Região disputada pelo Índia e o Paquistão vive escalada de tensão após ataque terrorista que matou 26 civis. Entenda quais são os principais grupos envolvidos, com foco em seu impacto local e conexões jihadistas globais.Em 22 de abril de 2025, a região de Jammu e Caxemira, administrada pela Índia, presenciou seu atentado mais fatal em duas décadas: atiradores dispararam contra turistas na cidade de Pahalgam,matando 26 civis. The Resistance Front (TRF), um grupo pouco conhecido, reivindicou o ato.
Nos dias seguintes, a Índia suspendeu um tratado de compartilhamento d'água com o Paquistão, vigente há décadas, anunciou o fechamento de uma fronteira importante, retirou os vistos dos cidadãos paquistaneses e acusou Islamabad de facilitar o terrorismo transfronteiriço.
Negando qualquer envolvimento, as autoridades paquistanesas retaliaram cancelando os vistos para indianos e fechando seu espaço aéreo para o país vizinho. Desde então, o conflito tem escalado continuamente.
Com uma área de aproximadamente 222 mil quilômetros quadrados, a Caxemira é dividida entre a Índia, o Paquistão e a China, mas é totalmente reivindicada pela Índia e pelo Paquistão, o que alimenta mais de sete décadas de conflito.
O ataque também atraiu a atenção para a rede de grupos militantes ativos na Caxemira. Embora muitos deles estejam oficialmente banidos do Paquistão, autoridades indianas afirmam que continuam a funcionar com apoio do serviço secreto militar paquistanês, operando livremente através da fronteira.
Alguns grupos mudaram de nome, outros se fragmentaram, mas, no geral, seus objetivos seguem alinhados: erodir o controle das áreas da Caxemira sob administração indiana e, em diversos casos, anexá-las ao Paquistão. Vários desses grupos já lutaram ao lado do Talibã e da Al Qaeda, e apresentam sua causa como parte de um jihad (guerra santa) global.
O panorama militante da Caxemira é fluido, com as facções trocando frequentemente de alianças e partilhando guerrilheiros, o que torna a insurgência difícil de detectar, conter ou eliminar.
Uma panorâmica dos principais grupos rebeldes atualmente ativos em Jammu e Caxemira:
The Resistance Front (TRF)
O The Resistance Front (TRF) emergiu em 2019 em resposta à revogação do artigo 370 da Constituição da Índia, o que privou Jammu e Caxemira de seu status especial que lhe concedia alguma autonomia. O TRF usa o nome alternativo "Resistência de Caxemira" nas redes sociais e fóruns online, onde teria assumido a responsabilidade pelo recente ataque em Pahalgam.
O grupo se apresenta como movimento secular, distanciando-se da retórica mais abertamente fundamentalista islâmica. As autoridades indianas, porém, asseguram tratar-se de um ramo do Lashkar-e-Taiba (LeT), utilizando suas redes e recursos logísticos, e o classificam como organização terrorista.
Lashkar-e-Taiba (LeT)
Fundado em 1990, o Lashkar-e-Taiba ("Exército dos Justos" ou "dos Puros") é um dos grupos islamistas mais notórios da região. Classificado como organização terrorista pelo Reino Unido, Estados Unidos, Austrália e a Organização das Nações Unidas, entre outros, seu objetivo primário é dar fim à administração indiana de Jammu e Caxemira.
Apesar de banido por Islamabad em 2002, o LeT continua ativo e sediado no Paquistão. O país tem sido acusado de não se empenhar o suficiente para coibir suas atividades, apesar da proibição. Nova Déli o acusou por diversas vezes de executar ataques armados proeminentes, não só na Caxemira como em toda a Índia.
Embora, como é sua prática, o grupo não tenha reivindicado esse atentado, vários membros seus foram condenados pela investida contra o Forte Vermelho, um dos monumentos mais famosos da Índia, deixando três vítimas em 2000. Integrantes do LeT estiveram também implicados nos atentados de 2008 a Mumbai, resultando em mais de 160 mortes e paralisando a capital financeira por três dias.
Ao contrário de outras facções salafistas-jihadistas do Paquistão, o LeT condena publicamente a violência sectarista contra outros grupos muçulmanos e proíbe seus militantes de atacarem o governo paquistanês.
Hizbul Mujahideen (HM)
Fundado em 1989, o Hizbul Mujahideen (HM) já foi a milícia mais destacada da Caxemira. Por muito tempo associado aos fundamentalistas do movimento paquistanês Jamaat-e-Islami, nos últimos anos sua influência se diluiu, sobretudo após as mortes de seus principais comandantes, entre os quais Burhan Wani, em 2016, e seu sucessor, Sabzar Ahmed Bhat, no ano seguinte.
Jaish-e-Mohammed (JeM)
Outro protagonista do conflito indiano-paquistanês é o radical sunita paquistanês Jaish-e-Mohammed, criado em 2000 pelo clérigo islamista Masood Azhar, depois de ele ser libertado da prisão na Índia, em troca dos 155 reféns a bordo de um avião sequestrado da Indian Airlines.
Apesar de proibido no Paquistão em 2002, o JeM segue operando abertamente em partes do país, assim como na Índia e na Caxemira sob administração indiana. Sua atual meta é anexar a Caxemira ao Paquistão.
O JeM executou diversos atentados de alta projeção, entre os quais o ataque suicida a bomba contra o prédio da assembleia estadual legislativa de Jammu e Caxemira, em 2001, com um saldo de 30 mortos; e, em 2019, a investida de um carro-bomba contra um comboio em Pulwama, matando pelo menos 40 paramilitares indianos.
As Nações Unidas, EUA, Reino Unido, Canadá e vários outros países classificam o Jaish-e-Mohammed como organização terrorista. Ele mantém conexões operacionais com o LeT, Talibã e Al Qaeda, com guerrilheiros do Paquistão e Caxemira, além de veteranos afegãos e árabes da guerra entre o Afeganistão e a União Soviética (1979-1989).
Al Badr (Jammu e Caxemira)
Formado no começo da década de 90 como dissidência do Hizbul Mujahideen, o Al Badr ("Lua Cheia") é notório por seus guerrilheiros com experiência de combate, muitos dos quais lutaram ao lado do chefe miliciano Gulbuddin Hekmatyar's Hizb-i-Islami no Afeganistão.
O grupo mantém laços com redes jihadistas internacionais. Consta que se confrontou com as forças da Índia ao longo da Linha de Controle, a fronteira de fato entre as tropas indianas e paquistanesas em Jammu e Caxemira e Ladakh – porém é difícil verificar tais relatos.
Ansar Ghazwat-ul-Hind (AGH)
Estabelecido em 2017, o Ansar Ghazwat-ul-Hind (AGH) representa a presença da Al Qaeda no conflito da Caxemira. Reconhecido oficialmente como um braço da Al Qaeda no Subcontinente Indiano (AQIS), ele se comprometeu ideologicamente a estabelecer naquela região um Estado islâmico sob a lei da xaria.
Seu fundador, Zakir Musa, ex-comandante do Hizbul Mujahideen, se separou devido a diferenças ideológicas. Desde então o AGH se posiciona como grupo jihadista purista, rejeitando metas nacionalistas em favor de objetivos fundamentalistas islâmicos globais.