A seca histórica deste ano já faz pelo menos 53 municípios de cinco Estados racionarem água, afeta a navegação e ainda contribui para o desequilíbrio do ecossistema nas Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do País. Na lista de cidades com rodízio no abastecimento aparecem até centros urbanos grandes, como Curitiba e a região metropolitana.

As bacias dos Rios Grande, Paraná, Paranapanema e Paraguai – que banham São Paulo, Paraná, Minas, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul – estão sob os efeitos da estiagem severa. Segundo o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, por exemplo, o Brasil teve a menor entrada de água nos reservatórios dos últimos 91 anos no período chuvoso de setembro de 2020 a março deste ano.

No Paraná, além da capital, outras 28 cidades da região metropolitana estão com rodízio de 36 horas com água e outras 36 sem fornecimento. Manter serviços como a lavagem de pratos e a cozinha funcionando virou um desafio para Gustavo Paz, de 42 anos, dono de um bar em Fazenda Grande Rio, a 26 quilômetros de Curitiba.

“Neste período, raciono o máximo que consigo, haja vista que minha casa é um sobrado e o bar ocupa a parte de baixo. Tenho mil litros de água nas caixas d’água, mas às vezes não é suficiente pela forma com que elas foram distribuídas pelo imóvel”, diz. “Procuro equilibrar a limpeza de pratos, talheres, principalmente nos dias em que há fornecimento de água”, conta Paz, que já trocou copos de vidro pelos de plástico com a dificuldade de lavagem.

A Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) disse que a medida foi necessária para afastar a possibilidade de colapso no sistema de abastecimento. Além do histórico de poucas chuvas, projeções meteorológicas indicam prolongamento da estiagem. Em julho, choveu 14,6 milímetros na região, diante da média histórica de 92,4 mm no mês. No interior, as cidades de Santo Antônio do Sudoeste e Pranchinha também racionam.

Desde o início de julho, os 170 mil moradores de Itu (SP) recebem água em dias alternados. Os mananciais operam com 32% da capacidade. A Companhia Ituana de Saneamento disse enfrentar a pior estiagem das últimas nove décadas. O mecânico Alexandre Rodrigues, de 46 anos, a mulher, Pâmela, e os filhos de 2 e 7 anos já se acostumaram com a falta de água na torneira, mesmo morando a 500 metros de uma das represas que abastecem Itu. “A gente se vira como pode, controla o tempo no banho, espera juntar a roupa para lavar e, quando lava, recolhe a água da máquina para lavar a casa”, conta ela, que mora há mais de 7 anos ali. Crises de abastecimento se repetem com frequência. “Virou uma coisa normal.”

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Um plano de racionamento foi adotado também em Salto, na mesma região, desde 7 de julho. Os moradores recebem água 12 horas por dia. Em Bauru, 90 mil pessoas abastecidas pelo Rio Batalha também enfrentam rodízio. Em Rio Preto, 100 mil ficam sem água de 13 a 20 horas. A represa municipal, que produzia 450 litros por segundo, agora fornece 300. Quem reincidir no desperdício leva multa de R$ 2,2 mil. Em Santa Fé do Sul, uma das represas secou e a outra opera com meia capacidade.

A falta de chuvas já compromete o abastecimento em cidades do Pantanal sul-mato-grossense, como Coxim e Corumbá. As prefeituras usam bombas móveis para captação de água, por causa do afastamento das margens. A Empresa de Saneamento de Mato Grosso do Sul (Sanesul) informou que há risco de intermitência em alguns sistemas de abastecimento operados pela companhia, como em 2020. Informou ainda ter contratado a perfuração de 13 poços em localidades que estão sujeitas a ficar sem água. Várzea Grande, vizinha de Cuiabá, abriu licitação para a contratar 40 caminhões-pipa.

Ameaça

A Grande Belo Horizonte também corre risco de desabastecimento. O Rio das Velhas, responsável por abastecer 60% da região, entrou em estado de alerta no dia 3, segundo o Comitê da Bacia Hidrográfica. A Companhia de Saneamento de Minas (Copasa) informou ter reduzido a captação no rio em 500 litros por segundo e esse volume é compensado por outras fontes. A empresa, por ora, descarta racionamento, mas pede que a população economize. No interior, há racionamento em cidades como Campanha e São Gonçalo do Sapucaí.

Até outubro

No Sudeste e Centro-oeste, o último período chuvoso durou menos, o que agravou a seca, que deve durar ao menos até o fim de outubro. “Depois que chove, o tempo de resposta das bacias para normalizar o nível dos rios tem defasagem de dois a três meses”, diz Ibrahim Fantin da Cruz, especialista da Universidade Federal de Mato Grosso.

Após a seca longa, segundo ele, é preciso encharcar o solo e alimentar lençóis freáticos exauridos. “Quando pensamos em mudanças climáticas, sabemos da importância da Amazônia para o transporte de umidade ao Sudeste e ao Centro-Oeste. Mas também é preciso pensar em (preservar) vegetações nativas locais, próximas dos mananciais, importantes para infiltração da água e alimentação de rios”, aponta. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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