Ninguém pode prender uma ideia, mas pode fazer dela um aplicativo para promover relacionamentos amorosos entre pessoas com o mesmo alinhamento político. Nesta época de solidão, brigas no almoço de família e desavenças no trabalho, está surgindo a rede social PTinder, um recurso para buscar namoros entre pessoas de esquerda que querem ficar longe do meio ambiente tóxico dos tais “discursos de ódio”.

A filósofa Elika Takimoto lança o aplicativo de relacionamento da esquerda: o PTinder. De onde saiu Janja, tem mais. Lula foi o precursor ao encontrar uma namorada na base analógica de militantes petistas (Crédito:Divulgação)

Amor digital saudável entre petistas e assemelhados é o que defende a criadora do PTinder, a doutora em filosofia e youtuber Elika Takimoto, de 46 anos, em parceria com a advogada Maria Goretti Nagime, de 35. Para a dupla de influenciadoras digitais cariocas, o PTinder serve como válvula de escape para “o amor em tempos de cólera”, como dizem, fazendo trocadilho com o romance de Gabriel García Márquez. Inicialmente, a rede será hospedada em um perfil no Instagram. O plano é fazê-la migrar em seguida para um aplicativo próprio, onde as pessoas poderão encontrar o que as inventoras chamam de um “partidão de esquerda”.

Coraçãozinho vermelho

Takimoto explica que a ideia veio à mente depois de um amigo ter caído na fossa por causa de um fora. As duas postaram uma foto dele com as suas características e a legenda: “Advogado, diretor de escola técnica, bom papo e, lógico, de esquerda”. Resultado: choveram candidatas. “E se fizessem um Tinder voltado à esquerda?”, pensaram, lembrando o aplicativo de relacionamento. “Primeiro pensamos em um nome mais brasileiro, como PTsão. Mas o apelido PTinder acabou pegando”, diz Takimoto.

“A pessoa não quer sair de casa e correr o risco
de topar com um fascista”
Elika Takimoto, doutora em filosofia,
influenciadora digital e idealizadora do PTinder

O sistema começou de forma intuitiva. O ex-presidente Lula se revelou um visionário do amor. Ele encontrou uma noiva, Janja, vasculhando a base de dados analógica de militantes petistas casadoiras (sim, isso existe). Trata-se de um cadastro semelhante ao de informações sobre os quais se constroem as redes sociais digitais.

Sem medo de match

O PTinder se destina aos donos de um coração politicamente vermelho. Nele, não existe “match”, mas “marx”. Ali, não se procura a metade da laranja — afinal, isso é coisa do Fabrício Queiroz —, mas a da estrela. “Todo mundo está com medo de se relacionar”, afirma Takimoto “Se as pessoas que já se conhecem vivem brigando, imagine com quem chegou agora.” O medo maior, segundo ela, é sair de casa e dar de cara um assustador fascista da linha bolsominion.

No PTinder, até onde analisou a equipe que está desenvolvendo o aplicativo, não se pode impedir totalmente encontros constrangedores, mas serão aplicados filtros. O dono do canal do YouTube Brasil 247, Leonardo Attuch, também promete critérios irrefutáveis para rechaçar invasores e desenvolver um aplicativo invulnerável aos avanços da direita. “Se houver algum infiltrado, será expelido naturalmente”, diz. Ele está desenvolvendo uma rede social nos moldes do PTinder. O pré-requisito é ser assinante do veículo: “Como não temos simpatizantes bolsonaristas…” Será?

Alguns críticos argumentam que é necessário pensar em estratégias que superem o automatismo dos protocolos digitais. Segundo a professora Adriana Amaral, da pós-graduação em Comunicação da Unisinos, em São Leopoldo (RS), o projeto reflete a forma como o tecido social se constitui no momento, quando vivemos fechados em bolhas. “É tanto uma questão de ordem social como da materialidade dessas plataformas, que potencializam esse comportamento”, afirma.