Um dia após o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, dizer que a Petrobras deveria comprar de volta as refinarias vendidas no governo Bolsonaro, o presidente da Refina Brasil, associação dos refinadores privados, Evaristo Pinheiro, disse ao Estadão/Broadcast que considera o movimento um desperdício de energia, já que não vai agregar nenhum barril a mais na produção brasileira de derivados.

“Temos um déficit de abastecimento de 650 mil barris por dia. Ao invés de estar pensando em como fazer mais capacidade, o governo está colocando energia e esforço em comprar refinarias que já estão produzindo e não vão adicionar nada”, afirmou Pinheiro. “O fato da Petrobras querer comprar de volta (as refinarias) não é novidade, mas se uma ou algumas das nossas associadas resolver vender para a Petrobras, perde o Brasil”, complementou.

O processo de venda de parte das refinarias da Petrobras foi iniciado pelo então presidente da estatal, Pedro Parente, em 2017, que propôs vender 25% do parque de refino para a iniciativa privada, projeto que não foi adiante.

Ao assumir o posto durante o governo Bolsonaro, Roberto Castello Branco pôs a venda metade da capacidade de refino da empresa (1,1 milhão de barris diários), mas a empresa só conseguiu vender uma unidade de grande porte, a atual Refinaria de Mataripe (ex-Rlam), na Bahia, de 300 mil b/d; e duas de pequeno porte: Clara Camarão (RN), de 6 mil m³/d e a Reman, de 46 mil b/d. Também foi vendida a unidade de produção de xisto, a SIX, no Paraná, com capacidade de 5.888 toneladas/dia.

Ao tomar posse, o novo governo acenou com a possibilidade de recompra dessas unidades, mas pode enfrentar problemas com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), já que significaria aumento de concentração de mercado, o que já valeu um Termo de Cessação de Conduta (TCC) para a estatal.

Além disso, a Petrobras anunciou que vai expandir o seu parque de refino em cerca de 500 mil barris diários com a readequação do parque existente e a construção do segundo trem da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco.

Do lado das refinarias, até o momento, apenas Clara Camarão, adquirida pela 3R, tem sinalizado uma intenção de venda, segundo fontes, devido ao prejuízo que a operação tem ocasionado. Nos bastidores se fala em venda até por R$ 1, se a Petrobras se interessar, tamanha a insatisfação com o ativo.

Já a Acelen, controladora da Refinaria de Mataripe, anunciou investimentos de R$ 12 bilhões em dez anos para produzir biocombustíveis no País e, no início de setembro, assinou um memorando de intenções com a Petrobras no biorrefino.

Distorções

Na avaliação de Pinheiro, uma eventual venda para a Petrobras, se ocorrer, será um reflexo do ambiente pouco competitivo no setor. Desde o ano passado, as refinarias privadas aguardam decisão do Cade sobre o preço de venda de petróleo pela Petrobras, que seria mais caro do que o vendido pela estatal para suas próprias refinarias.

A Petrobras alega que, como produtora verticalizada, não teria sentido vender ao mesmo preço para as concorrentes. Outro problema é a defasagem do preço de referência do petróleo, definido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

“A gente tem uma série de distorções competitivas que impedem o investidor de entrar no mercado. O preço de referência da ANP está há 12 meses sem solução, e ainda temos práticas anticoncorrenciais da Petrobras (venda de petróleo mais caro para refinarias privadas) que estamos contestando no Cade, mas que está parado”, avaliou.

Para tentar amenizar a situação, as refinarias pretendem “fazer o dever de casa”, como define Pinheiro, e participar dos próximos leilões da Pré-sal Petróleo (PPSA) – estatal que administra os contratos da União na produção por partilha -, a fim de adquirir petróleo brasileiro do pré-sal a preço competitivo. “Queremos que todas as refinarias privadas participem”, disse o executivo.

A Refina Brasil reúne 8 das 10 refinarias privadas do País, e, de acordo com o executivo, sem estímulo para operar, a solução tem sido a redução de carga – como a própria Acelen já admitiu ao Estadão/Broadcast – e armazenagem, o que pode comprometer o abastecimento no médio prazo.

“As refinarias privadas não vão investir para expandir em novos projetos, porque não vão investir se não tem nenhuma previsibilidade de comprar petróleo a preço competitivo. Enquanto nós não resolvermos o problema basilar, que é dar acesso a petróleo a preço competitivo, as refinarias independentes, sejam elas uma, oito ou 33, nada vai mudar”, concluiu.

Recompra

Nesta sexta-feira, o ministro Alexandre Silveira afirmou que a recompra de refinarias pela Petrobras segue sendo uma ideia em que acredita. Ele falou a jornalistas ao sair da posse do novo presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Thiago Prado.

Silveira disse que unidades vendidas à iniciativa privada no passado recente podem ser recompradas pela estatal ou ter seu controle retomado por meio de parcerias em que a estatal seja majoritária. Ainda assim, garantiu que contratos não serão desrespeitados e que tudo seria feito para respeitar os interesses do investidor privado. Embora não tenha citado, o ministro se referia às refinarias de Mataripe, hoje da Acelen, e de Manaus, pertencente ao grupo Atem.

“A recompra é uma ideia e eu acredito nela. As ideias em que a gente acreditou até aqui aconteceram dentro do possível. Hoje teve anúncio de aumento (no preço dos combustíveis) da Bahia. Mas o Brasil respeita contratos, não vai fazer nenhuma movimentação que não seja no mais absoluto respeito aos investidores”, disse.

No caso de eventuais parcerias em que a Petrobras fique como majoritária, Silveira diz ser favorável aos próprios investidores por dar “mais estabilidade” ao negócio. A recompra de refinarias tem sido um ponto de insistência de Silveira, ao menos publicamente. Nos bastidores da Petrobras, porém, o assunto é tratado com extrema cautela ou mesmo ceticismo.

A jornalistas Silveira defendeu que ativos estratégicos como refinarias fiquem sob o controle do Estado e disse que o governo atual é totalmente diferente do anterior nesse quesito. “Setores estratégicos do País têm que ter a mão forte do Estado para que possamos garantir dignidade ao povo brasileiro”, disse.

Combustíveis

Questionado sobre a pressão nos preços dos combustíveis da Petrobras, em razão da alta das cotações internacionais do petróleo e derivados, Silveira afirmou que a Petrobras anunciou e cumpriu a promessa de abrasileirar os preços da gasolina e do diesel e que, apesar do aumento “vigoroso” nos preços internacionais, os preços seguem baixos no País.

“No ano passado, o preço (do litro de) da gasolina chegou a R$ 8,75. O governo anterior fez toda aquela balbúrdia orçamentária para se reeleger. Fizeram o descalabro de usar dinheiro de imposto para subsidiar combustível. Tivemos a coragem de reonerar esses combustíveis, abrasileirar os preços e hoje temos preços muito menores, apesar da alta internacional ser tão vigorosa”, disse.

Ele defendeu, ainda, maior diálogo do governo brasileiro com a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), a fim de desestimular os cortes bruscos dos países integrantes na oferta mundial de óleo bruto.