O secretário-geral da Presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luciano Felício Fuck, defendeu que a Lei do Abuso de Autoridade, em tramitação no Congresso com apoio expresso do senador Renan Calheiros (PMDB/AL), crie tipos penais específicos. “Não apenas para policiais, mas para todos que exerçam a autoridade estatal, como magistrados, promotores, procuradores e até parlamentares”, ele recomenda.

Fuck participou da reunião do Conselho Superior de Assuntos Jurídicos e Legislativos da Fiesp (Conjur), nesta segunda-feira, 22, em que se debateu o projeto de lei sobre crimes de autoridade. A reunião foi conduzida pelo ministro Sydney Sanches, presidente do Conjur. As informações foram divulgadas pela Agência Indusnet/Fiesp.

O secretário-geral do TSE trouxe à mesa o II Pacto Republicano, em 2009, em que se destacou a necessidade de atualização de instrumentos para tornar o Judiciário mais célere e efetivo. Os subscritores do documento foram quatro: ministro Gilmar Mendes, então presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Inácio Lula da Silva, então presidente da República, Renan Calheiros, na presidência do Senado, e Michel Temer, na Câmara. Eles assinaram o pacto, que previa aprovação de leis sobre composição do Conselho Nacional de Justiça e sobre os precatórios.

“Ficaram pendentes o abuso de autoridade, a responsabilidade civil do Estado e a conclusão da reforma do Judiciário”, assinalou Luciano Fuck.

“Abuso de autoridade ocorre quando há arbitrariedade. Punição tem que ser rápida, seguido o devido processo legal, e exemplar”, prega o secretário-geral da Presidência do TSE. “A lei é necessária e é preciso que ela tenha tipos penais.”

O desembargador Rui Stoco, que integrou a mesa de debates, fez um relato sobre a discussão do novo texto. Segundo ele, lei antiga já previa os mesmos’sujeitos ativos do novo projeto, mas a sanção estabelecida a tornou inócua’.

A Lei do Abuso, ainda vigente, data de 1965 – ano seguinte à instalação do regime militar no País. “Em resumo, a lei em vigor se tornou inviável”, disse Stoco. Segundo ele, a lei ‘virou letra morta, foi esquecida’.

Na opinião do desembargador, não procedem críticas de que a nova Lei do Abuso seria uma estratégia para enfraquecer a Operação Lava Jato. “A discussão começou antes dela”, anotou.

Stoco também afirmou que a atuação da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e do juiz Sergio Moro não teve nenhum fato que levasse a seu enquadramento na nova lei. Destacou que o projeto abrange todos os que detêm cargos públicos e os que têm poder de julgar. Pelo novo texto, os efeitos da condenação não mudam, inclusive indenização e perda do cargo. Em sua opinião, é mais garantista, porque apenas em caso de reincidência o agente público pode perder o cargo.

O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel disse que ‘não há como falar em abuso de autoridade sem falar na índole historicamente autoritária da sociedade brasileira’.

“Como consequência desse autoritarismo há um déficit de cidadania”, assinalou Maciel. “Existe confusão entre público e privado, que se expressa no patrimonialismo. Outro traço é a condescendência. E o autoritarismo leva à dependência, com a criação de um Estado-babá. Da leitura da lei, diria que não é regra, porque penas são pífias. Lei vigente não pune nada.”

O ex-secretário observou que a legislação vigente ‘é uma lei sancionatória do abuso de autoridade, adotada num momento de elevado autoritarismo’. Ele ressaltou que não a desqualifica em razão de quem a sancionou, ‘mas por seu conteúdo nulo’. “Quem não quer a nova lei deve considerar que a atual está boa, preferindo manter o abuso de autoridade em detrimento da cidadania.”

Luis Inácio Adams, ex-advogado geral da União e novo integrante do Conselho Superior de Assuntos Jurídicos e Legislativos da Fiesp, disse que sempre percebeu ‘a necessidade de estabelecer checks and balances (pesos e contrapesos) para o Estado’. “Ele reproduz dinâmicas e práticas que remontam ao Império”, disse.

A lei, explicou Adams, exige do agente público motivações objetivas, claras e impessoais. “Prestação do Estado tem que ser efetiva”, defendeu. Em sua opinião, o novo projeto ‘é tímido, mas necessário’. Sugeriu aprimoramento do texto.

Helcio Honda, vice-presidente do Conjur e diretor titular do Departamento Jurídico da Fiesp e do Ciesp, disse que considera o projeto ‘necessário para suprir lacuna em nosso ordenamento, existente desde 1965’.