O plenário do Supremo Tribunal Federal confirmou a decisão do ministro Teori Zavascki de suspender nesta quinta-feira o mandato do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, cérebro do impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, por obstrução das investigações que o vinculam ao escândalo de corrupção na Petrobras.

Os ministros do STF ratificaram, por unanimidade, a decisão de Zavascki, que atendia a um pedido feito em dezembro passado pela Procuradoria-Geral da República, segundo a qual Cunha usava o cargo e a presidência da Câmara “em interesse próprio e ilícito, qual seja, evitar que as investigações contra si tenham curso e cheguem a bom termo, bem como reiterar as práticas delitivas, com o intuito de obter vantagens indevidas”.

“Não há a menor dúvida de que o investigado não possui condições pessoais mínimas para exercer, neste momento, na sua plenitude, as responsabilidades do cargo de Presidente da Câmara dos Deputados, pois ele não se qualifica para o encargo de substituição da Presidência da República, já que figura na condição de réu no Inquérito 3983, em curso neste Supremo Tribunal Federal”, destacou o magistrado em sua decisão.

No entanto, a decisão não tirou de Cunha o foro privilegiado, que só permite que seja julgado pelo Supremo.

Cunha, 57 anos, era o segundo na sucessão presidencial e, se Dilma for afastada pelo Senado como parte do processo de impeachment, no próximo dia 11, ficaria em primeiro lugar, atrás do vice-presidente Michel Temer, que substituiria a presidente.

“Não renuncio a nada, nem ao mandato, nem à presidência. Vou apelar”, disse.

A Procuradoria detalhou onze ações em que Cunha, um deputado conservador e dono de 150 domínios na internet com a palavra “Jesus”, atuou de forma ilícita.

“A única coisa que eu lamento, mas eu falo antes tarde do que nunca, é que infelizmente ele conseguiu (…) presidindo na cara de pau o lamentável processo (de impeachment) na Câmara”, disse a presidente Dilma Rousseff sobre o destino de seu maior inimigo.

“Finalmente apareceu a verdade sobre Cunha”, escreveu o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner.

“Entraremos com um novo recurso do STF questionando a existência de desvio de poder nas ações do deputado suspenso. Espero que agora a verdade sobre a inocência da presidente Dilma também se reconheça”, acrescentou.

Embora os partidos da oposição, que apoiaram o impeachment de Dilma Rousseff, tenham considerado a suspensão “coerente”, eles reclamaram que não tenha sido feita antes.

O PSDB, terceira força na Câmara, e outros três deputados aliados indicaram em um comunicado que “vêm propondo a renúncia de Cunha (…) desde que se tornaram públicas” as denúncias sobre suas supostas contas no exterior não declaradas.

Eles exigiram “a imediata realização de novas eleições”.

“Retrógrado e corrupto”

O Supremo notificou Cunha da decisão que tirou de suas mãos o cargo e que, mais uma vez, poderá modificar o xadrez do poder no país.

Consultado sobre se a medida não implica em interferência de um poder da República sobre outro, o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) respondeu: “O afastamento de um deputado federal de seu mandato, neste caso do presidente da Câmara, pode ser, sim, uma interferência sem um julgamento do plenário do STF”.

Pela manhã, alguns curiosos e dezenas de cinegrafistas se aglomeraram em frente à residência de Cunha em Brasília.

“É uma pessoa manipuladora, que legisla em benefício próprio. Representa o que há de mais velho na política. Conservador, retrógrado, corrupto”, disse Maia Terra Figueredo, filósofa de 35 anos que estava perto da casa de Cunha.

Polêmico, poderoso, este legislador, que se tornou a nêmese de Dilma, é réu no Supremo por suposto recebimento de US$ 5 milhões de propina para facilitar contratos com navios-sonda para a Petrobras.

Em dezembro, encurralado por denúncias e ameaçado na própria Câmara dos Deputados com a perda do mandato por quebra de decoro parlamentar, Cunha autorizou o pedido de impeachment contra a presidente por suposta manipulação de contas públicas.

Ele será substituído na presidência da Câmara por Waldir Maranhão (PP-MA), um de seus aliados, que também é investigado por suposto beneficiamento do propinoduto, que drenou milhões de dólares da Petrobras ao longo de uma década.

Segundo o site Transparência Brasil, mais de 58% dos 513 deputados federais estão sob a lupa da justiça ou foram acusados de crimes como corrupção, assassinato e estupro. No Senado, 60% têm problemas com a justiça.

Mais crise

O processo de impeachment deixa Dilma Rousseff à beira da perda da Presidência. Analistas e diferentes pesquisas apontam que ela será afastada na próxima quarta-feira e deverá manter-se distante do poder à espera do fim do julgamento, com prazo máximo de 180 dias.

Será sucedida pelo vice-presidente, Michel Temer, a quem acusa de traição e de ser um dos “chefes da conspiração” que quer derrubá-la. O outro é Cunha.

A defesa do governo é que Cunha aceitou o impeachment por “vingança” depois que o PT de Dilma e Lula apoiou um processo contra ele na Comissão de Ética da Câmara.

Considerado o político mais impopular do Brasil e comparado a Frank Underwood, o maquiavélico personagem da série “House of Cards”, Cunha, no entanto, conta com um forte apoio dentro do recinto.

Sob seu comando, os deputados desferiram um duro golpe em Dilma em abril, ao aprovarem a instalação do processo de impeachment por um esmagador resultado de 367 votos a favor e 137 contra.

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