A Rússia fez grandes investimentos e reforçou a sua presença militar no Ártico, para intensificar os esforços no desenvolvimento de uma rota marítima no norte que ligue a Ásia à Europa.

Na sua ação mais recente, a agência nuclear russa Rosatom apresentou, na terça-feira (5), os seus dois novos reatores RITM-200 que alimentarão o futuro navio quebra-gelo Chukotka.

A necessidade de expandir estas ambições no Ártico, possibilitadas pelo aquecimento global e pelo consequente derretimento das camadas de gelo, aumentou devido às sanções ocidentais contra a Rússia por sua ofensiva na Ucrânia.

Moscou quer redirecionar os seus hidrocarbonetos sancionados para a Ásia através da rota do mar do Norte.

Confrontado com desafios econômicos, o presidente russo, Vladimir Putin, classificou o desenvolvimento da rota como “uma das prioridades estratégicas óbvias”.

Depois de lançar o ataque contra a Ucrânia no ano passado, o governo confirmou planos de investir cerca de 20 bilhões de euros (106,9 bilhões de reais) até 2035 para desenvolver uma rota no Mar do Norte.

As autoridades dizem que o número de portos de escala aumentou recentemente de quatro para 11, com a extensão da rota para a cidade russa de Vladivostok, no Extremo Oriente.

A Rosatom indicou que isso permitiu que 31,4 milhões de toneladas de carga transitassem por essa rota entre janeiro e outubro, 10 vezes mais do que há uma década.

– Incerteza –

“Existem todos os tipos de projetos, mas a Ucrânia e as sanções criaram incerteza sobre como financiar esses projetos”, diz Malte Humpert, do think tank americano The Arctic Institute.

E cita como exemplo o enorme projeto russo de gás Arctic LNG 2, sujeito a sanções dos Estados Unidos em novembro.

“A Rússia não tem muitas alternativas. O mercado europeu está fora de alcance (…). Precisa produzir petróleo e gás e exportar para ganhar dinheiro, e os compradores estão agora na Ásia”, explica Humpert à AFP.

Mas os inúmeros desafios logísticos permanecem.

Quando se trata da frota do Ártico, “substituir tecnologias de países hostis é o principal desafio”, disse o ministro russo do Ártico, Alexei Chekunkov, em maio.

Nos últimos meses, a Rússia recorreu a países terceiros para obter peças de reposição para as suas cisternas de gás natural liquefeito (GNL), muitas vezes fabricadas na Ásia com tecnologia ocidental, à qual a Rússia não tem acesso.

A frota russa está atualmente limitada a 30 navios da classe Ártica em operação e outros 33 em construção, segundo o chefe da Rosatom, Alexei Likhachev.

“Precisaremos de até 100 navios da classe Ártica”, disse Likhachev em maio.

As autoridades russas esperam enviar mais de 190 milhões de toneladas de carga através da rota do Mar do Norte em 2030.

Esse volume não pode competir com o do Canal de Suez, onde os navios transportaram 1,41 bilhão de toneladas de carga no ano passado.

Mas a Ásia é uma rota mais curta do que cruzar o Mediterrâneo até o Canal de Suez.

– Presença militar –

Em setembro, a Rússia enviou os seus dois primeiros navios petroleiros através da passagem do norte em direção à China, sem a ajuda de quebra-gelos para abrir o caminho, uma medida que apresenta riscos ambientais significativos.

“Se petroleiros sem classificação de gelo navegarem nestas águas, poderá haver um grande perigo, um grande risco de vazamentos de petróleo”, alerta Humpert.

O derretimento acelerado das geleiras do Ártico também despertou o interesse de outras potências, como os Estados Unidos e a China.

Nos últimos anos, a Rússia reforçou a sua presença militar na região do Ártico, reabrindo e modernizando várias bases e pistas aéreas abandonadas desde o final da era soviética.

“A Rússia implantou mísseis S-300 e S-400, expandiu pistas aéreas para acomodar diferentes tipos de bombardeiros nucleares. Também criou grandes instalações de radar”, segundo Humpert.

Em agosto, a frota do norte, encarregada de proteger as rotas marítimas do Ártico, realizou grandes manobras militares com mais de 8 mil soldados e vários submarinos.

“O aumento da concorrência e da militarização na região do Ártico, especialmente por parte da Rússia e da China, é preocupante”, disse em novembro o almirante Rob Bauer, chefe do comitê militar da Otan.

“Devemos permanecer vigilantes e nos preparar para o inesperado”, alertou.

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