23/06/2016 - 10:47
A Carta Democrática Interamericana, que o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, invocou para abordar a crise na Venezuela, é um mecanismo concebido em casos de alteração ou ruptura da linha democrática e constitucional em um de seus Estados membro.
O Conselho Permanente da OEA debate nesta quinta-feira se ativa a Carta contra o país sul-americano.
Aprovada pelos 34 países da OEA em 11 de setembro de 2001, em Lima, a Carta é “principalmente um guia para melhorar o funcionamento dos sistemas democráticos”, escreveu em sua introdução o então secretário-geral da OEA, César Gaviria, que previu uma “nova era” no sistema interamericano.
A Carta define os “elementos essenciais da democracia representativa, entre eles o respeito aos direitos humanos, o Estado de direito, eleições livres e periódicas através do voto universal, pluralidade de partidos políticos e a separação dos poderes públicos”.
Mas desde sua aprovação, os elementos mais polêmicos dizem respeito aos mecanismos que o documento estabelece para fortalecer a democracia ou para reverter casos de alterações ou rupturas da ordem constitucional nos países.
De acordo com o artigo 17, um governo de um país membro pode recorrer ao secretário-geral ou ao Conselho Permanente para pedir assistência em caso de risco à democracia ou seu exercício no poder.
Este caso aconteceu no Equador, em 2005, quando o presidente interino Alfredo Palacios solicitou a intervenção da OEA após a destituição do presidente Lucio Gutiérrez.
De outro modo (artigo 18), a iniciativa também pode surgir do Conselho Permanente ou do secretário-geral para, com o consentimento do governo afetado, realizar gestões diplomáticas neste país.
A pedido de vários países da América Central, a OEA atuou na crise institucional da Nicarágua no final do mandato do presidente Enrique Bolaños (2002-2007).
Mas a Carta também prevê cenários de “alteração da ordem constitucional que afetem gravemente a ordem democrática” ou de “ruptura da ordem democrática” (artigo 19), nos quais a OEA possa intervir sem o consentimento do governo afetado.
O caso mais recente de “ruptura” democrática aconteceu em Honduras após o golpe de Estado contra Manuel Zelaya em 2009. Uma Assembleia Geral extraordinária da OEA convocada pouco depois suspendeu o país centro-americano por quase dois anos, seguindo o artigo 21 da Carta.
– Papel do secretário-geral –Mas em caso de grave “alteração” da democracia, o artigo 20 faculta ao secretário-geral ou qualquer país membro a convocar imediatamente um Conselho Permanente para avaliar a situação.
Esta via, sem precedentes na história da CDI, foi a escolhida por Almagro.
“Na atual situação em que vive Venezuela (…) não se pode mais do que concluir que estamos diante de alterações graves à ordem democrática”, afirma o secretário-geral da OEA no duro relatório de 132 páginas apresentado no fim de maio.
A Venezuela não aceita. “É uma porta para a intervenção que os Estados membros se recusam a abrir”, afirma o embaixador da Venezuela na OEA, Bernardo Álvarez em uma carta na qual solicita o cancelamento da sessão.
Caso a maioria dos 34 países membros (ao menos 18) concordem com Almagro, poderão votar a favor de gestões diplomáticas para promover a “normalização da institucionalidade democrática” na Venezuela.
Se as gestões fracassarem, o Conselho Permanente convocará, com o voto de ao menos dois terços de seus membros, uma Assembleia Geral Extraordinária de chanceleres do continente, que poderia determinar sanções mais extremas como a suspensão do país da OEA.
Para isto é necessário também uma votação de dois terços dos países.
“Se entra em uma avaliação de caráter político”, afirmou o secretário de assuntos jurídicos da OEA, Jean Michel Arrighi.
De acordo com o artigo 19 da Carta Democrática, uma alteração grave da democracia, “enquanto persistir, é considerada um obstáculo insuperável” para a participação do governo nos órgãos da OEA.
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