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A VERDADE
Carla Cepollina e seu advogado Eugênio Malavasi, à saída do júri que a inocentou
da acusação de ter matado Ubiratan (abaixo): ela quer que prendam o criminoso

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Eram dezenove horas e um minuto da quarta feira 7 quando o juiz Bruno Ronchetti de Castro, do 1o Tribunal do Júri de São Paulo, começou a ler com voz firme e serena a sentença sobre um dos mais rumorosos casos de assassinato no País – o veredicto que absolveu a advogada Carla Cepollina, 47 anos, da acusação de ter matado no dia 9 de setembro de 2006 o coronel da reserva e deputado estadual Ubiratan Guimarães, famoso por comandar em 1992 a invasão do Carandiru, que resultou no massacre de 111 presos. Ao inocentarem a ré, os sete jurados que compuseram o conselho de sentença (seis homens e uma mulher) confirmaram aquilo que Carla proclamou insistentemente ao longo dos últimos anos – a sua inocência. Desde 2006, ISTOÉ publicou diversas reportagens demonstrando que a polícia não conseguiu reunir provas científicas que sustentassem sua acusação. Nesse sentido, a decisão do júri popular significa também o envio de um claro recado tanto à polícia quanto ao Ministério Público: não se acusa alguém apenas com hipóteses.“A decisão dos jurados é soberana, e eles querem investigações legais e corretas, diz o advogado penal paulista Roberto Podval.

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ALMA E CÉREBRO
Liliana Prinzivalli, advogada e mãe de Carla Cepollina, chega ao júri:
muita emoção, garra e raciocínio lógico para convencer os jurados

A polícia e o Ministério Público tentaram convencer a Justiça de que Carla Cepollina teria matado Ubiratan, à época seu namorado, por ciúme de uma delegada da Polícia Federal, com quem ele mantinha “relação sexual superficial”, como definiu em depoimento a própria delegada. Afirmaram que Ubiratan foi morto na noite de 9 de setembro de 2006, um sábado, e que Carla fora a última pessoa a estar com ele, tendo saído do apartamento por volta das 20h30. A arma do crime não foi encontrada até hoje. A polícia sustenta que a bala que matou Ubiratan é idêntica à outra bala encontrada no tronco de uma bananeira três anos antes do crime e que fora disparada de um revolver calibre 38 que pertencia ao coronel. Com isso, tentaram convencer os jurados de que Ubiratan fora assassinado com sua própria arma, e que Carla, por ter acesso ao apartamento, teria feito o disparo. O revólver pode até ter sido o mesmo, mas daí a dizer quem foi o autor do tiro é uma distância gigantesca. “O que a polícia fez foi trabalhar numa hipótese e não com fatos”, diz o advogado Eugênio Malavasi, que dividiu a bancada da defesa de Carla Cepollina com a mãe da ré, a advogada Liliana Prinzivalli.

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Um laudo do Instituto Médico Legal indica que a morte do coronel e deputado se deu na madrugada do domingo, dia 10 de setembro, e não na noite do sábado, como disse a polícia. Além disso, há registros de operadoras de celulares comprovando que, às 8h21 do domingo, Carla enviou uma mensagem de seu celular para o celular de Ubiratan. O documento mostra que Carla estava em sua casa quando transmitiu o torpedo. A mesma operadora atesta que o telefone do coronel estava desligado e só foi ligado às 11h27, quando então entrou o torpedo. Isso significa que Ubiratan estava vivo quando Carla Cepollina deixou o apartamento na noite anterior. Também significa que alguém, que não Carla, esteve no apartamento da vítima entre a manhã e a noite do domingo, quando o corpo foi encontrado. Esse alguém teria, entre outras coisas, ligado o celular do coronel, mas nada disso foi investigado. Terminado o júri, que demorou três dias, duas provas, no entanto, restam incontestes: a prova de que a própria acusação, que necessariamente se baseia naquilo que a polícia relata, se rendeu à evidência de que nada tem em mãos – e se dividiu. O promotor Calsavara declarou que não recorrerá da decisão do júri, mas seu assistente quer recorrer ao Tribunal de Justiça – embora nenhuma nulidade possa ser alegada, tal o funcionamento isonômico e democrático que o juiz Bruno de Castro estabeleceu no tribunal. Resta, também, a prova da indignação da sociedade, que tem o direito de exigir que polícia e perícia “investiguem direito e não somente em uma única direção de culpa”, como diz o advogado Matheus Gabriel Rodrigues de Almeida. E foi a própria Carla Cepollina a primeira a externar tal indignação: “Estou feliz com a minha absolvição porque sou inocente, mas triste porque o assassino do coronel Ubiratan continua solto.”

Fotos: JB NETO/ESTADÃO; Folhapress; Pedro Dias/Ag. Istoé