O governo do Sudão assegurou nesta terça-feira (21) ter “frustrado” uma tentativa de golpe de Estado no qual estavam envolvidos militares e civis vinculados ao regime do autocrata Omar al Bashir, expulso do poder há dois anos por uma revolta popular.

“Uma tentativa frustrada de golpe de Estado por parte de um grupo de oficiais das forças armadas e civis do antigo regime (…) foi controlado ao amanhecer”, declarou o ministro da Informação, Hamza Balul, à TV estatal.

“Onze oficiais e vários soldados que participaram do complô frustrado” foram detidos, informou o exército. Balul assegurou que a situação está “sob controle”, enquanto a imprensa estatal divulgou canções patrióticas sem parar.

Essa tentativa de golpe de Estado não é a primeira que tem como alvo o governo de transição formado após a destituição, em abril de 2019, de Omar al Bashir, deposto após 30 anos de governo.

O Sudão sofreu vários golpes de Estado no século XX, o último – um golpe militar com apoio islamita – levou Bashir ao poder em 1989.

Preso em Cartum desde sua deposição, Bashir atualmente é julgado por sua participação no golpe que o levou ao poder.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Ele também é julgado no Tribunal Penal Internacional (TPI) por “genocídio” e crimes contra a humanidade durante o conflito em Darfur (oeste).

– Manifestações –

Vários altos funcionários disseram que os autores do “complô” tinham tentado tomar o controle do prédio da mídia estatal. “Todos os postos que os golpistas tomaram” foram “recuperados”, segundo o exército.

No centro de Cartum, o tráfego permanecia fluido, inclusive nos arredores do quartel-general do exército, onde os manifestantes organizaram os principais atos que provocaram a queda de Bashir.

Nesta terça, houve manifestações em várias cidades contra a tentativa de golpe.

Em Porto Sudão (leste), com bandeiras sudanesas, dezenas deles gritavam “Não ao poder militar!” e “Não ao golpe!”, informou à AFP uma testemunha, Mohamed Hassan.

Em Gedaref, também no leste, Amal Husein, outra testemunha, informou sobre manifestações de estudantes em protesto contra a tentativa de golpe.

As forças de segurança bloquearam a principal ponte que liga Cartum à sua cidade-gêmea, Omdurman, do outro lado do Nilo.

Os autores do complô “prepararam bem” seu plano, disse o premier, Abdullah Hamdok, em discurso televisionado, no qual falou da “deterioração da segurança (…) do bloqueio das estradas, do fechamento dos portos e da contínua incitação contra o governo civil”.

Trata-se de uma referência aos manifestantes que desde a sexta-feira bloqueiam as infraestruturas de Porto Sudão, centro econômico do país, para denunciar um recente acordo de paz com os rebeldes.


Os Estados Unidos condenaram a tentativa de golpe, advertindo contra “qualquer ingerência externa” e avisou que esta ação põe “em risco” o apoio internacional ao país.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu “a todas as partes que continuem comprometidas com a transição e a realização das aspirações do povo sudanês de um futuro democrático, inclusivo, pacífico e estável”.

A missão da ONU no Sudão informou que repudiava “qualquer chamamento a substituir o poder de transição por um poder militar”.

– “Uma verdadeira transição” –

Nesta terça, o poderoso chefe paramilitar e membro do Conselho de Soberania, Mohamed Hamdan Daglo, ex-membro do regime de Bashir, apelidado de “Hemedti”, declarou em discurso a seus combatentes: “Não permitiremos um golpe de Estado”.

“Queremos uma verdadeira transição democrática, com eleições livres e justas”, acrescentou, segundo a agência oficial Suna.

O gabinete cívico-miliar, surgido de um acordo com os movimentos que lideraram a mobilização popular contra Bashir, leva mais de dois anos em funcionamento e deve levar o Sudão a um poder totalmente civil em três anos.

Seu mandato foi prorrogado quando foi assinado um acordo de paz histórico em outubro de 2020 com uma coalizão de grupos rebeldes, o que lhe dá até 2023 para completar sua missão.

A tentativa “de golpe de Estado (…) destaca claramente a importância de introduzir reformas no exército e no aparato de segurança”, disse o primeiro-ministro nesta terça.

O governo de Hamdok também quer pôr fim à crise econômica, empreendendo uma série de reformas difíceis para se beneficiar de um programa de alívio da dívida do Fundo Monetário Internacional (FMI).

As medidas provocaram recentemente manifestações esporádicas.



Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias