Numa rara manifestação pública, Vladimir Putin admitiu ontem, dia 18, que as sanções impostas pelo Ocidente por causa da guerra na Ucrânia estão causando “dificuldades colossais” para o seu país. Citou especialmente o setor de alta tecnologia. Não é apenas a sucessora local da rede McDonalds que ficará sem batatas fritas até o final do ano, por falta de insumos. Toda a indústria de guerra e o setor de TI, um dos que mais cresciam na Rússia, sentirá os efeitos de a nação ter sido desligada das cadeias de suprimento, de desenvolvimento digital e de financiamento.

Um dia depois de admitir que a Rússia está diante de um “desafio imenso”, o ditador viajou para Teerã, onde se encontrou nesta terça-feira com o presidente Ebrahim Raisi e com o líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei. O encontro representa mais uma tentativa desesperada de romper o isolamento em que Putin mergulhou Moscou após a aventura na Ucrânia. No curto prazo, o russo está atrás dos drones que os iranianos podem suprir para melhorar a performance sofrível das tropas russas em território ucraniano, que avançam apenas pela força desproporcional da sua artilharia.

Além desse auxílio bélico, Putin também busca se contrapor à influência que Europa e EUA exibem no Oriente Médio, reforçada pela recente visita de Joe Biden à região, apesar das críticas aos parcos resultados concretos obtidos pelo americano. Biden não conseguiu o compromisso da Arábia Saudita com o aumento da produção de petróleo, mas o restabelecimento de laços com o país de Mohammad bin Salman, no ostracismo após o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, deixou claro o isolamento que o Irã enfrenta na região.

A aproximação de Rússia e Irã não é uma demonstração de força, mas um atestado de fraqueza. Os dois países são párias internacionais por desafiarem a comunidade internacional e tentarem por meio da força redesenhar o mapa da região. A Rússia, em especial, se beneficiou com a crise energética causada pela invasão da Ucrânia pois conseguiu mais divisas para financiar sua máquina de guerra. O petróleo subiu e, mesmo com as quedas nas exportações, o país conseguiu aumentar sua arrecadação. Com o preço do hidrocarboneto voltando aos níveis pré-guerra e com a queda nas exportações para a Europa (que será definitiva a partir do próximo ano), haverá um baque na economia russa a partir do segundo semestre.

Por isso, Putin está recorrendo até mesmo à ajuda da Coreia do Norte, mais um estado pária. Essa dinastia comunista está se dispondo a enviar trabalhadores para ajudar na “reconstrução” das regiões da Ucrânia anexadas pelos russos. O ministro das relações exteriores da ditadura norte-coreana alega que a Ucrânia não pode se queixar dessa ajuda pois o presidente Volodymyr Zelensky está se alinhando às “políticas hostis injustas e ilegais dos EUA”.

Muito se argumenta sobre a nova geopolítica mundial desencadeada pelo expansionismo russo, especialmente com um novo eixo de poder irradiando a partir do oriente com Xi Jinping. Mas é pouco provável que a China arrisque o seu crescimento meticulosamente planejado para se isolar juntamente com os parceiros que insistem em desafiar o mundo para proteger ditaduras voltadas para o passado. Que a Rússia dependa dos aiatolás e conte até com Pyongyang, um fóssil ideológico, dá uma medida da miopia estratégica que levou Putin às cordas.