06/04/2018 - 16:15
Um guerreiro contra a corrupção endêmica no Brasil ou um moralista que criminaliza a política? Todas essas imagens são atribuídas ao juiz Sérgio Moro, que ganhou as manchetes de todo o mundo ao emitir o mandado de prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Em julho ele já havia condenado o líder da esquerda brasileira a nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Uma condenação confirmada em segunda instância e uma sentença ampliada para 12 anos e um mês em janeiro.
E na quinta-feira (5) apertou o cerco, ao intimar Lula a se entregar em um período de 24 horas em Curitiba, berço da Operação ‘Lava Jato’, referência mundial da luta contra a corrupção em suas diferentes frentes – falsificar licitações, desviar dinheiro, esvaziar os cofres das companhias públicas e comprar apoio político.
O início de tudo estava na Petrobras e a partir dela caíram impérios, como o da empreiteira Odebrecht.
Passaram por seu julgamento supostos intocáveis das finanças e da política, de esquerda, centro e direita, aqueles que não gozavam de foro privilegiado graças a seus cargos ministeriais ou legislativos.
E Lula se tornou sua maior presa.
– Lula: ‘Moro estava condenado a me condenar’ –
O interrogatório ao qual submeteu Lula em maio de 2017 foi um confronto entre dois universos que, no Brasil, parecem completamente distantes entre si: o que está saturado pela corrupção e o que está indignado pela miséria.
“Senhor ex-presidente, eu queria deixar claro que, embora existam algumas alegações nesse sentido, da minha parte não tem qualquer desavença pessoal em relação ao senhor ex-presidente. Quem vai definir o resultado [do julgamento] são as provas e a lei”, afirmou Moro, antes de iniciar o interrogatório do fundador do Partido dos Trabalhadores.
Quando perguntado se se sentia responsável pelo esquema de propinas montado na Petrobras, Lula respondeu: “doutor Moro, o senhor se sente responsável de a Operação ‘Lava Jato’ ter destruído a indústria da construção civil nesse país? O senhor se sente responsável por 600 milhões de pessoas (sic) que perderam emprego no setor de óleo e gás e da construção civil? Eu tenho certeza que não”.
Após ser condenado como proprietário de um tríplex oferecido pela construtora OAS para ganhar licitações na petroleira, Lula afirmou: “o juiz Sérgio Moro, refém da mídia, estava condenado a me condenar. Os procuradores, presas de uma megalomania, asseguram que o Partido dos Trabalhadores queria o poder para roubar”.
O momento cara a cara entre essas duas figuras antagônicas no Brasil começou em março de 2016, quando Moro ordenou que a polícia revistasse a casa de Lula em São Bernardo do Campo e o levasse em condução coercitiva a depor.
Naquele mesmo mês, o juiz divulgou uma conversa entre o ex-presidente e sua sucessora, Dilma Rousseff, que sugeria a sua nomeação ao ministério para que pudesse contar com foro privilegiado, protegendo-se, assim da Justiça comum.
Lula foi nomeado, mas nunca pôde assumir.
“Eu, sinceramente, estou assustado com a República de Curitiba. Porque a partir de um juiz de primeira instância, tudo pode acontecer nesse país”, afirmou Lula em uma conversa por telefone grampeada e divulgada com a autorização do próprio magistrado.
Em uma entrevista à AFP em março, Lula criticou a “força-tarefa” dos investigadores da ‘Lava Jato’, afirmando que, “na verdade, querem criminalizar a política”.
– ‘Mãos Limpas’ –
Moro nasceu há 45 anos na cidade paranaense de Maringá, e ali se formou em Direito, tornando-se juiz em 1996. Doutor e professor universitário, completou sua formação na respeitada Universidade de Harvard.
É admirado por muitos de seus pares, que o definem como um juiz preparado, rápido e decidido. Seus detratores o consideram abusivo no uso das prisões preventivas e das delações premiadas.
Fascinado por decifrar os caminhos do dinheiro sujo, o astro da Justiça brasileira sempre foi encantado pela histórica Operação “Mani Pulite” (“Mãos Limpas”), que desarticulou a complexa rede de corrupção que dominava a Itália nos anos 1990.
A imagem de um juiz preocupado com um mundo mais justo se viu manchada este ano, quando justificou o polêmico auxílio-moradia que todos os magistrados recebem, embora morem em casas que são suas nas cidades em que trabalham.
Esse subsídio, declarou, “compensa a falta de reajuste dos vencimentos desde 1º de janeiro de 2015”.
Moro é casado com Rosângela Wolff, fervorosa defensora de seu marido nas redes sociais, com quem tem dois filhos.