Relatórios produzidos pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) confirmam que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) escondeu informações sobre número de mortes pela Covid-19, além de ignorar recomendações sobre isolamento social e desaconselhamento do uso da cloroquina para tratamento da doença. Os estudos, antes sob sigilo, também levam o carimbo do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

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Produzidos entre março de 2020 e julho de 2021, dados indicam que Bolsonaro rejeitou recomendações do Ministério da Saúde. Os relatórios foram produzidos por agentes do Planalto, conforme apurou a Folha de S. Paulo. Distanciamento social e a vacinação eram citados como principais medidas de enfrentamento contra o vírus.

O ex-presidente é mundialmente conhecido por fazer propagandas enfatizando a cloroquina como tratamento contra o vírus, além de atuar com lentidão – e até se manifestar contrário – a imunização, mesmo com a produção de vacinas em outros países.

Em março de 2020, ele disse que a doença “é muito mais fantasia”, “não é isso tudo que a grande mídia propaga”. Também foi responsável por promover aglomerações, mesmo com estados adotando medidas de isolamento social.

Junto as recomendações, os relatórios também estudaram cenários de avanço do coronavirus no país, com índices de gravidade diferentes. Uma das projeções citadas, por exemplo, indicava 330.216 a 338.558 mortos no período de março de 2021; em abril, o País chegou a marca de 341.097 óbitos pela Covid. ‘Risco de colapso’ foi um termo foi citado em diversos documentos.

Falta de oxigênio

Em janeiro de 2021, Manaus vivenciou uma crise de falta de oxigênio, essencial nos hospitais para o tratamento de pacientes com caso grave de Covid-19.  Havia suspeitas de omissão do Ministério da Saúde, sob gestão de Eduardo Pazuello, sobre demora do envio de ajuda ao Estado, especialmente na capital amazonense.

Bolsonaro minimizou a investigação. Pouco tempo após a situação, o agora ex-presidente chegou a imitar, publicamente, uma pessoa com falta de ar. Apesar das falas de Bolsonaro, ficou evidente que ele ignorou alertas sobre a falta de oxigênio na capital.

Atraso das vacinas

“Em um cenário de descontrole da pandemia no País, maior seria a chance de o vírus sofrer mutações em série e, consequentemente, afetar a eficácia das vacinas desenvolvidas”, afirma o relatório que leva carimbo do GSI.

Porém, Bolsonaro coleciona falas polêmicas e de desprezo com a imunização:

21/10/2020: “Para o meu governo, qualquer vacina, antes de ser disponibilizada à população, deverá ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa. O povo brasileiro não será cobaia de ninguém”;

02/10/2020: “Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina”;

15/12/2020: “Como sempre, eu nunca fugi da verdade, eu te digo: eu não vou tomar vacina. E ponto final. Se alguém acha que a minha vida está em risco, o problema é meu. E ponto final”;

17/10/2020 “Se você virar um jacaré, problema de você. Como é que você pode obrigar alguém a tomar uma vacina que não se completou a 3ª fase ainda, que está na experimental?”

Em março de 2021, declarações das empresas Wajngarten, Pfizer e Butantan confirmaram demora do governo para comprar vacinas. Nas investigações da CPI da Covid, o ex-secretário de Comunicação da Presidência da República Fabio Wajngarten disse à comissão que o Palácio do Planalto demorou dois meses para responder uma carta em que a farmacêutica Pfizer prometia doses do imunizante ao Brasil.

 Cloroquina

Um levantamento do jornal O Globo mostrou que Bolsonaro defendeu o uso da cloroquina em 23 discursos oficiais. O kit Covid foi usado em diversos estados, estimulado pela gestão do ex-presidente. No entanto, os relatórios sob cuidados do Planalto indicam que haviam recomendações sobre o uso do tratamento sem eficácia contra o vírus.

“Estudos recentes realizados em pacientes com Covid-19 que usaram esses medicamentos identificaram graves distúrbios do ritmo cardíaco, em alguns casos fatais, particularmente se utilizados em dosagens altas ou em associação com o antibiótico azitromicina”, afirma relatório de 23 de abril de 2020.