O presidente do PSD, Gilberto Kassab, é um dos políticos brasileiros que mais entendem da estrutura partidária no País. Afinal, em 2011, ele fundou o partido que dirige em tempo recorde, atraindo dissidentes do DEM, PSDB e PPS. De lá para cá, em pouco mais de 10 anos, a sigla já tem 12 senadores (a segunda maior bancada) e 46 deputados federais (a quinta) e estima eleger, em outubro, um número superior de parlamentares (16 senadores e 60 deputados). Com isso, os pessedistas podem ser o fiel da balança no futuro governo. Ele diz que metade do partido está com Lula e a outra metade com Bolsonaro e que, por isso, qualquer um dos dois que vier a ser eleito terá seu apoio. “Apoiaremos os projetos que sejam positivos para o País.” Ex-ministro das Cidades de Dilma e ex-prefeito de São Paulo, Kassab não acredita em golpe de Bolsonaro e diz que o sistema eleitoral “é próximo da perfeição”. “Na época da cédula de papel sim tinha fraudes e compra de votos”, disse à ISTOÉ. Ele aposta ainda que a cláusula de barreiras nestas eleições reduzirá o número de partidos de 35 para apenas 16 e que o ideal é o País ter um quadro partidário mais enxuto.

Como o senhor vê os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas? As críticas não passam do razoável?
Eu discordo totalmente dele. Já vivi esse processo como candidato, já vivi, inclusive, como candidato da época da cédula de papel. Aí sim tinha fraudes e acusações de compra de votos. Hoje eu acho que o nosso sistema eleitoral é próximo da perfeição. É admirado no mundo inteiro e é muito seguro e eficiente. Com essas explicações, fica claro que eu discordo profundamente das suposições que o presidente vem fazendo.

O senhor acha possível termos um Sete de Setembro tumultuado, já que Bolsonaro convoca as pessoas para irem à rua e tem ameaçado desestabilizar as instituições, com novos ataques ao TSE e ao STF? Ele trama um golpe?
Não, não. As instituições brasileiras estão muito consolidadas, a democracia é muito sólida e estou muito tranquilo em relação a isso. Não acredito que essas manifestações políticas do presidente conseguirão de fato conduzir a um processo golpista.

Essa atitude pode ser preventiva para justificar uma eventual derrota?
Eu acho que se for isso é um tiro no pé. O candidato que admite a derrota já está derrotado.

O senhor acha que Bolsonaro pode repetir o gesto de Trump de tentar melar o resultado das urnas?
Não acredito em nenhuma mobilização que tenha força de modificar o resultado das eleições. As Forças Armadas têm um comportamento muito correto e muito adequado. Não acredito que tenham uma postura diferente.

Acha que o eleito assume?
Com certeza. Uma coisa são as manifestações de campanha que vêm acompanhadas de muito marketing. As pessoas acreditam que ao falar em fraude nas urnas e golpe agradam o eleitor mais fanático e ganham voto com isso, mas não ganham. O vencedor vai tomar posse.

O 11 de agosto e a demonstração de força na posse do ministro Alexandre de Moraes no TSE serviram para comprovar que a sociedade civil está preparada para impedir uma volta ao passado?
O 11 de agosto serviu para mostrar que toda ação gera uma reação. Na minha opinião, o encontro do presidente com os embaixadores gerou essa reação que teve início com os manifestos lidos no dia 11 de agosto e foram reforçados com o evento no TSE. Ficou claro ao longo das manifestações dos últimos meses que a nossa democracia não corre risco. A sociedade civil está atenta e pronta para se mobilizar e evitar que a democracia saia dos trilhos.

Como o senhor vê os pacotes de bondades implementados por Bolsonaro para virar o resultado das eleições que lhe é desfavorável. Acha que essas medidas eleitoreiras são imorais?
Até a oposição votou a favor dessas medidas. Não se pode ficar contra a diminuição do preço de combustíveis. Quem pode ficar contra medidas que ajudam os mais pobres? Se eu fosse parlamentar também votaria a favor. Essas medidas eram tão necessárias que obtiveram o apoio de todos.

O senhor acha que é possível haver segundo turno ou a eleição pode ser resolvida já no primeiro turno?
Ainda tem possibilidade de se resolver no primeiro turno. O número de candidatos ficou reduzido. Mas vamos aguardar o inicio do horário eleitoral gratuito no rádio e na TV, que é sempre um marco importante em qualquer campanha. Passadas duas semanas iniciais da campanha na TV, acho que as conclusões das pesquisas serão muito mais próximas do acerto final.

O PSD pode participar do futuro governo?
Não vamos participar de governo nenhum. Não temos esse sentimento de fisiologismo, de cobiça por cargos. O que nós vamos é contribuir com o País. Adotaremos a posição de apoiar tudo aquilo que nós entendermos que seja positivo para o nosso crescimento, como adotaremos uma posição crítica de oposição quanto àquilo que nós tivermos uma visão negativa. E isso vai acontecer com qualquer que seja o governo.

E se der Bolsonaro, o PSD pode apoiá-lo?
Tivemos uma posição distante desse governo até aqui. Então, nesse momento, não vou me manifestar. Precisamos aguardar primeiro quem vencerá as eleições e depois ver quais serão as posições do governo eleito, mas sempre teremos uma posição muito crítica em relação às medidas que não sejam compatíveis com o que esperamos ser o melhor para o País.

A oposição tem dito que Bolsonaro deixará uma herança maldita para o futuro governo. Qual sua avaliação?
Ao longo do governo Bolsonaro tivemos as nossas discordâncias, que nos levaram a ter uma posição de independência, mas houve momentos em que os parlamentares do partido entenderan que os projetos apresentados eram bons para o País e ficamos ao lado do governo. Mas se estivéssemos em concordância, estaríamos apoiando o governo e isso não existe. A nossa avaliação não foi favorável ao atual governo.

Desde a redemocratização, o Brasil apresenta uma disputa entre um candidato da direita contra outro da esquerda. O senhor acha que isso é indicativo de que deveríamos ter apenas dois ou três partidos, como acontece nos EUA?
Já está acontecendo isso. Eu entendo que com o resultado destas eleições, só vão ser classificados pelo resultado da cláusula de barreiras em torno 16 partidos, o que já é um avanço, pois temos hoje 35 partidos. Metade deles não vai atingir o desempenho necessário e com isso não vai ter condições de ter representatividade dentro do parlamento. Não vai poder ter liderança, não vai poder participar de comissões. Nas eleições municipais de 2024 e nas nacionais de 2026, eles não terão o tempo de rádio e televisão no horário gratuito, não terão acesso ao fundo partidário, ao fundo eleitoral, e terão que se fundir com outras siglas.

O PSD foi assediado tanto por Lula como por Bolsonaro para compor o arco de alianças de cada uma dessas candidaturas, mas o senhor acabou não apoiando oficialmente nenhum dos dois. Por quê?
Porque o projeto do partido era ter uma candidatura própria. É muito importante que nas eleições os partidos se apresentem com candidatos próprios, que levem a imagem e as propostas da legenda adiante. E nos esforçamos muito para que tivéssemos um candidato. O nome natural seria o Rodrigo Pacheco, que se filiou ao PSD e se elegeu presidente do Senado. Criamos circunstâncias que poderiam favorecer sua candidatura, mas no momento em que ele entendeu que a sua posição como presidente do Senado era mais importante para o Brasil do que como pré-candidato, nos esforçamos para viabilizar outra candidatura e fizemos um convite para o Eduardo Leite, que não aceitou a missão. Na impossibilidade de ter uma candidatura própria, o caminho natural seria a neutralidade, já que o partido estava dividido ao meio entre apoiar Lula ou Bolsonaro.

O senhor acha que tanto Lula como Bolsonaro não são boas opções para o País?
O PSD entendia que era importante apresentar uma alternativa e que o caminho não era nem um e nem outro. Agora no segundo turno, evidentemente, vamos nos posicionar entre um e outro, mas no primeiro turno qualquer manifestação seria até inadequada, em especial vindo do presidente de um partido que precisa se preservar para manter sua unidade. Afinal, fizemos uma pesquisa entre os diretórios estaduais e metade queria um e a outra metade o outro. No segundo turno, contudo, vamos escolher um dos dois.

Entre os dois, qual deles têm maiores possibilidades de recolocar o País no rumo do desenvolvimento?
Olha, eu sou um democrata. Acredito na democracia. Sei da importância das eleições e, portanto, quem ganhar terá, da nossa parte, todo apoio para que se retome o desenvolvimento, e terá também toda a nossa oposição para aquilo que não contribuir para o desenvolvimento do País.

No início da campanha, o senhor chegou a estar mais próximo de Lula e inclusive compareceu ao jantar organizado pelo grupo Prerrogativas em apoio a ele. Todos os presidentes dos partidos presentes fizeram uma foto com ele. Por que o senhor preferiu não aparecer na foto?
O jantar foi uma homenagem ao ex-presidente e eu participei. A foto foi dos líderes dos partidos que estavam apoiando sua candidatura e o PSD não estava apoiando. De uma maneira educada não participei da foto. Mas o meu respeito ao ex-presidente ficou claro com meu comparecimento ao jantar e nos encontros frequentes que eu tenho tido com ele.

Todos os diretórios estaduais do PSD chegaram a responder a uma pesquisa sobre a preferência entre Lula e Bolsonaro e não houve consenso?
Exatamente, essa é a razão da posição de neutralidade do partido. A consulta feita deu um resultado mostrando que o partido estava rigorosamente dividido. Uma parte preferindo o caminho para a esquerda e a outra parte optando pelo caminho para a direita. Hoje temos o governador Ratinho (PR), apoiando Bolsonaro, e temos o Alexandre Kalil (MG), apoiando Lula.

Em um eventual segundo turno, o senhor pretende consultar os diretórios novamente sobre o apoio a Lula ou a Bolsonaro?
Sim, mas tudo tem seu prazo. No primeiro turno tudo é mais lento. No segundo turno, ouviremos governadores eleitos, as novas bancadas de deputados e dos senadores para tormarmos uma posição com a maior unidade possível. Qualquer manifestação minha agora seria totalmente inadequada. No momento certo nós vamos ter essa discussão, que será bastante rápida e será feita no intervalo de um turno para o outro. Mas jamais iniciaríamos essa discussão agora.