Dos 31 nadadores brasileiros que vão competir nos Jogos de Tóquio, considerando-se natação, saltos e maratona, 19 são estreantes em Olimpíadas. Isso significa 61% da equipe. Só na natação, a equipe tem 26 nadadores com 16 novatos. Nos saltos ornamentais, a renovação é ainda maior. Dos quatro competidores, apenas um já esteve numa Olimpíada. É um momento de transição, em que uma geração está tirando a touca e os óculos enquanto a outra se prepara para cair na água. Novatos e veteranos vão nadar contra a corrente a partir do dia 23 de julho: ele lutam para recolocar a modalidade no pódio depois da falta de medalhas nos Jogos do Rio.

As maiores esperanças dos esportes aquáticos estão no revezamento 4 x 100 masculino, nos 50 m masculino e na maratona aquática. Embora seja um fenômeno comum, a renovação deste ciclo olímpico está mais acelerada. A equipe olímpica do Rio 2016 tinha 33 nadadores, com 19 novatos, ou 57%.

Mesmo que sejam iniciantes olímpicos, os nadadores já carregam uma bagagem internacional. Muitos já participaram do Campeonato Mundial, Pan-Americano ou os Jogos Olímpicos da Juventude. Caio Pumputis, um dos grandes nomes da nova geração, soma 42 torneios internacionais. “A renovação tem de existir. Nos Estados Unidos isso é constante. Sempre tem molecada que aparece com força. Nunca tive problema com pressão. A bagagem vai ajudar a manter o controle”, diz o nadador de 22 anos, medalha de prata nos Jogos Panamericanos nos 200 medley e dono do índice olímpico na mesma prova – ele também vai nadar os 100m peito.

“A maioria dos atletas já tem vivência internacional. Isso é importante para a nova geração. Ver que atletas mais novos na primeira Olimpíada motiva os atletas da base”, opina Viviane Jungblut, classificada para os 1500 m livre com o recorde brasileiro de 16m14s00.

Renato Cordani, chefe de equipe da Natação em Tóquio, afirma que o objetivo mínino dos nadadores é alcançar a final. Depois, será a hora de pensar nas medalhas que não vieram na última edição dos Jogos. Em 2016, o País conquistou o recorde de finais na história olímpica – oito – participou de dez semifinais. Foram quebrados quatro recordes sul-americanos e um brasileiro. Mas ficou faltando subir ao pódio. !Nos Jogos do Rio, a natação ficou sem medalhas, e vamos em busca de voltar ao pódio e povoar as finais e semifinais”, diz o dirigente da Confederação Brasileira de Esportes Aquáticos (CBDA).

Uma das maiores apostas de medalha está no revezamento 4 x 100 livre masculino, que deve ser disputado pelos quatro primeiros colocados da seletiva olímpica (a equipe ainda não foi convocada oficialmente). São eles: Pedro Spajari, Gabriel Santos, Breno Correia e Marcelo Chierighini.

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Nessa prova, Correia é o estreante. Considerado um dos melhores do País, o nadador do Esporte Clube Pinheiros sempre vai bem quando fecha revezamentos. Foi assim no Mundial de Guangzhou, na China, dois anos atrás. No 4x100m livre, ganhou o bronze na batida de mão contra o time italiano. Nos 4x200m livre, ele fez melhor parcial da prova com 1min40s98 e garantiu a medalha de ouro para a equipe e o recorde mundial. “A responsabilidade é proporcional aos resultados. Consegui chegar à seleção em 2018 e estou no meu primeiro time olímpico. Quero ser melhor do que sou e sei que preciso ajustar algumas coisas”, diz o atleta de 22 anos.

Outras esperanças de medalha estão em donos de braçadas conhecidas: Bruno Fratus, nos 50 m livre, e Ana Marcela, na maratona aquática (10 km). Fratus, que mora nos Estados Unidos, recebeu uma autorização especial para não precisar vir ao Rio em meio à pandemia e fez uma tomada de tempo na Califórnia. Lá ele completou a prova em 21s80. Uma das grandes estrelas da delegação brasileira, Ana Marcela vai começar nesta segunda-feira, 28, um treino especial de altitude, em Serra Nevada, na Espanha. Em seguida, ela viaja para o Japão.

A natação feminina possui vários rostos novos. Duas delas – Beatriz Dizotti e Viviane Jungblut – estão no 1.500m livre, prova que será disputada pela primeira vez na modalidade feminina. Bia teve tendinite no ombro esquerdo e contou com o suporte da equipe multidisciplinar do Minas Tênis Clube para se recuperar a tempo da seletiva. “O que mudou no meu treinamento foi a minha cabeça. A pandemia foi uma virada de chave. Consegui pensar ‘é isso mesmo que eu quero’. Comecei a pensar: o que tenho que fazer para buscar o meu objetivo? Comecei a levar as coisas ainda mais a sério”, observa a nadadora de 21 anos. “É a realização de um sonho”, resume Giovanna Diamante, atleta do Pinheiros classificada para a prova dos 4x100m medley misto

De tão novos, alguns nadadores ainda convivem com a rotina típica da adolescente. É o caso de Stephanie Balduccini. Aos 16 anos, tem de conciliar as braçadas com as aulas do Ensino Médio do colégio britânico St. Paul’s School, em Santo Amaro. A rotina diária inclui aulas, provas, musculação e piscina. Stephanie fez o terceiro melhor tempo na seletiva aquática, na Parque Aquático Maria Lenk, no Rio de Janeiro. Com isso, ela conquistou uma participação no grupo de revezamento 4 x 100 metros, ao lado de Etiene Medeiros, Ana Vieira e Larissa Oliveira.

Balduccini já fez história antes mesmo da Olimpíada. Ela é a mais nova nadadora nacional em uma olimpíada desde Ricardo Prado em 1980. Ele tinha 15 anos quando foi aos Jogos de Moscou. “Ainda não caiu a ficha de que vou para Olimpíada. E caiu menos ainda em relação a esse feito”, diz a atleta do Clube Paineiras do Morumby. “Eu não achei que fosse acontecer tão rápido. A minha única competição grande foi o Sul-Americano. Agora, vou para uma Olimpíada adulta”. Ela comemora que os Jogos de Tóquio vão coincidir com as férias escolares.

Uma palavra dita nos parágrafos anteriores não pode ficar solta: pandemia. A crise sanitária mundial mudou a vida de todos os atletas e trouxe desafios adicionais para os novatos. Sem piscina em casa, Stephanie trocou o treino por corrida e musculação, mas reconhece que não foi a mesma coisa. Breno Correia perdeu quatro quilos e confessa que ainda está se recuperando.

Com Viviane Jungblut, o desafio foi emocional. Ela outros três atletas não participaram da seletiva olímpica de natação, em abril, porque testaram positivo covid-19. Por isso, eles conseguiram autorização para uma nova tomada de tempos no início de junho, dois meses depois. De casa, ela viu as rivais alcançando o índice. Depois de ter tido sintomas leves, ele conseguiu retornar aos treinos. “Estava preparada em abril, quando tive a notícia que testei positivo. Aquilo me magoou muito, mas tive apoio da minha família e da equipe. Consegui levar para o lado positivo, recuperar as forças até concretizar o sonho de dizer: sou uma atleta olímpica”, conta a atleta do Grêmio Náutico União, de Porto Alegre.

FONTES DE INSPIRAÇÃO – Os novatos da equipe brasileira de natação possuem muitas fontes de inspiração na história olímpica. Vale lembrar que dois nadadores conquistaram seus melhores resultados logo na primeira Olimpíada. Foram eles: Cesar Cielo, que levou o ouro nos 50 m livre e o bronze nos 100 m livre em Pequim-2008, e Joanna Maranhão, que obteve, quando tinha apenas 17 anos, o melhor resultado da história da natação feminina brasileira em Jogos Olímpicos: o quinto lugar nos 400m medley, em Atenas-2004.

“Dedico esta medalha ao meu avô, aos meus pais, e a todos que me ajudaram”, afirmou o nadador ao Estadão à época. Após a chegada ao Brasil, César Cielo foi colocado no carro aberto dos bombeiros e foi passear pelas principais caminhos de São Paulo, como a avenida 23 de Maio.

Um dos maiores nadadores da história brasileira, Gustavo Borges também possui um grande feito de calouros no revezamento brasileiro nos Jogos Olímpicos de Sydney-2000m, na Austrália. Na ocasião, o time nacional conquistou a medalha de bronze no 4×100 metros livre, apesar de lesão sofrida por Fernando Scherer, o Xuxa.

“O Xuxa estava com um pé machucado. E tínhamos dois calouros na equipe. Foi a força do time que trouxe a medalha”, lembrou o ex-atleta, em entrevista ao Estadão. O time brasileiro, na Austrália, contou também com Carlos Jayme e Edvaldo Valério, o Bala. Gustavo Borges já havia conquistado a medalha de prata nos 100m livre de Barcelona-1992 e Atlanta-1996.


Grandes conquistas também foram obtidas em momentos distintos da trajetória olímpica. Djan Madruga, possivelmente o melhor nadador de longa distância da história nacional, conquistou a medalha de bronze no 4x200m livre em Moscou-1980. “O processo de renovação é normal dentro de uma Olimpíada. Alguns veteranos vão ajudar muito, pois já vão para sua 3a olimpíada com o Fratus, Guido, Chierighini e o Leo de Deus. Até mesmo a Etiene Medeiros, que vai para sua segunda olimpíada, com certeza vai ajudar os mais jovens, passando as suas experiências e exercendo liderança”, opina Madruga.

Ricardo Prado pode ser considerado um fenômeno da natação brasileira. Aos 15 anos, fez a sua estreia em Jogos Olímpicos (Moscou 1980). Dois anos mais tarde, Pradinho, como era chamado, quebrou o recorde mundial dos 400m medley. Sua trajetória como atleta foi coroada em Los Angeles 1984, quando conquistou a medalha de prata olímpica. Após abandonar as piscinas, virou técnico de natação e especializou-se em gestão esportiva, exercendo funções gerenciais nos comitês organizadores dos Jogos Pan-americanos Rio 2007 e dos Jogos Olímpicos Rio 2016.

Na história olímpica, também foram marcantes a trajetória de Thiago Pereira, que levou a medalha de prata nos 400m medley em Londres-2012 e a de Fernando Scherer, dono do bronze nos 50m livre de Atlanta-1996.


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