Aplausos, por favor, ao deputado federal Marcelo Aro (PP-MG), que desmentiu nesta sexta-feira o presidente Jair Bolsonaro, a respeito da paternidade do coronavoucher.

Ontem, o presidente tuitou a seguinte historinha (a linguagem é aquela coisa, mas dá para entender o sentido geral):

“Depois do Congresso apoiar R$ 500 para o auxílio emergencial, estudos do governo federal, com responsabilidade fiscal e apoio da liderança do governo na Câmara, o Ministério da Economia alcançou os R$ 600 pagos em 3 parcelas. O maior programa de auxílio aos mais necessitados do mundo!”

Hoje Aro, que foi relator do projeto do coronavoucher na Câmara, publicou um desmentido, também no Twitter:

“Presidente, isso não é verdade. Vamos contar a história real? Fui relator do projeto. Seu governo foi contra o meu relatório desde o primeiro momento. Vocês não admitiam um valor acima de R$ 200. Construí junto com sua base de apoio do centro e a oposição um texto com um valor de R$ 500. Somente quando viram que o projeto seria aprovado, mesmo com os votos do governo contrários, seu governo sugeriu construir um acordo. Não foi estudo. Foi um telefonema. Nessa ligação, decidimos que o acordo, para o governo não ficar de fora, seria de R$ 600. Essa é a história verdadeira e o senhor sabe disso.”

Direto no queixo. Nocaute.

Já falei disso aqui. Mas não é apenas porque mentiras ditas por governantes não devem passar em branco que tenho insistido no assunto. Ele tem a ver com as prioridades do governo no campo sócio-econômico.

Será que é só oportunismo esse negócio de posar de defensor dos necessitados? Ou será que a crise embaralhou algumas cartas na cabeça do presidente e de seu posto Ipiranga, o ministro da Economia Paulo Guedes?

Nesta semana, Guedes disse que pretende implementar o programa Renda Brasil, que seria mais amplo que o Bolsa Família. Ele não deu detalhes. Mas também não é correto dizer que se trata de um coelho tirado repentinamente da cartola.

A ideia já estava presente no plano de governo apresentado por Bolsonaro nas eleições de 2018. Lá está escrito: “Acima do valor do Bolsa Família, pretendemos instituir uma renda mínima para todas as famílias brasileiras.”

A inspiração não vem da esquerda, muito menos de Eduardo Suplicy, o eterno paladino da renda básica universal. A inspiração vem do economista liberal Milton Friedman, que também defendeu essa transferência de recursos para os mais pobres, descrevendo-a como um “imposto de renda negativo”.

Até o início da pandemia, contudo, a atenção de Paulo Guedes estava 100.000.000.000% voltada a garantir o equilíbrio fiscal, reduzindo os gastos do governo, e a realizar reformas pró-iniciativa privada. A renda mínima era ideia para bem mais tarde, para depois que as contas públicas estivessem arrumadas. Para um segundo mandato, digamos assim.

O ministro dava até sinais de nutrir sérias reservas em relação aos pobres, acusados de ser responsáveis pela degradação do meio-ambiente e de ter ambições descabidas, como viajar para a Disney.