A cegueira política em relação aos negros brasileiros beira o absurdo. Mesmo discriminado social e esteticamente, o orgulho do pertencimento negro em autodeclarações saltou de 42% para 54%, nos últimos 30 anos. As cotas nas universidades e serviço público federal, e as diversas ações afirmativas no setor privado e empresarial, construíram massa critica e uma classe média negra e jovem, que é econômica e intelectualmente forte. Não à toa, os negros já são 52% dos estudantes nas universidades públicas. Tudo isso vem construindo nova consciência de pertencimento e fortalecido reivindicações potentes de igualdade, participação democrática, inclusão política e valorização da diversidade racial. Não à toa pessoas negras são 52% dos candidatos nas eleições desse ano.

Nos Estados Unidos e na Inglaterra, líderes políticos têm se antecipado e compartilhado espaços com esses novos atores. Joe Biden, por exemplo, escolheu a negra Kamala Harris para vice – presidente e os ministros negros Lloyd Austin, Defesa, Michel Regan, Meio Ambiente e Marcia Fudge, Habitação. Ele também nomeou as negras Linda Thomas Grenfield embaixadora norte-americana ONU e Ketanji Brown, ministra da Suprema Corte. A primeira-ministra britânica Liz Truss atenta ao poder
do símbolo e a força dos tempos de mudança, nomeou os negros Kwasi Kwarteng e James Cleverly respectivamente ministros das Finanças e Relações Exteriores. Se os 15% de negros americanos e ingleses exigiram e justificaram uma mudança extraordinária do pragmatismo político para incorporar e acomodar as novas forças em construção, o que dizer do Brasil onde os negros respondem por 54% dos brasileiros, 55% dos católicos, 69% dos evangélicos e pela maioria das mulheres?

Nesse momento, inclusão, valorização e a participação dos negros na política têm de estar no topo da agenda

Se for certo que é essa a nova agenda e que ela chegou para ficar, é certo também que exista uma estratégia contundente criativa e assertiva do pragmatismo político e do marketing eleitoral. Nesse momento, inclusão, valorização e a participação dos negros na política têm de estar no topo da agenda. Tanto nas propostas quanto na retórica. Principalmente para o candidato Lula, cujo partido foi o responsável por grande parte da emancipação dos negros através das cotas e ações afirmativas. E, principalmente quando o adversário põe dinheiro grosso do Auxilio Brasil no bolso dos pobres e miseráveis que, desgraçadamente, ainda são 70% de pessoas negras. Tropicalizando a máxima de Bill Clinton, cuja astúcia e visão de lince impediu a reeleição de George Bush pai e garantiu sua vitória como presidente, em 1992: “são os negros, estúpido”.