O jornalista carioca Erick Brêtas foi incumbido de um desafio quando assumiu a direção de produtos e serviços digitais da Globo em 2919: tornar o serviço de streaming da Globo apto a competir com os gigantes da área, como Amazon, Netflix e HBO. Para costurar, ele começou a apostar em séries nacionais. O lance mais ousado foi arrebatar da Amazon Prime Video a série sobre Marielle Franco, que fez sucesso imediato. Nesta entrevista exclusiva, Brêtas conta como aconteceu a negociação e seus planos.

 

Erick, o documentário e a série sobre Marielle pertencem ao mesmo projeto, ou um surgiu depois do outro?

ERICK BRÊTAS: Não nasceram como parte de um mesmo projeto. São duas séries diferentes e independentes. A obra documental foi uma encomenda para marcar o início da produção de séries produzidas pelo Jornalismo da Globo para o Globoplay. Ela veio primeiro. Já a série ficcional era um projeto da Antonia Pellegrino e do José Padilha. Soubemos da iniciativa e abrimos negociação com eles, que durou quatro meses.

 

Até que ponto a realidade e a ficção, expressas respectivamente no documentário e na série ficional, podem se complementar?

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

ERICK BRÊTAS: Acredito que toda a pesquisa feita no documentário será útil para a composição da série dramatúrgica. Mas os criadores da obra ficcional terão liberdade no processo de criação do roteiro e poderão fazer pesquisas adicionais. Aliás, isso já está sendo feito.

 

Hoje o público parece muito mais afeito à ficção do que à realidade. A Marielle ficcional, a ser retratada pela série, não pode se sobrepor à histórica e real, que está no documentário? A série pode ofuscar o documentário?

ERICK BRÊTAS: São gêneros distintos, mas acreditamos que uma obra potencializará a outra. Quem assistir ao documentário provavelmente se interessará pela dramaturgia e quem assistir à dramaturgia irá se interessar pelo documentário. Haverá mais de um ano de intervalo entre as duas obras. Cada uma terá o seu momento.

 

Como se deu a negociação para trazer a série que já estava sendo planejada por outra companhia de streaming? Houve dificuldades na negociação?

ERICK BRÊTAS: Soubemos do projeto, nos interessamos e fomos conversar com a Antonia Pellegrino e José Padilha. Eles entenderam que nossa relevância no mercado brasileiro traria muito mais alcance no país. Também oferecemos a possibilidade de aportar nossos talentos ao projeto: autores, diretores, equipe técnica e elenco.

 

Qual a dificuldade de abordar um crime que não foi solucionado? Qual a posição da Globoplay e da Globo em relação à solução do caso?

ERICK BRÊTAS: O fato de o crime não ter sido solucionado exige uma série de cuidados de nossa parte. Não especular sobre autores e mandantes. Ter rigor no respeito aos limites entre a investigação jornalística e a policial. Tratar os suspeitos como tal, não como culpados, já que não houve condenações – mas não ignorar os indícios que existem contra cada um dos envolvidos. A equipe do Jornalismo da Globo sabe perfeitamente como lidar com situações como essa e creio que isso ficará claro para quem assistir à série. Nossa expectativa é de que a obra contribua para o debate sobre o caso na sociedade e que o crime seja integralmente esclarecido.

 


Como foi o contato com José Padilha? Vocês são amigos, conforme você disse. Mas houve dificuldade de trazê-lo para a produção da série?

ERICK BRÊTAS: Essa é uma obra idealizada pela Antônia Pellegrino. Quando Antônia decidiu fazer essa obra, ela também decidiu buscar um realizador que tivesse potência pra fazer com que essa obra ganhasse o mundo. E ela buscou o José Padilha. E quando nós da Globo conhecemos esse projeto foi desta maneira: uma obra de Antônia Pellegrino e José Padilha. Conheço o Padilha há quase dez anos e tenho uma ótima relação com ele, mas não fomos nós que o trouxemos para o projeto.

 

A Globoplay terá participação na distribuição mundial da série e do documentário?

ERICK BRÊTAS: O Globoplay tem exclusividade dos direitos de exibição no Brasil. Os direitos de distribuição internacional serão negociados pela Creative Artists Agency (CAA). Não divulgamos os termos de negócios dessa natureza.

 

Como você analisa as consequências políticas dos dois produtos? A esquerda está protestando, por exemplo, com a participação de José Padilha, autor de “O mecanismo”. E que outras situações da parte política que vocês têm enfrentado? Afinal, Marielle é tanto alvo de admiração como de repulsa, em especial da parte de setores extremistas.

ERICK BRÊTAS: Acreditamos que as duas obras serão importantes para que as pessoas reflitam e conheçam aspectos pessoais da história de Marielle e Anderson. Isto talvez permita que preconceitos sejam revistos e posições sejam reconsideradas. Nosso objetivo é que essas obras ajudem a furar as bolhas de confirmação de vieses tão típicas das redes sociais.


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias