Um ano e sete meses. Esse é o tempo em que Vinícius Júnior vem sofrendo ataques racistas na Espanha. No último domingo (21), em duelo contra o Valencia, o jogador do Real Madrid novamente foi vítima de extremistas. O brasileiro foi chamado de ‘mono’ [macaco] por parte da torcida local e, mesmo depois de apontar de onde vinham os insultos, nada ocorreu. A partida foi retomada e, no fim do jogo, o atacante acabou sendo expulso após cair na provocação adversária.

Com o episódio de ontem, o brasileiro chega a 10 denúncias de insultos racistas na Espanha, sendo nove situações dentro de um estádio de futebol. Assim como nas outras ocasiões, a LaLiga, responsável por organizar o Campeonato Espanhol, nada fez. Nenhuma punição é direcionada e a associação pouco faz para proteger uma das maiores estrelas do torneio.

Logo após a partida no Estádio de Mestalla, Vinícius Júnior usou suas redes sociais para criticar a atuação da LaLiga na falta de punição aos infratores. O jogador também rebateu o presidente da associação, Javier Tebas Medrano, afirmando que, em vez de criticar os racistas, o mandatário só aparecia para atacar as denúncias do brasileiro.

“Mais uma vez, em vez de criticar racistas, o presidente da LaLiga aparece nas redes sociais para me atacar. Por mais que você fale e finja não ler, a imagem do seu campeonato está abalada. Veja as respostas dos seus posts e tenha uma surpresa… Omitir-se só faz com que você se iguale a racistas. Não sou seu amigo para conversar sobre racismo. Quero ações e punições. Hashtag não me comove”, escreveu o brasileiro.

Após o posicionamento do atacante, diversos jogadores foram às redes sociais para manifestar seu carinho pelo brasileiro e cobrar punições da LaLiga. Além de atletas, alguns clubes brasileiros e até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também se compadeceram do sofrimento vivido por Vinícius Júnior na Espanha.

O Ministério da Igualdade Racial, inclusive, afirmou que vai notificar as autoridades espanholas e a LaLiga, demonstrando que o governo brasileiro não tolerará novos episódios racistas contra Vinícius.

Relações entre Brasil e Espanha

Enquanto a liga espanhola segue fechando os olhos para os crimes vividos pelo brasileiro, a reportagem procurou advogados especializados para entender quais punições os infratores podem receber e se os episódios recorrentes de racismo podem impactar na relação entre Brasil e Espanha.

Uma vez que o presidente Lula se manifestou e o Ministério da Igualdade Racial notificou as autoridades espanholas e a LaLiga sobre o episódio de racismo, é possível que o ocorrido impacte nas relações entre Brasil e Espanha? Segundo Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em Direito Penal Internacional, o caso de Vinícius Júnior pode, sim, ser um entrave entre os países.

“Quando nós olhamos para o caso do Vini Jr, é necessário nós analisarmos sob dois aspectos: primeiro, o crime foi cometido na Espanha, diante disso há a necessária aplicação da legislação espanhola. A legislação espanhola tem bases muito fortes na legislação alemã, assim como nós temos aqui no Brasil. Então, o racismo por lá é crime e é punido com penas graves como acontece no Brasil. Diante disso, há a necessidade da individualização, da identificação de cada um dos torcedores responsáveis pelos atos de racismo para que, a partir disso, eles sejam punidos”, detalhou Acacio.

“Em segundo lugar, há as relações internacionais entre Brasil e Espanha e, um dos objetivos destas relações, é que cada um dos países tutele os seus nacionais. Quando um espanhol sofre prejuízos jurídicos no Brasil, há a possibilidade da intervenção da Espanha, no caso contrário, as circunstâncias são as mesmas. Há um prejuízo jurídico a um brasileiro, que é ofendido na sua dignidade humana e, o estado brasileiro, diante destas relações bilaterais, tem toda possibilidade de cobrar respostas do estado espanhol. Caso essas respostas não sejam dadas, isso obviamente pode afetar as relações bilaterais e pode levar até a sanções impostas pelo estado brasileiro. Sem contarmos, obviamente, a possibilidade da Espanha ser punida por organismos internacionais, como é o caso da ONU, por exemplo”, completou.

Possíveis punições

“A repetição de insultos racistas direcionados ao Vinícius Júnior fez com que a LaLiga criasse uma comissão específica para cuidar unicamente de casos de racismo contra o brasileiro. Isso mostra, ao menos, que alguma importância tem sido dada a esses lamentáveis fatos. Mas tem sido suficiente? Se os fatos seguem se repetindo, é porque isso não basta. E, ao meu ver, isso ocorre porque as punições aos indivíduos são raras e brandas. Na minha opinião, punir os clubes não resolve o problema, talvez o agrave”, disse Marcel Belfiore, especialista em Direito Desportivo.

“Todos os esforços têm que ser concentrados na identificação e punição exemplar dos indivíduos que cometem esses atos, ainda que sejam centenas deles. Todos devem estar envolvidos na identificação dos torcedores racistas, principalmente os clubes, mas ao final, de nada adianta se apenas poucos deles são punidos e com penas que simplesmente os deixem fora dos estádios por alguns meses. Atos de racismo devem ser punidos com prisão, mas para isso não basta um esforço da LaLiga, é preciso que as leis do país se tornem mais rígidas”, acrescentou.