Um possível suicídio cometido em 13 de outubro de 2016, na Zona Sul da capital fluminense, é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, que considera o episódio um caso de assassinato no qual os dois filhos e o genro do idoso são suspeitos de cometer o crime, conforme divulgado pelo Fantástico no último domingo (30).

De acordo com o MP, a versão relatada pelos parentes de Sérgio Faria Coelho de Souza, de 77 anos, não é real. Peritos apontaram que a hipótese de suicídio é no mínimo estranha, já que a vítima morreu com três tiros á queima-roupa, dos quais dois na cabeça e um no peito. Além disso, o MP afirma que a morte foi motivada pela herança da esposa de Sérgio

“A história inventada pelos investigados começou a ser desmontada em sede policial, em razão da conclusão da perita médica legista do Instituto Médico Legal que se opôs à hipótese de suicídio, diferentemente do que constava na guia de encaminhamento do cadáver. As investigações policiais conseguiram demonstrar que houve ali um brutal extermínio de um ancião de 77 anos de idade que foi atingido por três disparos de arma de fogo, todos com cano da arma encostado em seu corpo. Ele recebeu um tiro que feriu o pulmão e o coração, e dois tiros encostados na cabeça que provocaram a laceração do cérebro e causaram a sua morte imediata”, disse Alexandre Themístocles, o promotor, em entrevista ao “Fantástico”.

Entenda o caso

O episódio aconteceu na casa onde a vítima morava com o filho Sérgio Benoliel Coelho de Souza. Na ocasião da morte do idoso também estavam no local a filha de Sérgio Faria, Daniela Benoliel Coelho de Souza de Oliveira Couto, e o namorado dela, Eduardo Carlos Piccoli. Na versão dos suspeitos, uma discussão por telefone entre o pai e Vera, mulher com a qual o viúvo mantinha um relacionamento por 33 anos, ocasionou tudo.

Nos depoimentos dos filhos, o pai teria saído do seu quarto armado após a discussão e que em determinado momento fechou a porta do quarto e efetuou um disparo. Sérgio, o filho, relatou que “tudo se tratava de um ‘teatro’” do pai. Mas, ao ver o pai abrir a porta do cômodo “ mostrando o peito, com sangue na blusa e perguntou: ‘isso é teatro?’”.

Essa cena, segundo os filhos, gera uma corrida para socorrer o idoso, a qual termina com ambos ouvindo mais dois disparos, o que daria um intervalo de 14 minutos, enquanto aguardavam por socorro.

Quando a polícia chegou, Sérgio já estava morto com um tiro no peito, um no ouvido e outro na mandíbula.

Investigação contesta

“Esse caso realmente me chamou muito a atenção porque foi muito atípico. A gente nunca tinha visto um suposto suicídio praticado com um disparo contra o peito, e dois disparos na cabeça. Por isso, nós fizemos um estudo detalhado e minucioso para poder esclarecer essa situação. Os dois disparos lesaram estruturas nobres no encéfalo, o que impede, ou o que impediria, vamos dizer assim, o segundo disparo. A lesão cardíaca não produziu uma morte imediata. Essa morte poderia ocorrer em alguns minutos. Isso poderia ser suficiente para que houvesse um segundo disparo, mas jamais um terceiro disparo”, disse Luiz Carlos Preste, médico legista.

A investigação foi finalizada dois anos depois e a Polícia Civil pediu a prisão dos filhos e do genro do idoso. Em contrapartida, a defesa dos suspeitos pediu a exumação do corpo, alegando que o laudo não determina o trajeto das balas no crânio.

“Esse tiro atingiu uma área que não levava à inconsciência. Então, nós temos o primeiro caracterizado pelos depoimentos. Foi no peito. O segundo, caracterizado pelo próprio IML e por mim também como sendo esse debaixo do queixo, que esse não tirou a consciência imediatamente. Esse tiro que transfixou os dois hemisférios, esse desacordaria. Portanto o tiro que não levou, o segundo disparo que permitiu um terceiro, foi esse que foi dado abaixo da mandíbula”, disse Nelson Massini, perito particular.

O médico legista do IML refuta a tese do perito particular e afirma que não existe elemento técnico que determina com precisão a ordem dos disparos.

“Tanto um quanto outro disparo na cabeça não iria permitir que a vítima pudesse dar um novo disparo. Porque essas estruturas, tanto num quanto noutro, já teriam sido lesionadas, laceração encefálica, hemorragia cerebral. E isso daí produz uma inconsciência imediata”, rebate..

A advogada Ilcelene Bottari ressaltou também a tese de que os envolvidos viviam um drama familiar.

“A casa onde Sérgio morava era a casa da esposa dele, com quem foi casado com separação total de bens. E os filhos, depois da morte da esposa, o deixaram morar lá. E ele morava lá porque ele já não tinha mais condição de se sustentar, porque recebia uma pensão. E aí ele era ajudado pelos filhos. Eu espero, sinceramente, que a justiça seja feita e que seja reparado esse dano que já é um estrago na família”, disse a advogada.

Ao fantástico, Vera Lúcia de Castro Pinto, citada pelos filhos com quem o pai tinha um relacionamento, disse que na noite da morte de Sérgio ouviu durante o telefonema uma voz feminina reclamando: ‘Essa casa é da minha mãe e eu não quero que essa p… ligue para cá’. Na sequência, Vera ouviu Sérgio responder: ‘Essa casa também é minha’ e novamente uma resposta de uma mulher: ‘Você não é o dono’. Logo depois, a ligação foi encerrada.

O caso ainda aguarda decisão da Justiça para prosseguir. Os suspeitos poderão responder por homicídio qualificado por conta da motivação, além da vítima ter mais de 60 anos de idade.