O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, disse que o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes tem chances sofrer sanções aplicadas pela Casa Branca.
“Isso está sob análise neste momento e há uma grande possibilidade de que aconteça”, respondeu o representante do governo Donald Trump, após ser questionado pelo congressista republicano Cory Mills.
Neste texto, a IstoÉ explica quais são as chances de punição do magistrado.
Sanções e reações
Em sessão da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes dos EUA, na quarta-feira, 21, Mills perguntou a Rubio sobre reações do governo americano à suposta “perseguição” promovida pela Suprema Corte brasileira contra opositores, jornalistas e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O que o congressista mencionou e o secretário de Estado endossou consta na Lei Magnitsky, legislação americana que autoriza sanções contra indivíduos acusados de corrupção ou graves violações de direitos humanos. As medidas incluem bloqueio de bens e contas em território americano e mesmo a proibição da entrada no país.
Essa possibilidade foi classificada como afrontosa à soberania nacional pela ministra das Relações Institucionais do governo Lula (PT), Gleisi Hoffmann, e pelo deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), líder da bancada petista na Câmara.
A ex-presidente do PT falou em “conspiração de Bolsonaro [antecessor de Lula na Presidência da República] com a extrema-direita dos EUA em busca de intervenção estrangeira no Judiciário do Brasil” em publicação no X (antigo Twitter).
É vergonhosa a conspiração de Bolsonaro com a extrema-direita dos EUA, em busca de intervenção estrangeira no Judiciário do Brasil. A recente ameaça do secretário de Estado dos EUA ao ministro Alexandre de Moraes merece repúdio e evidencia o desespero do réu com o avanço do…
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) May 22, 2025
Já Lindbergh escreveu, em nome da bancada: “não admitiremos qualquer forma de submissão ou ingerência estrangeira em nosso ordenamento jurídico. Nosso compromisso é com um país justo, democrático e soberano, onde o povo decida seu destino sem interferências externas”.
Bancada do PT repudia ameaças dos EUA ao ministro Alexandre de Moraes
A Bancada do PT na Câmara manifesta repúdio às gravíssimas declarações de ameaças de sanções feitas pelo secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, contra o ministro do Supremo Tribunal Federal…
— Lindbergh Farias (@lindberghfarias) May 21, 2025
O que pode acontecer com Moraes
A articulação para que o governo dos Estados Unidos puna o magistrado ganhou força desde que Bolsonaro e 30 aliados se tornaram réus por uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022, em processo relatado pelo magistrado no STF. Se condenado, o ex-presidente poderá pegar 43 anos de cadeia.
Conhecido pelo bom trânsito com a direita americana, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) se licenciou do mandato parlamentar e foi morar nos EUA com esse objetivo. A principal aposta do grupo é na suspensão do passaporte de Moraes, que é uma prerrogativa de Trump, mas pode gerar ruídos diplomáticos.
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A IstoÉ procurou dois professores de direito internacional para entender as perspectivas de aplicação das medidas.
— Emanuel Pessoa é advogado especializado na internacionalização da empresas e professor da China Foreign Affairs University.
— Victoriana Gonzaga é advogada especializada em direito internacional e professora da FIA-SP (Fundação Instituto de Administração)
A decisão de sancionar o ministro depende só de Trump?
EP No geral, há uma regra discricionária, dado que um estrangeiro não tem “direito” a entrar em outro país, e faz isso em conformidade com o que é determinado pelas autoridades locais. Sendo assim, cada país se reserva o direito de estabelecer suas próprias regras, tendo o interesse nacional e as políticas internas como critérios suficientes no que toca a vistos.
VG Em qualquer país, a concessão, suspensão ou revogação de vistos é responsabilidade dos órgãos do Executivo, a quem cabe gerir a política migratória. Nos EUA, quem cuida disso é o Departamento de Estado, submetido à Casa Branca. Com razão em bases justificadas de política externa ou política de segurança, esse órgão tem a prerrogativa de cancelar ou suspender um visto a qualquer momento, o que pode ser provocado por uma orientação presidencial.
A suspensão do documento pode ser usada como ferramenta de pressão em um entrevero diplomático ou resposta a atos de autoridades estrangeiras que são contrárias aos interesses do país. O governo americano já fez isso com autoridades estrangeiras envolvidas em violações de direitos humanos e corrupção, mas essas decisões foram embasadas por sanções determinadas por entidades internacionais, o que não é o caso.
Há uma baliza para essa medida? E no que ela poderia implicar para as relações entre Brasil e EUA?
EP A conduta de Moraes já foi alvo de reprovação de diversos congressistas americanos, especialmente no que toca às punições ao X [o juiz chegou a bloquear o funcionamento da plataforma no Brasil], dado que muitos políticos dos EUA interpretam suas sentenças como restritivas à liberdade de expressão.
Dado que a decisão sobre o visto do ministro não depende do processo judicial e é discricionária do Poder Executivo, há possibilidade de definição por um argumento exclusivamente político, sem a necessidade de uma baliza do processo legal.
Em caso de suspensão, o recado será de que a Casa Branca entende que o ministro feriu regras legais, em particular as de liberdade de expressão, servindo como um reproche direto e claro dos EUA à conduta de Moraes e a chancela dada a ela pela Suprema Corte brasileira.
VG Não há proporcionalidade que justifique a suspensão do visto de Moraes, dado que ele não foi implicado em nenhum escândalo ou violação reconhecida dos direitos humanos. Além da falta de razão plausível, trata-se de uma autoridade de um país com quem os EUA nutrem boas relações, e portador do passaporte diplomático, que é protegido por tratados internacionais. A decisão, portanto, seria considera um ato hostil por parte de Trump.
No geral, governos priorizam o multilateralismo e a preservação de diálogo com outras nações, ainda que em condição de discordância, o que faz com que a suspensão seja improvável. A Casa Branca não demonstra afeição por abrir esse tipo de precedente.