Não é de hoje que as histórias em quadrinhos são vistas como formas de expressão artística de grande relevância cultural. HQs como “Nova York”, de Will Eisner, “Maus”, de Art Spiegelman, e “Sandman”, de Neil Gaiman, apenas para citar algumas, são criações que não ficam restritas ao universo da cultura pop. E, agora, outra tendência torna-se cada vez mais comum entre os artistas do estilo: adaptar grandes livros à linguagem das HQs, criando obras derivativas, mas nem por isso menos interessantes.

É o caso de lançamentos recentes, como “1984”, de George Orwell, que ganhou versão do artista brasileiro Fido Nesti para o selo Quadrinhos na Cia., da Companhia das Letras. O ilustrador, que já havia feito uma versão para “Os Lusíadas”, aplica seu traço minimalista de extrema precisão à releitura do livro publicado originalmente em 1949. Nesse belo tratamento gráfico, predominam as cores sóbrias e a edição de texto objetiva, características que permitem uma nova visão dessa distopia cada vez mais atual. Ironicamente, a primeira vez que Nesti leu o livro foi em 1984. “Lembro de ficar impressionado, com se um alarme tivesse disparado dentro da minha cabeça”, afirmou o autor ao blog da editora. “O Brasil ainda estava na ditadura militar, então foi inevitável a identificação com boa parte do texto.” A edição consumiu vinte meses de trabalho e Nesti admite que as inspirações visuais para os personagens principais, Winston Smith e Julia, foram o próprio quadrinista e a esposa. “Há muito de nós ali.”

FILOSOFIA “Sapiens”, HQ do best-seller do israelense Yuval Noah Harari: estilo mais leve e bem-humorado (Crédito:Divulgação)

Outro sucesso que ganha versão em HQ é “Sapiens – Uma Breve História da Humanidade”, do filósofo israelense Yuval Noah Harari. Com adaptação de David Vandermeulen e ilustrações de Daniel Casanave, traz um estilo mais leve do que o original, mas igualmente rico em informações. Com formato de reality show, traz a primeira parte do best-seller que já vendeu mais de 16 milhões de unidades em todo o mundo. Há releituras também de clássicos brasileiros, como “Quincas Borba”, de Machado de Assis. A adaptação de Luiz Antonio Aguiar e as ilustrações de Verônica Berta comprovam o caráter atemporal de sua história. Boas releituras jogam nova luz sobre esses livros e podem se tornar, em última instância, uma bela porta de entrada para o mundo da literatura.