Em julgamento que fez os ministros do Superior Tribunal de Justiça “quebrarem a cabeça”, a Terceira Seção da Corte mandou soltar um porteiro de 32 anos que é acusado em 62 ações penais com base exclusivamente em reconhecimento fotográfico. Os magistrados absolveram o homem em uma ação na qual ele pegou oito anos de prisão, por considerarem que não existe prova suficiente para a condenação, uma vez que a sentença estava amparada somente no reconhecimento por foto.

Nessa toada, os ministros instaram os juízes responsáveis por todos os 62 processos contra o porteiro a verificarem se a dinâmica dos casos é a mesma que foi “repelida” pela Corte – acusação ou investigação apenas com base no reconhecimento fotográfico.

Ainda foi determinado o envio de ofício à Corregedoria da Polícia do Rio acompanhado da decisão.

Antes de o resultado do julgamento ser proclamado, os ministros debateram uma série de caminhos para o processo, de modo a “atender a questão humanitária sem subverter ordens processuais”.

O ministro Rogério Schietti Cruz disse estar convencido de que o caso caracteriza “um erro judiciário gravíssimo”. Na mesma linha, o ministro Messod Azulay destacou que o porteiro é alvo de “injustiça perpetrada há alguns anos”. Já o ministro Sebastião Reis Júnior ponderou que o caso demonstra a falência do sistema processual penal. O tema chegou à pauta da Terceira Seção do STJ em razão de um habeas corpus sob relatoria da ministra Laurita Vaz.

O pedido foi apresentado pela Defensoria Pública do Rio e pelo Instituto Defesa do Direito de Defesa, que questionavam uma condenação do réu a oito anos de reclusão, em regime inicial fechado, por suposto crime de roubo.

A Defensoria sustenta que a sentença tem como base apenas o reconhecimento fotográfico do porteiro. A imagem do réu foi retirada de redes sociais e incluída no álbum e no mural de suspeitos da Delegacia de Belford Roxo, na Baixada Fluminense.

Segundo a Defensoria, ele teria sido reconhecido pelas vítimas dos crimes apenas por foto disposta ao lado de outras imagens que mostravam pessoas com características físicas diferentes.

O Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) argumenta que nas 62 ações a que o homem responde, houve o reconhecimento fotográfico seguido do encerramento das investigações, sem diligências – método que produz “injustiças”.

A entidade entregou ao STJ um relatório com a dinâmica de todos os processos em que o homem é réu. Segundo o IDDD, o porteiro já foi absolvido em 17 ações penais, seguindo pareceres do Ministério Público, em razão de vícios do ato de reconhecimento por foto.

A relatora do habeas corpus no STJ é a ministra Laurita Vaz. Ela ponderou que a sentença foi amparada somente no reconhecimento fotográfico do acusado. Segundo a ministra, há “divergências e inconsistências” na prova, de modo que “há razoável dúvida acerca da autoria”, implicando na absolvição do homem.

Em seu voto, Laurita destacou uma série de falhas na investigação que culminou na condenação do réu. Segundo a relatora, a primeira descrição feita pela vítima, uma mulher, sobre o suspeito do roubo, teria sido genérica. Além disso, só depois de 15 dias que a mulher voltou à Delegacia para fazer o reconhecimento, ainda alterando as características físicas apontadas em um primeiro momento.

Em audiência, a vítima “não afirmou que tinha reconhecido o homem e, em sede policial, com absoluta certeza, alegando que possivelmente seria” o réu””, ressaltou ainda Laurita.