04/04/2018 - 6:02
O Supremo Tribunal Federal decide nesta quarta-feira (4) se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva será preso ou permanecerá em liberdade – uma decisão que terá enorme impacto nas eleições de outubro, para as quais Lula é o favorito.
O ex-presidente, de 72 anos, foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), uma corte de apelação, a 12 anos e um mês de prisão por ter recebido um apartamento tríplex no Guarujá, litoral de São Paulo, da OAS, uma empreiteira envolvida no esquema de propinas da Petrobras. Mas sua defesa apresentou um pedido de habeas corpus no STF para evitar sua prisão antes de esgotadas todas as instâncias judiciais.
O habeas corpus será julgado a partir das 14h00. Se for aceito, Lula poderá continuar em pré-campanha e contar com um longo processo nos tribunais superiores. Do contrário, poderá ser preso em breve.
A discussão sobre a jurisprudência que permite prender condenados em segunda instância desatou profundos antagonismos políticos no País a seis meses de eleições que se anunciam as mais incertas desde a restauração da democracia, há 33 anos.
Na terça à noite, dezenas de milhares de pessoas protestaram em São Paulo, repetindo “Lula nunca mais” e em meio a aclamações ao juiz federal Sérgio Moro, grande artífice da Operação ‘Lava Jato’, que investiga o esquema de propinas na Petrobras, e que condenou Lula em primeira instância no ano passado.
Lula se declara inocente neste processo e em outros seis a que responde por crimes como tráfico de influência e obstrução da Justiça, que atribui a uma perseguição política.
“É um julgamento muito politizado. Além da importância do debate em torno da autorização ou não da execução provisória da pena no Brasil, está igualmente em jogo um caso concreto envolvendo um ex-presidente, que também é presidenciável e muito bem avaliado nas pesquisas de intenções de voto”, disse à AFP o especialista em direito penal e criminologia Jovacy Peter Filho.
“Este é, possivelmente, um caso único no mundo”, acrescentou.
A polarização abriu caminho para a violência no fim de março, quando a caravana de Lula pelo sul do país foi atacada a tiros no Paraná.
O clima tenso levou a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, a fazer um incomum apelo à paz social.
As ruas de acesso ao STF em Brasília serão fechadas e a polícia montará um cordão de isolamento, com uso de cercas, para separar os manifestantes que vão se reunir para acompanhar o julgamento nos arredores do prédio.
Espera-se que Lula acompanhe o processo no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, berço de sua ascensão política, que o levou da militância sindical à Presidência da República.
– “Momento histórico” –
“É um momento histórico no judiciário brasileiro”, disse à AFP Anderson Furlan, juiz federal no estado do Paraná e amigo de Sérgio Moro.
“Depois de dois anos, o STF volta a se debruçar sobre a questão [da prisão após a segunda instância] e talvez mude a interpretação. Muitas pessoas entendem que essa mudança de orientação pode ser ruim para o combate à corrupção”, acrescentou.
O coordenador da força-tarefa da ‘Lava Jato’ em Curitiba, o procurador da República Deltan Dallagnol, que tinha acusado Lula de ser o “comandante máximo” da rede de corrupção montado na Petrobras, prometeu fazer jejum e rezar na quarta-feira por ocasião do julgamento.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) reiterou sua convicção de que “Lula é inocente” e considerou que “não há nenhuma prova para sustentar as acusações baseadas em convicções do juiz Sérgio Moro e outros setores do poder judiciário, que adotaram clara postura partidária durante todo o processo”.
O comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, escreveu no Twitter que “o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”.
O general destacou que “nesta situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais”?
– Sob pressão –
Os 11 juízes do STF estão sob enorme pressão, que inclui petições a favor e contra a jurisprudência atual, assinados por milhares de advogados, juízes e promotores.
O tribunal está dividido entre os “garantistas”, favoráveis a uma leitura ampla da presunção de inocência, e os defensores da ‘Lava Jato’, vistos como mais severos e partidários do uso da prisão preventiva e do cumprimento antecipado de penas.
A última discussão sobre o tema terminou com um apertado 6 a 5 a favor da jurisprudência vigente.
Embora o habeas corpus solicitado pela defesa de Lula só alcance seu caso específico, o resultado da votação poderia indicar aos tribunais inferiores uma mudança na interpretação constitucional e para muitos juristas, abriria a porta para pedidos em massa de presos por crimes comuns, como estupro ou homicídio.
Um dos advogados de Lula, José Roberto Batochio, vê neste tipo de argumento “mentiras demagógicas”, porque os procuradores dispõem, segundo alega, de “outras formas para proteger a sociedade”, como a prisão preventiva ou a prisão temporária.