Olhando pelo retrovisor fica nítido que a glamourização das favelas, o endeusamento dos antigos bicheiros, o tratamento de quase heróis dispensado a traficantes que por vezes supriam as carências de um Estado corrupto e a promiscuidade entre policiais e milicianos não poderiam levar a nenhum lugar decente. Pelo contrário. Demorou para o Rio de Janeiro se transformar na atual praça de guerra. Foram seis décadas de hipocrisia oficial e, por que não dizer, de cumplicidade de boa parte da chamada sociedade civil. O mais inacreditável, porém, aconteceu na terça-feira 31. Foi dito com todas as letras que o comando da Polícia Militar no Estado é o resultado de um acerto com o crime organizado e que os comandantes de batalhões são sócios de traficantes e milicianos. O conteúdo das falas até que não é tão novo, mas o que faz delas algo inacreditável é o fato de terem sido ditas pelo ministro da Justiça, Torquato Jardim. Ele é o chefe da Polícia Federal e tem o poder de solicitar uma intervenção na polícia fluminense. E, mais inacreditável ainda, o ministro afirmou que já conversou sobre isso com o governador Luiz Fernando Pezão e com o secretário de Segurança, Roberto Sá, e que nada há para ser feito.

O Rio é maior que o crime e o povo do Rio
é muito melhor do que seus governantes

De acordo com o ministro, o socorro de Brasília, que envolve as Forças Armadas, a Força Nacional, a PF e a Polícia Rodoviária, poderá amenizar a situação, mas não irá tirar o carioca da alça de mira de traficantes, milicianos e policiais corruptos. “A virada da curva só virá em 2019, com outro presidente e com outro governador. Com o atual governo do Rio não será possível”, disse o ministro. Onde chegamos! Em outras palavras, o ministro disse que o brasileiro do Rio está refém de bandidos, que o governo local está contaminado pelo crime organizado e que só poderá haver alguma solução em 2019. Em qualquer lugar com um mínimo de decência uma declaração dessas provocaria um levante. Os cidadãos de bem não podem mais assistir calados ao que ocorre no Rio de Janeiro e a fala do ministro da Justiça poderia muito bem ser a senha para o início de uma reação. Qualquer reação. Boicote ao pagamento de impostos, greve geral, passeata rumo a Brasília… Sei lá. O que não pode mais é a sociedade assistir a isso tudo tão passivamente. Passou o momento de gritar “basta”. É preciso agir. O Rio é maior que o crime e o povo do Rio é muito melhor do que seus governantes.