Sociedade civil síria se mobiliza para evitar volta do autoritarismo

No pátio de uma casa em Damasco, um grupo de ativistas discute o papel que querem desempenhar no período de transição: reprimida sob Bashar al-Assad, a sociedade civil está determinada a impor-se na nova Síria para impedir a volta de uma ditadura.

Desde que uma coligação liderada por islamistas tomou o poder em 8 de dezembro, no final de uma ofensiva armada de 11 dias, Damasco está agitada por reuniões públicas anteriormente proibidas e reencontros emocionantes entre ativistas que permaneceram no país, foram presos ou retornaram do exílio.

Representantes de uma plataforma que reúne dezenas de organizações da sociedade civil, a Madaniya, se encontraram com o novo líder sírio, Ahmad al Sharaa, em 4 de janeiro para expressar suas demandas.

“Destacamos o papel essencial que a sociedade civil deve desempenhar na transição política”, disse a diretora-executiva da Madaniya, Sawsan Abu Zaineddin, durante uma conferência do grupo.

“Insistimos na necessidade de não nomear pessoas de apenas um lado” dentro da autoridade de transição, acrescentou, depois que o novo líder sírio nomeou várias pessoas de confiança para cargos-chave.

Sawsan Abu Zaineddin, que se reuniu com Al Sharaa junto com o fundador da Madaniya, o empresário sírio-britânico Ayman Asfari, disse que eles até discutiram o “problema” de “nomear jihadistas estrangeiros” para o Ministério da Defesa.

Ahmad al Sharaa é o líder de um grupo islamista radical, Hayat Tahrir al Sham (HTS), que afirma ter rompido com seu passado jihadista.

No entanto, nomeou pelo menos seis jihadistas estrangeiros para postos de comando no futuro Exército, que planeja formar após a dissolução dos grupos armados no país, fragmentado por uma guerra civil que deixou mais de meio milhão de mortos em 13 anos.

– “Vazio constitucional” –

A diretora da Madaniya destacou ainda que pediram “transparência absoluta” na preparação da conferência de diálogo nacional que o governo pretende organizar e na seleção dos participantes.

O ministro das Relações Exteriores, Asaad al-Shaibani, disse que uma ampla comissão seria criada para preparar a conferência, cuja data ainda não foi anunciada.

“Estamos em uma situação de vazio constitucional, em um período de transição após 62 anos do partido Baath”, disse o advogado Abdulhay Sayed à AFP, sobre o contexto atual, no qual as novas autoridades suspenderam a Constituição e o Parlamento.

Este jurista é um dos mais de 300 signatários de uma petição que pede eleições livres na Ordem dos Advogados, onde as novas autoridades já designaram um substituto para o dirigente anterior, nomeado pelo antigo regime.

O advogado destacou que seria “decisivo” que a conferência de diálogo convidasse organizações representativas da sociedade civil e sindicatos, o que permitiria estabelecer um “contrapoder” e evitar qualquer retorno ao autoritarismo.

“A conferência deve estabelecer um guia para uma lei eleitoral, com o objetivo de eleger uma Assembleia Constituinte em um ano. Esta assembleia será encarregada de redigir uma Constituição permanente e pode ser posteriormente transformada em um Parlamento”, explica.

No entanto, o novo líder sírio disse em uma entrevista à Al Arabiya que a realização de eleições pode levar quatro anos.

– Mulheres se mobilizam –

O novo governo busca tranquilizar os sírios e a comunidade internacional sobre os direitos das minorias em um país multiétnico e multiconfessional.

A mesma demanda por participação política foi feita por mulheres reunidas em Damasco em 8 de janeiro em um congresso do “movimento político feminista sírio”.

“Queremos e sonhamos com um estado de direito”, disse uma das participantes, a advogada Jumana Seif, que trabalha com crimes de guerra na Síria.

Esta advogada, cujo pai, o deputado Riad Seif, foi preso por Bashar al-Assad, destaca que as mulheres “têm um papel importante a desempenhar” na nova Síria e querem “uma participação ativa na conferência de diálogo nacional”.

“Não queremos um novo opressor”, diz a ativista e escritora Wajdan Nassif, que se exilou depois de ser presa.

“Não queremos ver mais prisões. As mulheres sírias querem participar plenamente (…) da nova era na Síria e não queremos uma repetição do terrível passado”.

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