O caminho do subprocurador-geral da República Alexandre Camanho cruzou com o de seu desafeto Joesley Batista, seis anos depois de se enrolar indiretamente na delação do empresário. Camanho foi flagrado por um grampo da Polícia Federal no então deputado Rodrigo Rocha Loures, delatado por Batista, tentando passar informações para o presidente Michel Temer.

Agora, Camanho tentou melar a redução do valor do acordo de leniência da J&F Investimentos, de Joesley e seu irmão Wesley Batista, com o Ministério Público Federal.

Retornando de férias, o subprocurador-geral fez questão de votar contra uma perícia contábil do próprio MPF que concluiu que o valor da multa imposta ao grupo em 2017 tinha erros de cálculo.

O coordenador da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, procurador Ronaldo Albo, alertou Camanho de que ele não havia tido acesso prévio ao relatório da perícia contábil e ao voto do relator, nem tinha acompanhado as alegações da defesa da J&F. Mas ele fez questão de votar, gerando mal estar entre os colegas.

O voto de Camanho foi anulado após um recurso da J&F. Decisão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de 2018 e o artigo 162 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (STF) vedam que ministros votem em casos em que não acompanharam as sustentações orais. Com isso, prevaleceu o voto do relator, de revisar o valor da multa para R$ 3,53 bilhões.

Camanho foi o secretário-geral da Procuradoria Geral da República na gestão de Raquel Dodge, escolhida por Temer. O ex-presidente enfrentou sua maior crise após vir a público o acordo de colaboração de Joesley Batista. Rocha Loures era o braço direito de Temer e foi filmado pela Polícia Federal recebendo uma mala com R$ 500 mil em propina.

Nos diálogos revelados pela PF em 2017, Camanho dizia ao então deputado que tinha “coisas importantes para dizer”, se ofereceu para sondar um jurista para assumir o Ministério da Justiça, sugeriu intermediar conversa do então presidente com “os meninos da Lava Jato” e pediu uma conversa com Temer afirmando que tinha “muitas coisas que precisa levar ao conhecimento do presidente”.

Camanho chegou a enfrentar procedimento disciplinar no Conselho Nacional do Ministério Público. Nenhum dos envolvidos foi condenado.

Em resposta à Coluna, o procurador Camanho avisou que “meu voto não foi considerado porque o coordenador entendeu que eu não poderia votar porque não estive presente na sessão anterior, em que se iniciou o julgamento”.

Ele emendou em sua defesa a tese de que foi o relator original do parecer e, agora, há um questionamento sobre sua posição: “Sucede que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica em permitir a um integrante de colegiado que vote, desde que se dê por habilitado – o que ocorreu. Fui o relator originário e meu voto foi, na ocasião do primeiro julgamento, acompanhado pela unanimidade da Câmara e, em seguida, sufragado pela integralidade do Conselho Institucional (nossa instância superior)”.

Este motivo que agora se aponta, a par de inédito, é improcedente: cuida-se de saber se o relator tinha atribuição para alterar decisões anteriores da Câmara e do Conselho. É uma questão técnica”.