A intenção de congressistas do Centrão de alterar trechos da Lei das Estatais está explícita: o objetivo é ampliar a influência do governo nas empresas públicas e poder facilitar trocas no comando dessas companhias, evitando assim a repetição de episódios como o ocorrido com o ex-presidente da Petrobras, José Mauro Coelho, que, mesmo demitido, permaneceu no cargo até Caio Mário Paes de Andrade, o indicado de Bolsonaro, fosse aprovado e tomasse posse esta semana.

“A tentativa de alterar a Lei das Estatais é um retrocesso sem precedentes” Michel Temer, ex-presidente (Crédito:Marco Ankosqui)

Sancionada pelo ex-presidente Michel Temer em junho de 2016, a lei provou ser bem-sucedida na redução da interferência de Bolsonaro nas estatais, sobretudo no que se refere ao apadrinhamento de políticos para cargos de conselheiros e executivos nessas empresas públicas, com a proibição, por exemplo, da indicação de dirigentes partidários ou políticos que tivessem disputado eleições nos 36 meses anteriores. Quando foi aprovada, um dos principais objetivos da lei era exatamente a profissionalização da gestão das estatais, deixando-as menos suscetíveis à interferência dos governantes.

Segundo o ex-presidente Michel Temer (MDB), a tentativa de alterar a lei é um “retrocesso” sem precedentes. “Tal iniciativa não deveria sequer ser cogitada. A lei que se pretende amputar significou a moralização das atividades públicas empreendidas pelas empresas estatais e um grande avanço nos costumes políticos do país”, argumentou. Para Temer, a lei teve o mérito de profissionalizar a gestão dessas empresas e, com seu novo regramento, permitiu a recuperação da Petrobras da crise pré-falimentar em menos de um ano e meio. “As estatais prestam grandes serviços ao País e precisam ser protegidas. Por isso, as notícias a respeito das alterações me causam tristeza cívica”.

Não é apenas Temer que não vê com bons olhos a tentativa de Bolsonaro e do Centrão em desfigurar a lei para voltar a permitir a intervenção do governo nas empresas públicas. Para Camila Rocha de Oliveira, doutora em ciência política da Universidade de São Paulo (USP), a possibilidade de se flexibilizar essa lei é algo antirrepublicano. “Essa posição do governo Bolsonaro coloca em risco a imagem e o próprio desempenho das estatais, além de facilitar negociações políticas escusas e desvios de recursos, comprometendo o futuro das empresas”. Para a especialista, a iniciativa dos governistas “pode abrir caminho para preparar as empresas para uma futura privatização”.