O cineasta Steven Spielberg demonstrou preocupação com o aumento do antissemitismo no mundo e falou abertamente pela primeira vez sobre o conflito na Faixa de Gaza. “Estou cada vez mais alarmado com a possibilidade de estarmos condenados a repetir a história – a mais uma vez ter de lutar pelo direito de sermos judeus”, disse ele, como parte de um discurso realizado na segunda, 25, durante o evento de comemoração dos 30 anos da Shoah Foundation.

A organização foi fundada por Spielberg e tem parceria da Universidade do Sul da Califórnia (USC). Seu objetivo tem sido produção de entrevistas com sobreviventes e testemunhas do Holocausto, com fins educativos.

Em sua fala, o diretor do premiado A Lista de Schindler comentou a situação ente Israel e Palestina. “Diante da brutalidade e da perseguição, sempre fomos um povo resiliente e compassivo que compreende o poder da empatia. Podemos enfurecer-nos contra os atos hediondos cometidos pelos terroristas em 7 de outubro, e também condenar o assassinato de mulheres e crianças inocentes em Gaza”, disse Spielberg.

Ele começou seu discurso relembrando memórias da juventude, quando era um dos poucos alunos judeus de sua escola e sentiu na pele como era ser vítima do antissemitismo, “tanto verbal quanto fisicamente, e através de exclusão silenciosa”. Celebrando o aniversário da fundação, o diretor ressaltou a importância do projeto, “que é mais crucial agora do que era em 1994”, disse.

“Os ecos da história são inconfundíveis no nosso clima atual. A ascensão de visões extremistas criou um ambiente perigoso, e a intolerância radical leva uma sociedade a não mais celebrar as diferenças, mas sim a conspirar para demonizar aqueles que são diferentes, ao ponto de criar ‘o Outro’. Isto está acontecendo também na discriminação antimuçulmanos, árabes e Sikh. A criação do ‘Outro’ e a desumanização de qualquer grupo com base nas suas diferenças é a base do fascismo”, acrescentou o diretor.

Durante o evento, o Spielberg recebeu o Medalhão da Universidade da USC, maior honraria oferecida pela instituição, por seu trabalho com os sobreviventes do Holocausto através da Shoah Foundation. A homenagem foi entregue por Celina Biniaz, uma das 1.200 pessoas salvas por Oskar Schindler em 1944 – história retratada por Spielberg no cinema. “Steven, você me devolveu a voz. Graças ao seu filme e à Fundação Shoah, pude confrontar minhas experiências e falar sobre elas”, disse.

Horas antes do evento, o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução pedindo um cessar-fogo na Faixa de Gaza, após quatro tentativas fracassadas. Os Estados Unidos se abstiveram na votação, permitindo a aprovação. A resolução foi apoiada por 14 países.

Para entender

Spielberg evitou fazer declarações sobre o conflito. Em dezembro, ele foi citado em uma carta da Shoah Foundation que condenava os ataques do Hamas a Israel em 7 de outubro: “Nunca imaginei que veria uma barbárie tão indescritível contra os judeus durante a minha vida”, constava no texto.

Na semana passada, 450 judeus da indústria de Hollywood assinaram uma carta aberta contra o discurso do cineasta britânico Jonathan Glazer no Oscar. Diretor de Zona de Interesse, filme sobre o nazismo, Glazer, que é judeu, condenou o conflito na Faixa de Gaza durante seu discurso de agradecimento pela estatueta de melhor filme internacional. Spielberg não foi um dos assinantes da carta.