O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quarta-feira (30), o julgamento do marco temporal, chave para os povos indígenas e seus territórios ancestrais, considerados uma barreira importante contra o desmatamento.

Centenas de indígenas se concentraram em Brasília para acompanhar de perto as deliberações do que chamam de “o julgamento do século” pelo impacto potencial para suas comunidades.

O STF vai decidir se valida ou rejeita a tese do marco temporal, que só reconhece como territórios indígenas aqueles ocupados pelos povos originários quando a Constituição foi promulgada, em 1988.

“O marco temporal ignora nosso direito originário ao território ancestral, já reconhecido na Constituição, coloca em risco os territórios já demarcados e inviabiliza novas demarcações”, disse à AFP, antes do julgamento, o advogado indígena Dinamam Tuxá, coordenador da Associação de Povos Indígenas do Brasil (APIB).

Cerca de 800 indígenas, inclusive Tuxá, fizeram uma passeata nesta quarta-feira em Brasília em direção ao STF, onde instalaram um telão para acompanhar o julgamento, constatou um fotógrafo da AFP.

O cacique Raoni Metuktire, ativista dos direitos dos indígenas reconhecido internacionalmente, também estava em Brasília e entrou no STF para acompanhar a sessão.

Associações de indígenas e ativistas repudiam a tese do marco temporal, argumentando que muitos povos originários foram expulsos de seus territórios ancestrais ao longo da História, especialmente durante a ditadura militar (1964-1985).

O Supremo vai se manifestar concretamente sobre o caso do território Ibirama-Laklano, em Santa Catarina, mas o veredicto terá repercussão geral e poderia afetar muitas outras terras em disputa.

O julgamento no STF, que foi retomado e adiado outras vezes nos últimos anos, conta até agora com o voto de três dos onze ministros da corte: Nunes Marques, que votou a favor do marco temporal, e Edson Fachin e Alexandre de Moraes, que votaram contra.

Moraes, que é contrário ao limite temporal de 1988, propôs que o Estado indenize os produtores rurais que tiverem ocupado e adquirido terras regularmente e de boa-fé.

Os indígenas se preocupam de que a proposta receba o apoio de outros ministros, pois a consideram um “prêmio aos invasores”, segundo a APIB.

Eles também protestam contra o avanço no Congresso Nacional de um projeto de lei que institui o marco temporal como critério para a demarcação e, segundo seus críticos, abriria a porta para a exploração econômica de suas terras.

Segundo dados do censo, a população indígena no Brasil é de cerca de 1,7 milhão de pessoas, o equivalente a 0,83% dos 203 milhões de habitantes do país.

mel/app/mvv