Que nome o próximo papa escolherá?

Primeira vez que um pontífice abdicou do nome de batismo foi no ano 533, para evitar um embaraço. Escolha é parte importante do ritual vaticano, pois revela muito sobre o futuro programa do novo líder da Igreja Católica.Como um papa recebe seu nome? Em sua autobiografia recém-publicada, Esperança, o pontífice argentino morto em 21 de abril descreveu o momento, durante a eleição papal, em que escolheu "Francisco": na quinta e decisiva rodada do conclave de 13 de março de 2013, o nome Jorge Mario Bergoglio foi pronunciado com cada vez mais frequência.

"Quando meu nome apareceu pela 27ª vez, irrompeu aplauso, embora a leitura dos nomes ainda continuasse […] Nesse momento mesmo, o cardeal Hummes se levantou e me abraçou. 'Não esqueças dos pobres', disse. Essa frase me atingiu em cheio, eu a senti até o âmago. Nesse instante me ocorreu o nome 'Francisco'."

Antes, ele não contava ser eleito e "não tinha nenhum nome papal à mão". Essa decisão tornou o pontífice ainda mais especial, pois, em mais de 600 anos, nenhum eleito escolhera uma denominação papal inédita, que ainda não constava em nenhuma estatística do Vaticano.

"Papa Mercúrio"?

Em Esperança, o 266º papa confirma que seu nome estava no ar: "Nos dias do conclave apareceu na praça diante da Basílica de São Pedro um desabrigado com um cartaz pendurado no pescoço: 'Papa Francisco 1º'. Porém isso só me ocorreu vários dias mais tarde, quando diversos jornais publicaram a foto dele."

Se antes de Bergoglio nunca houvera um papa Francisco, os favoritos são: João (23 vezes, a última em 1958-1963), Gregório (16 vezes, por último 1831-1846), Bento (16 vezes, por último 2005-2013), Clemente 14 vezes, por último 1769-1774), Inocêncio 13 vezes, por último 1721-1724), Leão (13 vezes, por último 1878-1903) e Pio (12 vezes, por último 1939-1958). Outros que só foram escolhidos uma vez são Pedro, Fabiano e Constantino.

Os líderes da Igreja dos primeiros séculos, a começar por São Pedro, não mudaram seu nome. "A primeira instância documentada foi em 533, por causa de um embaraço", explica o teólogo e especialista em história papal Jörg Ernesti, de Augsburg: como o religioso romano eleito fora batizado em homenagem a um deus pagão, Mercurius, "então ele escolheu se chamar João 2º".

Ernesti ressalva que o nome do papa nada tem a ver com aquele adotado por quem ingressa numa ordem católica: enquanto nesse caso os religiosos e religiosas abdicam de seu nome batismal, passando a só utilizar o eletivo, "como sinal de sua nova vida", o papa "de algum modo" mantém o seu original e, por exemplo, festeja o onomástico no dia de seu respectivo santo.

São Francisco de Assis e São Paulo: o nome como inspiração

"Eu acho, sim, que em geral a escolha do nome é um programa", comenta o teólogo alemão. E desde o último papa isso está mais claro do que nunca, pois com essa opção ele evocou São Francisco de Assis (1182-1226), o filho de um comerciante que renunciou a todos seus bens terrenos para atender ao chamado de Jesus a uma vida de pobreza radical – um princípio que transmitiu à Ordem Franciscana que fundaria em 1209.

Por inúmeras vezes o papa Francisco também tomou claramente o partido dos pobres, dirigindo, assim como o santo medieval, o olhar para a beleza da Criação, hoje sob ameaça. A cidade de Assis, no centro da Itália, foi o local fora de Roma que ele mais visitou.

Nos tempos mais recentes, Paulo 6º (1963-1978, canonizado em 2018) foi outro exemplo claro de uma escolha de nome programática. O ex-arcebispo de Milão Giovanni Battista Montini se considerava um moderno apóstolo do povo, inspirado por São Paulo, que nos primeiros anos após a morte de Jesus levou o cristianismo da então Palestina para o resto do mundo.

Assim, em janeiro de 1964, apenas quatro meses após sua eleição, Paulo 6º foi o primeiro pontífice a tomar um avião e aterrissar em Amã, capital da Jordânia, a fim de visitar Terra Santa (área entre o Rio Jordão e o Mar Mediterrâneo, atualmente dividida entre Israel e os território palestinos): era a primeira de suas muitas grandes viagens por todos os continentes habitados.