A diretora americana Sofia Coppola revisita o mito Elvis Presley com “Priscilla” nesta segunda-feira (4) no Festival de Veneza, enquanto seu compatriota Woody Allen apresenta, fora da competição, seu 50º filme, “Coup de chance” (“Golpe de sorte” em tradução literal), rodado em francês.

Apenas um ano após o sucesso de “Elvis”, filme do australiano Baz Luhrmann, Coppola volta a explorar a relação do rei do rock com sua esposa, a jovem Priscilla, que conheceu na Alemanha enquanto cumpria o serviço militar. Ela tinha apenas 14 anos, ele 24. O filme é baseado nas memórias de Priscilla.

Com um olhar sereno e lúcido, “Priscilla” aborda uma relação peculiar: a de uma menina ainda adolescente (interpretada pela cantora e atriz Cailee Spaeny) que não só consegue convencer os pais de que Elvis (Jacob Elordi) tem boas intenções, mas até mesmo a permitir que ela fosse morar com ele em sua mansão em Graceland.

Elvis Presley instala-a em sua casa e a matricula em um colégio de freiras em Memphis para terminar os estudos, sem consumar sua relação sexualmente durante anos, até que se casa com ela, então com 21 anos), insiste Priscilla.

“Foi muito difícil para os meus pais entenderem por que Elvis estava tão interessado em mim”, disse Priscilla Presley, emocionada, em uma entrevista coletiva no Lido.

Assim como em “Elvis”, o rei do rock é retratado como um homem ferido pela morte da mãe, com um lado autodestrutivo e dependente de drogas, algo que estava prestes a também tragar sua jovem esposa. Ambos se divorciaram em 1973.

Priscilla Presley, que teve uma filha com Elvis (Lisa), é produtora do filme, que concorre ao Leão de Ouro.

“Não sei por que ele confiou tanto em mim, mas confiou”, lembrou Priscilla, hoje com 78 anos, que já trabalhou como atriz e apresentadora.

“As pessoas pensavam: ‘era o sexo’. Mas não foi assim. Nunca tive relações com ele [até o casamento]. Era muito doce, muito amoroso, mas também respeitou o fato de que eu tinha apenas 14 anos”, disse à imprensa.

A obra mostra, no entanto, a enorme tensão emocional de uma jovem que teve de suportar, durante anos de espera, as infidelidades do intérprete de “Heartbreak Hotel”.

É um filme que narra “a evolução de uma jovem que acaba por escapar para encontrar seu próprio lugar”, explicou Sofia Coppola.

Vencedora do Oscar pelo roteiro de “Encontros e desencontros” (2003) e da Palma de Ouro em 2006 por “Maria Antonieta”, Sofia Coppola é uma diretora que fez fama como independente, graças a festivais como o de Veneza, onde ganhou o Leão de Ouro por “Um lugar qualquer”, em 2010.

Tanto ela, como os atores de “Priscilla” se beneficiaram de uma exceção especial do poderoso sindicato americano SAG-AFTRA, que lidera a greve que paralisou Hollywood, para promover este filme no exterior.

A greve de atores, à qual os roteiristas aderiram, provocou a ausência de grande parte das estrelas e cineastas americanos no Lido. “Priscilla” concorre ao Leão de Ouro com outros 22 filmes.

– Ignorado nos EUA, querido na Europa –

Aos 87 anos, Woody Allen tem uma fama ainda mais independente de Hollywood, mas tem seus próprios problemas.

Abalada pela onda do #MeToo, a indústria cinematográfica americana rejeita se associar a um diretor de cinema acusado de abusos sexuais por sua filha adotiva, Dylan, ocorridos supostamente em 1992, quando ele ainda vivia com Mia Farrow.

Duas investigações absolveram Allen, mas o escândalo ainda assombra o diretor, que tem dois filhos adotivos com sua atual esposa, Soon-Yi Previn.

O diretor nova-iorquino foi convidado a apresentar em Veneza “Coup de chance”, rodado na França com Lou de Laâge, Niels Schneider e Melvil Poupaud nos papéis principais. O filme é um drama amoroso, a partir do casual reencontro de dois ex-colegas de sala no ensino médio.

Ignorado até mesmo pela cidade à qual dedicou tantas produções, Nova York, Allen aos poucos direciona seus projetos à Europa.

No ano passado, estreou “O Festival do Amor”, ambientado no Festival Internacional de Cinema de San Sebastián, depois ter escolhido Londres para gravar “Ponto final – Match Point”, e Barcelona, para “Vicky Cristina Barcelona”. Há 12 anos, a capital francesa foi cenário de outro filme de Allen, “Meia-noite em Paris”.

O autor de “Manhattan” e “Hannah e suas irmãs” reconheceu recentemente que está perto de encerrar sua longa carreira cinematográfica.

“Quando eu era jovem, os filmes que mais nos impressionavam eram os europeus, os franceses, os italianos, os suecos… Todos queríamos fazer filmes como os europeus”, lembrou o diretor, na conversa com a imprensa.

“Tenho muito boas ideias para Nova York, e se alguém sair das sombras e disser ‘ok’, se estiver de acordo em me dar o dinheiro e não se intrometer, vamos em frente!”, brincou.

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