Um prognóstico fiscal sombrio para a economia no ano que vem acendeu o sinal amarelo na Câmara, onde a discussão sobre o orçamento da União e o teto de gastos têm provocado uma grande crise no governo, colocando em alerta economistas, investidores e, sobretudo, os aliados do ministro Paulo Guedes. A nuvem de incertezas paira sob o impasse na definição do comando da Comissão Mista de Orçamento (CMO), que define como ficarão as contas públicas para os próximos anos: a disputa dos parlamentares por cargos na CMO paralisou as votações, gerando uma crise classificada pelo deputado Rodrigo Maia (DEM), presidente da Casa, como catastrófica.

“O Brasil vai implodir em janeiro se as matérias não forem votadas. O dólar vai a R$ 7 e a taxa de juros de longo prazo, que hoje está em 4% ou 5%, vai subir para 15% ou 20%. Sem contar que o País deve chegar ao final do ano com 100% de suas riquezas em dívidas”, disse Maia, explicando que a pauta também está sendo obstruída pela oposição: deputados desejam que primeiro seja votado o auxílio emergencial complementar. Para ele, há risco de o Brasil voltar a ter uma crise semelhante à do governo Dilma Rousseff em 2015.

A briga no Congresso envolve poder e dinheiro. Liderado pelo deputado Arthur Lira, candidato do presidente Bolsonaro à Presidência da Câmara, o Centrão quer que a deputada Flávia Arruda presida a CMO, mas há resistência grande à sua escolha. Se conseguir o comando da comissão, o grupo manterá o controle da tramitação do Orçamento da União e da distribuição de recursos. Sem acerto, os partidos trancaram a pauta da CMO, obstruindo os trabalhos legislativos. O Centrão ameaça adiar para fevereiro a aprovação do Orçamento de 2021, o que provocaria um caos nas contas públicas. Mas as artimanhas parecem não preocupar o governo. “O Centrão está tão calmo que não votou nada nesses dias. O grupo já se dispôs a votar tudo até a segunda semana de dezembro”, afirma o líder do governo, Ricardo Barros.

Além de ser responsável por analisar os projetos que definem os gastos do Executivo, a Comissão vota também a Lei Orçamentária Anual (LOA), onde são organizadas as receitas e despesas para o ano seguinte. É aqui que a disputa atinge de imediato o cidadão. Para bancar o Renda Cidadã, que deve substituir o Bolsa Família, a equipe econômica busca cerca de R$ 20 bilhões no orçamento. Se não conseguir os recursos, o governo estima que 8 milhões de pessoas devem ficar sem auxílio de renda mínima no início do ano. Relatório elaborado pela Comissão Mista que analisa os gastos com a pandemia aponta que uma das saídas para equilibrar as finanças seria a revisão de renúncias tributárias, que saltaram de 2,0% do PIB em 2003 para mais de 4% do PIB desde 2015. Mas o governo também perdeu essa batalha, mesmo com o apoio do Centrão, pois a Câmara votou contra o veto de Bolsonaro no caso das desonerações para folha de pagamentos. O Brasil caminha para uma derrocada financeira que pode fechar as portas para muitos investimentos estrangeiros. A chave está nas mãos do Centrão, mais uma vez.