Uma grave crise abala a Receita Federal. Desde a semana passada, 1.067 auditores fiscais colocaram os cargos à disposição do Secretário Executivo do órgão, Jorge Rachid. Paralelamente, auditores de todo o País estão em greve há uma semana, mantendo em atividade apenas 30% do efetivo, para não contrariar a lei de greve do funcionalismo. Os auditores denunciam que o Projeto de Lei 5864, que será votado na próxima terça-feira, dia 8, na Câmara, vai desestruturar a Receita, permitindo que os 8 mil analistas façam o mesmo papel dos 10 mil auditores no trabalho de fiscalização e investigação. Constitucionalmente, esse papel é dos auditores, que têm curso superior e preparo para as autuações. Já os analistas, que normalmente têm curso médio, não estariam preparados para a função.

“Querem dar CRM de Médico para um enfermeiro”, diz um auditor da Receita em cargo de chefia. Dos auditores que colocaram os cargos à disposição, 800 são chefes de setor e com isso a Receita está praticamente parada em todo o país. Nesta quinta-feira 3, funcionários do órgão fizeram manifestação no Aeroporto Internacional de Guarulhos, exigindo que o projeto de lei não seja aprovado da forma como está na Câmara.

Os auditores explicam que o relator do PL 5864 é o deputado Wellington Roberto (PR-PB), ligado ao ex-deputado Eduardo Cunha, que mesmo preso ainda pretende influir na Receita, com o objetivo de enfraquecer o órgão e não permitir que ele faça investigações mais aprofundadas na Operação Lava Jato.

“Os deputados investigados na Lava Jato tem interesse em manipular investigações. Ao se permitir que analistas possam fazer fiscalizações, certamente esses trabalhos serão mais frágeis. Esse PL tem o claro objetivo de desmontar a Receita. Na Itália, depois da Operação Mãos Limpas, também se enfraqueceu os órgãos de investigação e o Fisco. Aqui está indo no mesmo caminho”, disse um auditor à IstoÉ que pediu para não se identificar. Os auditores temem falar abertamente sobre a crise e serem transferidos para regiões distantes.

Um dos auditores que não tem medo de dizer que o ex-deputado Eduardo Cunha está por trás do desmonte na Receita é Marchezan Taveira, auditor no Rio Grande do Norte.

“O deputado Wellington Roberto, relator do PL 5864 era o braço direito de Cunha na Câmara. Trabalhou para livrar o deputado da cassação. Inicialmente, o PL foi fechado num acordo com auditores em março deste ano. Ele previa um aumento salarial de 20% em quatro anos, o que consistia num reajuste de 5% ao ano. Além da parte salarial, o PL continha um conjunto de medidas para dar garantias e segurança jurídica ao trabalho de fiscalização. Esse foi o acordo, com o qual concordamos. Mas depois que o deputado Wellington entrou na relatoria, foram feitos 20 novos artigos e mais de 175 emendas que se aprovadas na Câmara desestruturam a Receita completamente. Desfigurou o projeto inicial. A Receita vive um caos, algo inédito no serviço público”, disse Marchezan Taveira.

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Segundo ele, desde o primeiro substitutivo os auditores entraram em greve para garantir a estrutura e a posição da Receita, que sairá extremamente enfraquecida e debilitada caso o substitutivo seja aprovado. A greve não é por reajuste de salários. Até porque o aumento salarial já está garantido e o relator não alterou muita coisa nesse sentido. A greve acontece exclusivamente para chamar a atenção diante da participação fundamental que os auditores vêm tendo nas investigações de corrupção”, explicou Marchezan.

Os auditores querem que o PL estabeleça que para assumir o cargo de Secretário Executivo da Receita, a pessoa tenha que ser auditora e que o nome seja escolhido pelo presidente da República numa lista tríplice,como já acontece na AGU (Advocacia Geral da União) e MPF (Ministério Público Federal).

“Se o secretário executivo puder ser qualquer pessoa, inclusive de fora da carreira da Receita, como quer o PL, vamos deixar o órgão à mercê de interesses políticos”, diz outro auditor.

Procurado pela IstoÉ, o deputado Wellington Roberto não retornou às ligações.

 

 


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