A possibilidade de nomear a sala de reuniões do colégio de líderes como “Sala Miguel Arraes” acirrou os ânimos da sessão da Câmara na segunda-feira, 16. Os deputados oposicionistas Marcel Van Hattem (Novo -RS), Bibo Nunes (PL-RS) e Caroline De Toni (PL-SC) se manifestaram contrários à iniciativa. O projeto é de autoria de Maria Arraes (Solidariedade-PE), neta do ex-governador e ex-deputado pernambucano. Apesar da resistência, o plenário aprovou o requerimento de urgência.
Depois da votação, a deputada discursou em defesa do avô, um dos nomes mais proeminentes no combate à ditadura. Nunes rebateu com veemência: “Não podemos fazer apologia ao comunismo. Não podemos permitir uma sala, ainda mais de líderes, com o nome de um comunista”. Na verdade, em sua trajetória política, Miguel Arraes foi filiado ao PST, PMDB e PSB, nenhuma sigla comunista.
Em conversa com o PlatôBr, a deputada disse que se surpreendeu com a reação à proposta. “Eu não esperava porque é uma prática comum aqui da Câmara, de prestar homenagens a figuras que a representaram. Então, conhecendo a história do meu avô Miguel Arraes, e sabendo tudo que ele representa, não só para Pernambuco, mas para o Brasil, eu imaginava que a posição política dele não fosse causar tanta estranheza e até uma certa resistência da extrema direita quanto à aprovação desse projeto”.
Mesmo assim, a parlamentar não enxerga tanta dificuldade na aprovação da proposta, pois há diálogo com siglas de centro, centro-esquerda e centro-direita, além da esquerda. “Quem a gente tem, no meu mapa, contra projeto é apenas o PL e o Novo”, afirmou.
Van Hattem questionou a necessidade da urgência. “Entendemos que essa matéria não deveria ser pautada em requerimento de urgência, mas tramitar regularmente nas comissões”, disse. Maria explica que a pressa é pela intenção de homenagear o avô na data que marcará 20 anos de sua morte, dia 13 de agosto. “A minha ideia, mas também conversando com o presidente (da Câmara) Hugo Motta, e com os outros líderes que já apoiam a ideia, era fazer uma grande homenagem. Por isso que foi necessário fazer esse requerimento de urgência para ajudar o processo”.
Esse episódio lembra outro caso de intolerância no Congresso a vítimas da ditadura. Em 2014, o então deputado Jair Bolsonaro simulou uma cusparada no busto do ex-deputado Rubens Paiva, morto e desaparecido pela repressão do regime militar, que naquele momento era inaugurado em um espaço da Câmara, com a presença da família da vítima. A história de Paiva inspirou o filme “Ainda estou aqui”, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2025.
Quem foi Miguel Arraes
Arraes foi um advogado, economista e político brasileiro. De Pernambuco, foi governador por três mandatos, além de ter sido deputado federal três vezes e estadual duas. Foi também prefeito da capital Recife. No dia 1º de abril de 1964, Arraes foi deposto pelo golpe que instituiu a ditadura militar no Brasil. Depois de ficar preso em quartéis do Recife, foi levado para a Ilha de Fernando de Noronha. Depois foi para o exílio, na Argélia. Em 1990 fundou o Partido Socialista Brasileiro (PSB). Morreu aos 88 anos, em 13 de agosto de 2005.