As relações entre as grandes distribuidoras de combustível e a Plural, associação que representa o setor, superam desconfianças. Em um intervalo de quatro meses, o ex-presidente da Petrobras Distribuidora (BR), José de Andrade Lima Neto, deixou o cargo na empresa para assumir a diretoria da entidade. Citado em irregularidades em sua gestão e na Lava-Jato, ficou à frente da estatal no período em que a BR repassou quase R$ 160 milhões à Plural, segundo investigação que corre no TCU.

Engenheiro químico, Andrade Neto deixou a BR em setembro de 2015. Na ocasião, alegou problemas de saúde. O executivo já tinha sido citado em auditoria interna na Petrobras, que detectou que a empresa havia “direcionado” quatro licitações em favor da UTC Engenharia no valor de R$ 574,1 milhões, cinco anos antes.

Tais contratos são investigados pela Operação Lava-Jato. A auditoria descobriu pagamento de propina da ordem de R$ 20 milhões. E ressaltou que o então presidente Andrade Neto e os diretores da estatal à época aprovaram os nomes dos convidados sem contestações.

Andrade Neto assumiu a presidência do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom, que depois se tornaria Plural), logo depois, em janeiro de 2016 – ficou até outubro daquele ano. Apesar de ser usual executivos do mercado terem cargos na associação, fontes do setor acham estranho um ex-diretor da BR citado em escândalo assumir o comando da entidade tão rápido.

Outro questionamento de fontes do segmento se dá pelo fato de Andrade Neto ter sido presidente da BR em um período no qual a estatal foi a principal mantenedora do Sindicom. Reportagem do DIA revelou que o Tribunal de Contas da União (TCU) apura o montante de R$ 158 milhões repassados pela estatal entre 2006 e 2016.

“Entre 2009 a 2016, o Sindicom, segundo seu estatuto, foi praticamente bancado pela BR. Neste período, quem presidia a distribuidora era Andrade Neto, que, mesmo investigado pela Lava-jato, virou presidente da associação. Ou seja, quem dava a palavra final para o repasse dos valores para o Sindicom, logo após sua saída do cargo, foi agraciado pelo próprio sindicato”, contesta uma fonte ligada ao mercado, que pediu anonimato.

No processo 013.450/2017-4, que segue em caráter sigiloso, o TCU investiga o uso de verba pública para custear o sindicato. Estima-se que 45% das despesas do Sindicom no período apurado tenham sido cobertos pela BR. Como agravante, a representação sindical concentra apenas 12 gigantes do setor, que concentram quase 80% de toda a distribuição de combustível no país – entre eles, Shell, Ipiranga, Chevron, Total, Castrol, além da própria BR.

“Não deixa de parecer nebuloso o repasse de milhões em verbas públicas para um sindicato que pode estar reprimindo pequenas empresas a competirem em condições de igualdade. É preciso investigar recursos destinados a um sindicato que iria contra a liberdade de mercado”, disse, em entrevista ao DIA, o procurador do TCU, Marinus Eduardo De Vries Marsico, responsável pela representação que originou o processo.

O estatuto da BR só começou a prever “quarentena” para a saída de executivos em abril de 2016, depois da renúncia de Andrade Neto. Sobre a investigação do TCU, a empresa se posicionou por nota e informa que “recebeu ofício do Tribunal de Contas da União, em março deste ano, e que já prestou os devidos esclarecimentos aos auditores sobre sua participação em sindicatos e associações de classe”.

A Plural/Sindicom, por nota, afirma que “sempre teve como prática contratar profissionais com passagem por suas associadas, pelo aproveitamento do conhecimento do setor”. A associação alega que “Jose Lima Neto atendia este perfil e não existia nada que desabonasse sua conduta” e completa no comunicado: “as contribuições financeiras recebidas pelo Sindicom de suas associadas estão em total conformidade com as regras definidas no Estatuto Social e Regimento Interno. As despesas e investimentos são ainda aprovadas pelo Conselho Consultivo, submetidas à avaliação do Conselho Fiscal, homologadas em Assembleia Geral e devidamente auditadas por auditores independentes.”. A reportagem procurou Andrade Neto, sem sucesso.