O ex-juiz Sergio Moro, cuja renúncia do Ministério da Justiça priva o presidente Jair Bolsonaro de um de seus principais colaboradores, incorporava suas promessas eleitorais de combate à corrupção.

Moro, de 47 anos, ministro da Justiça e Segurança Pública desde a chegada de Bolsonaro ao poder em janeiro de 2019, anunciou sua renúncia depois que o presidente substituiu o chefe da Polícia Federal (PF), principal força de investigação judicial, subordinada à sua pasta.

“Não tenho como persistir com compromissos que assumi, sem condições de trabalho, sem ter como preservar autonomia da PF. Ou sendo forçado a sinalizar concordância com interferência politica na PF, cujos resultados são imprevisíveis”, explicou Moro, em declaração à imprensa em Brasília.

O ex-magistrado, que durante anos comandou a maior operação anticorrupção da história do Brasil (Lava Jato) e enviou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a prisão, continua a ter grande popularidade, apesar de sua reputação ter sido manchada no ano passado pelo vazamento de mensagens que questionaram sua imparcialidade no processo do ex-mandatário.

Ele é o segundo ministro-chave a deixar o governo nas últimas semanas. O titular da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, caiu depois de insistir na necessidade de manter medidas de confinamento para enfrentar a pandemia do novo coronavírus, contrariando a opinião de Bolsonaro.

– Lava Jato –

Moro nasceu em agosto de 1972, em Maringá (Paraná). Em seu estado, formou-se em Direito e se tornou juiz em 1996. Doutor e professor universitário, completou sua formação em Harvard.

Fascinado por decifrar os caminhos do dinheiro sujo, acompanhou cuidadosamente a histórica operação “Mani Pulite” (Mãos Limpas), que desmantelou uma complexa rede de corrupção na década de 1990 na Itália.

Importando esse modelo para o Brasil, como juiz de primeira instância de Curitiba, ganhou notoriedade e prestígio: com a Operação Lava Jato, propôs-se a erradicar a corrupção na maior potência econômica da América Latina.

Desde 2014, a operação expôs uma vasta rede de propinas pagas por construtoras a políticos para obterem contratos com a estatal Petrobras.

As investigações levaram à condenação dezenas de políticos de praticamente todo o espectro ideológico e de grandes empresários.

Seu maior troféu foi Lula, a quem condenou por corrupção e lavagem de dinheiro e que foi preso em abril de 2018.

– Juiz imparcial? –

Mas, ao mesmo tempo em que seus aliados o definiam como um magistrado rápido para decidir, preparado e resoluto, seus detratores apontaram abusos no uso de prisões preventivas, das delações premiadas e no vazamento dos casos à imprensa para conquistar a opinião pública.

Sua incorporação às fileiras do governo também dividiu os brasileiros: enquanto alguns comemoraram a passagem de seu “herói” ao Executivo, outros interpretaram sua adesão como uma confirmação de suas intenções políticas.

Esse discurso foi reforçado em junho do ano passado, quando o portal The Intercept Brasil revelou supostas mensagens entre Moro e os promotores da Lava Jato, sugerindo certa intimidade entre as duas partes.

Isso colocou em xeque a imparcialidade de Moro em julgar Lula, que foi impedido de participar das eleições de 2018, devido à sua condenação.

O líder histórico da esquerda, de 74 anos, foi libertado em novembro de 2019, após uma decisão do Supremo Tribunal Federal que permitiu que condenados em segunda instância, como ele, aguardassem em liberdade o veredicto dos tribunais superiores.

A conduta de Moro também foi parar no STF, que ainda deve decidir se ele agiu com imparcialidade. Se considerar que não, a condenação de Lula poderá ser anulada, e seu caso ser julgado novamente.

Apesar dessas manchas, muitos analistas veem Moro como um possível candidato para as eleições de 2022.

Moro é casado há mais de 20 anos e tem dois filhos com a advogada Rosângela Wolff, uma ferrenha defensora do marido nas redes sociais.