O ano é o de 1960. Numa praça qualquer, Hannah Arendt, Friedrich Von Hayek e Ayn Rand transbordam angústia. O horizonte se descortina a partir de cenários sombrios:

Rand (enquanto ajeita seu cabelo curto e liso) – A liberdade me inquieta. Na verdade, a falta dela. E o indivíduo, o que será do indivíduo?

Arendt (cigarrinho na mão esquerda. Levemente descabelada) – A dominação totalitária tem o objetivo de abolir a liberdade, inclusive eliminar a espontaneidade humana em geral. Escrevi isso nove anos atrás. São as origens do totalitarismo.

Hayek (cenho franzido) – Mas não é possível existir liberdade pessoal e política quando a liberdade econômica
é progressivamente abandonada… O Estado interventor é um perigo. Falo isso desde 1944. É o caminho da servidão.

Arendt – Mesmo depois de Hitler, e eu escapei dele, receio que ainda haja espaço no mundo para o grave e inaceitável cerceamento de liberdades e para a anulação do ser humano como indivíduo.

Rand – Arendt, a raiz da tragédia moderna é filosófica e moral. Digo isso há três anos pelo menos.

Arendt – Concordo, Rand. Eu li sua Revolta de Atlas. Líderes de massas totalitários assentam suas retóricas em mentiras. E supõem que as pessoas vão acreditar em suas declarações, mesmo que recebam provas irrefutáveis da falsidade delas. Pois estão convictos de que, em vez de abandoná-los, essas pessoas vão clamar que sabiam o tempo todo que aquilo tudo era uma mentira e os admirarão por sua esperteza tática superior.

Hayek – Mas será possível que daqui a mais de meio século haja terreno fértil para totalitarismos e ditaduras que floresçam nas mãos de líderes que se ancoram na mentira e na impostura como dogmas de ação?

Arendt – Não é possível que haja espaço para ditaduras que fraudem eleições, prendam oposicionistas, sem qualquer razão, imponham censura aos veículos de comunicação, centralizem o poder e, sob um melífluo discurso de justiça social, provoquem exatamente o oposto: a fome, a falta de recursos básicos para sobrevivência e a redução do indivíduo a pó.

Hayek – Meu temor é que cada intervenção estatal sobre a sociedade acabe justificando uma subsequente. Estados interventores resultam em Estados autoritários.

Rand – Quando você perceber que para produzir precisa obter a autorização de quem não produz nada; quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em autossacrifício; então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada.

Meu lamento, Venezuela