Inchaço, desconforto abdominal, fadiga, diarreia, prisão de ventre e dor de cabeça são os principais sintomas associados ao consumo de alimentos com glúten e relatados em um estudo publicado na revista Gut. O pãozinho e o macarrão, assim como bolachas, pizzas, tortas e tantas outras preparações feitas de trigo, centeio e cevada, contêm essa proteína apontada como a causadora desses incômodos.
Foi atrás de informações sobre a prevalência da chamada sensibilidade ao glúten não celíaca que pesquisadores de universidades de Reino Unido, Itália, México e Estados Unidos realizaram uma revisão de 25 artigos científicos, compreendendo 49.476 participantes, de 16 países. As análises revelaram que cerca de 10% da população relata ter o problema. “O dado impressiona, mas precisa ser interpretado com cautela”, pondera o nutrólogo Diogo Oliveira Toledo, do Einstein Hospital Israelita.
No estudo, grande parte dos participantes também apresentava ansiedade, depressão e síndrome do intestino irritável. “Isso ajuda a reforçar a hipótese de que, em muitos casos, a condição se encaixa melhor dentro do espectro dos distúrbios de interação intestino-cérebro, influenciada por fatores como a microbiota e a sensibilidade visceral”, afirma. Portanto, não estaria relacionada a uma reação imunológica direta ao glúten, como na doença celíaca.
A nutricionista Desire Coelho, doutora pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em comportamento alimentar, observa que a revisão se baseia em autorrelatos, ou seja, não foram realizados testes. “Atualmente, notamos a interferência das redes sociais e de outras mídias que podem levar as pessoas a se identificar e até mesmo passar a sentir alguns sintomas”, afirma Coelho.
Os próprios autores ressaltam a autodeclaração como uma limitação do estudo, mas defendem que o trabalho pode contribuir para a orientação do tratamento personalizado, reduzindo restrições alimentares desnecessárias. Cabe destacar, inclusive, que muitos dos que se autodiagnosticaram resolveram excluir alimentos com glúten do cardápio sem nenhum respaldo médico.
Doença celíaca X sensibilidade ao glúten
Antes de seguir uma dieta sem glúten é fundamental buscar um diagnóstico e procurar entender as diferenças entre os males envolvendo a substância. Esse tipo de proteína está por trás da consistência do pãozinho, dá sustentação à massa e contribui para a crocância da casca e a maciez do miolo.
Mas também pode favorecer prejuízos à saúde em algumas pessoas. No caso da doença celíaca, a gliadina, um dos componentes do glúten, desencadeia uma resposta inflamatória que pode danificar os enterócitos, ou seja, as células intestinais. O resultado desse processo é diarreia, má absorção de nutrientes e comprometimento do estado nutricional.
A doença celíaca é classificada como um distúrbio autoimune e estima-se que atinja 1% da população mundial, sobretudo indivíduos geneticamente suscetíveis. Para o diagnóstico certeiro são necessários diversos tipos de exames. Segundo Toledo, testes sorológicos são o ponto de partida, especialmente a dosagem dos anticorpos antitransglutaminase tecidual (anti-tTG IgA) e o antiendomísio (anti-EM IgA), que ajudam a detectar a reação imunológica ao glúten.
“Em situações de dúvida, a biópsia duodenal continua sendo o padrão-ouro, pois permite identificar a atrofia em certas estruturas do intestino”, explica o nutrólogo. E é fundamental que o paciente esteja consumindo glúten regularmente, antes dos exames, para evitar resultados falso-negativos.
Já a sensibilidade ao glúten não celíaca é uma condição caracterizada por sintomas desencadeados após a ingestão de alimentos com a proteína. Para confirmar o distúrbio, não há um exame específico. “Primeiro, deve-se excluir a doença celíaca ou a alergia ao trigo”, diz o médico do Einstein.
O processo envolve ainda a retirada do glúten, a investigação sobre impactos clínicos, seguida de nova exposição à substância. “O desafio é que muitos pacientes melhoram simplesmente por reduzirem alimentos classificados como ultraprocessados ou ricos em FODMAPs, o que pode confundir a interpretação”, comenta Toledo.
A sigla refere-se a um grupo de carboidratos fermentáveis que desencadeiam reações, sobretudo em pessoas com a síndrome do intestino irritável. A letra F designa o processo de fermentação, O é de oligossacarídeos, D vem de dissacarídeos, M de monossacarídeos e, por fim, P é a inicial de polióis. Aspargo, alcachofra, chicória, brócolis, leite e mel são exemplos de fontes de FODMAPs.
Daí a importância de consultar um profissional de saúde antes de modificar o cardápio por conta própria. Uma vez diagnosticada a doença celíaca, o tratamento exige total retirada de preparações com glúten. “Para pacientes com sensibilidade não celíaca, a conduta deve ser individualizada, já que alguns toleram pequenas quantidades sem sintomas relevantes, enquanto outros relatam desconforto mesmo com traços mínimos”, detalha o nutrólogo.
Cardápios sem glúten
Nas últimas décadas, dietas antiglúten se popularizaram com o apelo do emagrecimento, mas sem qualquer evidência científica. Assim, a substância tornou-se uma espécie de vilã. “Em alguns casos, o que se vê é um desequilíbrio no cardápio, com grande espaço para itens classificados como ultraprocessados, com excesso de farinha branca e aditivos que podem interferir com a digestão”, observa Desire Coelho.
Mas o glúten acaba levando a culpa. Na ânsia de atenuar desconfortos, em vez de optar por hortaliças, frutas, grãos integrais e afins, há quem busque produtos sem trigo, centeio ou cevada. “Mas muitos deles não são saudáveis, embora sejam colocados dessa forma até mesmo nas gôndolas dos supermercados”, aponta a nutricionista. Uma bela analisada nos rótulos ajuda a evitar essas enganações.
Para o médico do Einstein, em muitos casos, o foco deve ser o equilíbrio da microbiota, a melhora do padrão alimentar e a regulação da resposta ao estresse. Estratégias que, não custa lembrar, favorecem a saúde como um todo.
Fonte: Agência Einstein
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