O modelo de mandato coletivo, em que a cadeira parlamentar é assumida por um grupo em vez de um indivíduo, inaugurado em 2016, ganha adeptos para a corrida eleitoral de outubro. Novas regras levaram dirigentes partidários, do PSOL ao DEM, a abraçar a iniciativa, que ainda não tem previsão legal, mas já é debatida por políticos de diferentes posições interessados em se lançar no pleito.

A partir deste ano, os partidos não poderão mais se coligar na disputa por cargos proporcionais, como o de vereador. Isso impede que legendas peguem carona em “puxadores de voto” de outros partidos, uma vez que a votação de cada sigla será contabilizada individualmente.

A mudança abriu espaço para maneiras alternativas de viabilizar nomes nas urnas, como as candidaturas coletivas. Ao juntar na mesma chapa pessoas com bases de votação distintas, o modelo condensa capital eleitoral de candidatos de diferentes territórios e perfis sociais.

Para a cientista política da FGV-Brasília Graziella Testa, a prática traz alguns riscos. “Acho que o primeiro ponto é a questão de quem vai ser cabeça de chapa (candidato oficial), e o segundo ponto é o risco de isso ser uma maneira de burlar a quantidade de verba eleitoral que obrigatoriamente iria para mulheres. Se essas mulheres têm outros homens dentro de sua chapa, temos que pensar se o espírito da norma está sendo cumprido”, afirmou.

A primeira experiência reconhecida no Brasil foi o mandato coletivo de Alto Paraíso de Goiás. O grupo de cinco covereadores, que se diz “ecofederalista” e antipartidário, foi eleito em 2016 pelo PTN, atual Podemos. O formato também foi utilizado nas eleições de 2018 para alçar ativistas a cadeiras do Legislativo estadual.

O movimento Bancada Ativista se elegeu para a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e o movimento Juntas conquistou uma cadeira na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).

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Agora, esses grupos têm recebido ligações de pessoas interessadas em replicar o modelo, sobretudo no interior. O Juntas está organizando uma cartilha para explicar como a estrutura funciona. “Essa coletividade se dá nos processos de tomada de decisão, na divisão de responsabilidades, na equivalência dos salários e na representação”, diz a cartilha.

Informal

A prática, no entanto, ainda não é regulamentada pela Justiça Eleitoral. Embora na campanha seja anunciado um coletivo, na hora da votação só aparece a foto de uma pessoa nas urnas – o candidato oficial, que, se eleito, é quem pode votar em projetos, falar em plenário e ser remunerado pelo cargo. Além disso, nenhum dispositivo legal garante que o mandatário siga a estrutura coletiva prometida.

“Todo dia a gente acorda e reza para que a Monica não tenha mudado de ideia. O mandato é dela. Se ela quiser nos demitir a todos, ela pode”, disse a codeputada Raquel Marques, da Bancada Ativista, em tom de brincadeira.

Na visão de Raquel, há dois grupos de candidaturas coletivas ganhando força. “Tem o de pessoas que se encontram na luta, na sociedade, e acham que entrar na política é uma boa. Tem também os organizados pelos partidos, com casamento arranjado entre pessoas de médio perfil para torná-los potentes nas eleições”, afirmou ela.

Se na origem o modelo de mandato coletivo era prerrogativa da esquerda, agora a prática se espalha no espectro ideológico. No Recife, a candidatura de cinco líderes populares da comunidade de Coque será acolhida pelo DEM.

A iniciativa surgiu dos militantes. “Nos procuraram e nós abrigamos eles como filiados”, afirmou o presidente do diretório do DEM de Pernambuco, Mendonça Filho. “Com o fim das coligações, a elegibilidade de um candidato se torna mais complexa. Precisa de mais votos e preencher o quociente eleitoral. Juntar forças torna mais factível atingir a meta”, disse ele.

Em resolução da Executiva Nacional, o PT também incentiva a prática. “Disputaremos a eleição para vereadores e vereadoras sem a possibilidade de coligações proporcionais. Isso demandará maior esforço e criatividade do nosso partido, o que inclui debater os mandatos coletivos, rodízios com suplentes e outras formas alternativas para incentivar o maior número de candidaturas”, diz o texto.

A legenda já conta com uma pré-candidatura coletiva de professores em Valinhos (SP) e com outra em Porto Alegre, organizada por cinco jovens. Cada um deles é de uma zona da cidade – são duas mulheres e três homens, entre os quais dois são negros e três são da periferia.

Mulheres

O PSOL também já abriga pré-candidaturas coletivas em São Paulo e em Manaus, e a Rede tem discutido o tema internamente. Em Maceió, a deputada estadual Jó Pereira (MDB) organiza a promoção do modelo para potencializar a presença de mulheres no pleito.


Filiada ao Novo, a médica Roberta Grabert está no processo seletivo da legenda para disputar a vereança. Ela diz que “amaria” lançar uma candidatura coletiva, mas sua sigla não encampa a ideia. O jornal O Estado de S. Paulo procurou todos os partidos com representação no Congresso para falar sobre o tema. Dos treze que retornaram, o Novo foi o único que se colocou contra o formato. “O Novo não terá (candidaturas coletivas) e não acredita neste modelo”, afirmou a assessoria do partido. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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