Alinhado ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ) gerou desconforto entre líderes evangélicos ao participar de uma solenidade ao lado do presidente Lula (PT).

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Na ocasião, o parlamentar, que é vice-líder da FPE (Frente Parlamentar Evangélica), dedicou ao petista um discurso elogioso e uma oração. O episódio, visto como um gesto de aproximação ao petista, somado a críticas recentes a Jair Bolsonaro, causou tensão no núcleo evangélico.

“Tem lugar na mesa do Pai para termos comunhão. Gostando ou não politicamente de Vossa Excelência e de seus posicionamentos, não temos outra opção pela Bíblia a não ser orar por Vossa Excelência. Pois a obrigação de orar pelas autoridades nos foi imposta pelo nosso senhor”, disse, se dirigindo ao Presidente da República.

Otoni de Paula (MDB-RJ): deputado federal é elo entre políticos evangélicos e o governo Lula (PT) | Reprodução
Otoni de Paula (MDB-RJ): deputado federal é elo entre políticos evangélicos e o governo Lula (PT) | Reprodução

Quem é Otoni de Paula

Otoni Moura de Paula Junior, 47, nasceu no Rio de Janeiro e é filho Otoni Moura de Paulo Pai — pastor evangélico que também seguiu carreira política, tendo sido vereador e deputado estadual pelo Rio de Janeiro. Ele morreu em maio deste ano, vítima de um câncer de fígado.

A trajetória do parlamentar como pastor começou aos 17 anos, segundo informações publicadas em suas redes sociais. Em 1998, fundou a igreja do Ministério Missão de Vida.

A carreira na política começou no ano de 2012, quando foi eleito suplente na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Tentou a Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) em 2014 e não se elegeu.

Em 2016, foi eleito vereador pelo PSC e, em 2018, iniciou seu primeiro mandato como deputado federal pela mesma legenda e firmou sua relação com o então presidente recém-eleito Jair Bolsonaro. Em 2022, já no MDB, foi reeleito.

O primeiro atrito com a direita ideológica se deu por conta das eleições municipais deste ano, quando o parlamentar decidiu não apoiar Ramagem (PL), candidato bolsonarista à Prefeitura do Rio, e declarou voto em Eduardo Paes (PSD).

Já após o desconforto causado pelo aceno a Lula, o parlamentar publicou um vídeo no Instagram explicando o episódio.

“O fato de eu parabenizar Lula porque os programas sociais têm abençoado muito de nossos irmãos me faz ser um traidor? Traidor de quem? Traidor da fé? Traidor da causa?” questionou o pastor.

Repercussão

Uma liderança evangélica ouvida pelo site IstoÉ sob condição de anonimato associou a vinculação de Otoni ao governo federal ao parlamentar ter conseguido emplacar um indicado seu, Wenderson Monteiro, como superintendente do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) no Rio de Janeiro. A autarquia responde ao Ministério dos Transportes, e Otoni negou que a nomeação tenha tido sua influência — embora tenha admitido ser amigo de Monteiro.

Mesmo evitando uma associação clara ao presidente, a posição de Otoni não foi compartilhada por outras lideranças evangélicas. O pastor Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, disse à reportagem que Lula quis “tirar uma casquinha” do projeto de lei sancionado e que o parlamentar não fala em nome do segmento e está “fazendo média” com o petista.

“Não tem aproximação nenhuma com Lula, porque nossa defesa é oposta à do presidente em costumes, pátria e família, temas em que não tem negócio. O presidente enganou os evangélicos na eleição, ao dizer que era contra o aborto, e no primeiro mês de governo sua ministra derrubou portarias do presidente Bolsonaro que dificultavam o aborto. Como pode haver aproximação?”, afirmou.

O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), aliado de Malafaia e colega de comunidade de Otoni na Assembleia de Deus, disse ao site IstoÉ que o parlamentar cumpria seu papel ao participar da solenidade, mas “exagerou” nas falas direcionadas ao presidente. “A postura do deputado Otoni foi exagerada e desconectada da realidade do segmento evangélico. Para quem foi um vice-líder do governo Bolsonaro, as falas dele lá dentro foram muito infelizes”, afirmou o ex-líder da FPE.

“Lula não fez mais do que a obrigação ao sancionar o projeto do deputado Raimundo Santos, este sim merecedor de créditos. Se ele vetasse a lei, nós derrubaríamos o veto, simples assim. O presidente tenta pegar carona na sanção do projeto porque sabe das dificuldades que tem [para conquistar] no voto evangélico, por fazer um governo divorciado dos valores cristãos“, concluiu Sóstenes.

Na mesma linha, o deputado federal Bibo Nunes (PL-RS), colega de Sóstenes na frente, afirmou que os evangélicos “não querem se aproximar” de Lula, apesar das tentativas do petista. “Não tem como o presidente, pelo que ele defende, estar ao lado dos cristãos, sejam eles evangélicos ou católicos“, disse ao site IstoÉ.

Rubens Otoni (PT-GO), um dos 15 integrantes do partido na FPE, afirmou ao site que a sanção foi “mais uma demonstração importante da visão respeitosa que o presidente Lula direciona ao segmento religioso”.

“É importante lembrar que foi nos governos Lula e Dilma que garantimos as leis de liberdade religiosa, o que foi reconhecido inclusive pelo deputado Otoni. O presidente tinha direito de veto, mas a trajetória dele sempre foi de apoio à comunidade evangélica”, afirmou o petista, para quem há “resistência mútua [dos religiosos e da esquerda] a uma aproximação mais efetiva”.