo: 323 a 172 votos. Em ano eleitoral, o Bolsonaro poderá quebrar o teto de gastos e terá mais R$ 91 bilhões para impulsionar projetos eleitoreiros. O cabo de guerra pode ser travado no Senado. Lá, o capitão tem encontrado mais resistências para aprovar seus projetos. De qualquer maneira, a investida do STF contra as emendas do relator pode criar problemas ao governo.

No PDT, a postura do ex-governador Ciro Gomes foi enfática. Ele retirou, provisoriamente, seu nome para a disputa presidencial. Pode ser apenas um grande blefe. O fato revelou também que os presidenciáveis têm um problema concreto. Eles não podem contar com a sua base legislativa. No PSB, PSD, PSDB, MDB e Podemos o movimento foi similar e a opção por manter as emendas do orçamento secreto de Lira tem incentivado mais os deputados do que a posição ideológica que deviam defender. O episódio revela o quanto são frágeis os partidos e que a construção de maioria na Câmara é puramente fisiológica. Não importa quem seja o presidente da República, o sistema político precisa ser mais transparente e o compromisso ideológico também. Senão o toma lá dá cá continuará a preponderar nas votações, infelizmente.