Problemas econômicos da Rússia podem forçar Putin a acordo de paz?

Presidente russo enfrenta rombo crescente nas contas públicas devido a gastos militares e queda das receitas com petróleo. Cenário aumenta a pressão por fim da guerra na Ucrânia, avaliam analistas.Para além das vidas perdidas e destruição, a guerra na Ucrânia tem um custo alto. Para arcar com o crescende rombo orçamentário por trás de três anos e meio de invasão e ataques, o presidente russo, Vladimir Putin, e sua equipe econômica planejam aumentos de impostos e cortes de gastos em áreas sociais.

O projeto de orçamento para 2026 deve ser apresentado ao parlamento nesta semana, mas o presidente já sinalizou que concorda com os principais pontos acordados.

O governo anunciou planos para aumentar o imposto sobre o valor agregado de 20% para 22%, para ajudar no financiamento dos gastos militares do país, renegando uma promessa feita anteriormente por Putin de não aumentar os impostos antes de 2030.

Há também uma expectativa de que gastos não relacionados à defesa, incluindo alguns benefícios sociais, sejam cortados, para fazer frente às crescentes pressões causadas também pela queda nas receitas do petróleo.

O déficit orçamentário da Rússia cresceu para cerca de 4,2 trilhões de rublos (R$ 270 bilhões), o que representa cerca de 1,9% do produto interno bruto (PIB) do país – quase quatro vezes a meta original de 0,5% para 2025. O Ministério das Finanças estima que o déficit alvançará 5,7 trilhões de rublos até o fim do ano.

Elina Ribakova, especialista em economia russa da Escola de Economia de Kiev, acredita que Moscou continue com o que ela chama de um padrão estabelecido de manter altos gastos militares, fazendo cortes em outras áreas.

"As consequências são as mesmas que temos visto desde 2014", disse à DW. "Ou seja: tudo o mais é cortado, os gastos militares aumentam. Assim, educação, saúde, gastos sociais, proteção ambiental, tudo isso sofre cortes severos."

Chris Weafer, analista financeiro da consultoria Macro-Advisory, com sede em Moscou, lembra que os cortes orçamentários estavam previstos desde dezembro.

"Tivemos uma desaceleração deliberada nos gastos do governo em áreas não essenciais, o que significa essencialmente áreas militares não essenciais e talvez áreas sociais não essenciais", disse à DW.

Sinal vermelho

A economia da Rússia está em alerta vermelho há algum tempo, o que não passou despercebido por Donald Trump em suas tentativas de intervir em uma solução para a guerra.

"Putin e a Rússia estão em grandes dificuldades econômicas e este é o momento para a Ucrânia agir", escreveu o presidente americano em sua rede social, em 24 de setembro.

Ele também fez referência à crise de combustível que a Rússia vem enfrentando. Os ataques bem-sucedidos da Ucrânia com drones contra infraestruturas energéticas russas, como refinarias e terminais de exportação, levaram à escassez de vários tipos de combustível, aumento de preços e longas filas.

Uma das principais causas das dificuldades econômicas é a queda contínua das receitas do petróleo e do gás. O aumento vertiginoso dos preços desses itens e o entusiasmo dos novos compradores na China e na Índia formaram a maré perfeita para a economia da Rússia em 2022 e até em 2023, mesmo com as sanções dos países ocidentais e a redução da dependência da União Europeia.

No entanto, a queda do preço do petróleo, o fortalecimento do rublo, os ataques às refinarias e o impacto contínuo das sanções prejudicaram a principal fonte de riqueza do país. As receitas estatais de petróleo e gás devem cair cerca de 23% em relação ao ano anterior em setembro, um cenário econômico sombrio para o Kremlin.

As previsões oficiais apontam para um crescimento de 1% do PIB este ano, bem abaixo dos 2,5% previstos inicialmente. Em setembro do ano passado, a inflação galopante apontava para um superaquecimento da economia, impulsionado por aumentos maciços nas despesas com defesa.

Esses gastos mais que quadruplicaram desde 2021 e totalizaram cerca de 16 trilhões de rublos (R$ 1 trilhão) de janeiro a junho de 2025.

Chris Weafer, consultor de investimentos que atua na Rússia, explica que a narrativa oficial do governo russo é a de que se trata de um "esfriamento controlado", com aumento de juros feito pelo banco central para conter a inflação e reduzir os gastos crescentes dos consumidores —medida que tem funcionado em grande parte.

Cortes orçamentários

No entanto, ele afirma que o orçamento é "insustentavelmente alto" e que, se não for reduzido significativamente nos próximos anos — incluindo os gastos militares —, isso ameaça "destruir toda essa narrativa de que a Rússia é estável, que a economia está bem, que a vida das pessoas não é afetada e que tudo está ótimo".

"Você destruiria a economia", disse Weafer, que acredita que Putin e o Kremlin estão cada vez mais abertos à ideia de um acordo de paz ser fechado em breve devido à crescente pressão econômica.

"A pressão orçamentária interna em relação à necessidade de manter a estabilidade é um fator significativo e que aumenta a sensação de que isso precisa acabar o mais rápido possível", disse ele.

Elina Ribakova não está tão otimista. "Quando iniciaram a invasão de 2022, eles estavam cientes dos custos econômicos. Eles os calcularam e, no nível político, decidiram que eram aceitáveis", ponderou.

Sanções secundárias

Dadas as dificuldades enfrentadas pela economia russa, cresce a pressão sobre a UE e os EUA para que reforcem as sanções existentes para uma negociação de paz bem-sucedida.

Trump apelou recentemente à Europa que interrompesse completamente suas compras de gás russo, principalmente do gás natural liquefeito (GNL). Embora em menor quantidade, o bloco continua a comprar petróleo russo, por meio de produtos refinados.

Os Estados Unidos também consideraram a possibilidade de aplicar sanções secundárias a países como a Índia e a China, que compram grandes quantidades de petróleo russo. Tal medida poderia agravar seriamente os desafios econômicos de Moscou.

Ribakova acredita que, com a economia russa mais vulnerável, agora é o momento de aumentar a pressão com mais sanções.

No entanto, ela aponta para o fato de que regimes fortemente sancionados, como os da Venezuela, Coreia do Norte e Irã, têm permanecido no poder apesar da calamidade econômica, como prova de que as sanções por si só não salvarão a Ucrânia.

"As sanções podem resolver parte dos problemas, mas não podem resolver todos", disse Ribakova.

Chris Weafer acredita, mesmo assim, que as sanções – em particular as secundárias – poderiam forçar Moscou a se sentar rapidamente à mesa de negociações.

"Se você tivesse, digamos, outra queda de 20 a 30% nas receitas de exportação de petróleo, isso levaria o orçamento a um território insustentável e poderia forçar mudanças massivas na dinâmica interna."