O que era claro, para mim, hoje tornou-se também assustador, e, por que não dizer?, desesperador. Após o vídeo que gravei semana passada, logo depois de uma discussão com um vizinho xenófobo, que viralizou por todo o País, sendo assistido até o momento por mais de 1 milhão de pessoas, comecei a receber uma enxurrada de mensagens com relatos os mais diversos de casos de racismo, xenofobia, homofobia, transfobia e aporofobia (preconceito contra os pobres).

Quando criança, senti na pele em Brasília, onde nasci e vivi até os 10 anos de idade, o antissemitismo ainda resistente no País. Lembro-me de episódios, não tão esporádicos, em que era chamado de “judeu” por outras crianças, obviamente por terem ouvido de seus pais, que minha descendência representava algo malígno como, por exemplo, a morte de Jesus Cristo ou, sei lá, canibalismo infantil, rituais com sangue humano e outras barbaridades típicas da época (falo do final dos anos 1960 e início dos anos 1970).

Já há algum tempo, principalmente depois da massificação das Igrejas pentecostais, o judaísmo se tornou “cult”. Após anos de apoio da esquerda mundial aos grupos terroristas islâmicos, que pregam a destruição do estado judeu e o extermínio de seu povo, as chamadas direitas – muitas delas, na verdade, grupos reacionários e extremistas – adotaram Israel como aliado, ou porta-voz indevido de suas bandeiras fundamentalistas. Infelizmente, aliás, muitos judeus aceitaram o papel de “amigos” de nazifascistoides.

Assim, há muitos anos, mas há muitos anos mesmo, eu não percebia mais o antissemitismo ao meu redor, exceto um caso aqui e outro ali, geralmente distantes de mim. Paralelamente, contudo, para minha igual tristeza, já que não distingo o ódio aos judeus de outros tipos de ódio, pois todos inaceitáveis a meu sentir, vi crescer a intolerância contra homossexuais e pobres, e, mais recentemente, de forma espantosamente rápida e agressiva, contra a população do norte e do nordeste do Brasil, sobretudo após domingo, dia 30 de outubro.

Ouso afirmar, sem medo de estar errado, que há mais de 50 anos, no mínimo, o País não assistia a tantos casos de violência explícita por questões análogas ao racismo. Para piorar, grande parte vem ocorrendo em estratos sociais até então, digamos, blindados, como entre crianças e adolescentes. Mais espantoso e assustador ainda, é constatar que mesmo entre judeus esses casos vêm ocorrendo com relativa frequência. Eu mesmo tenho amigos – ou tinha, o que é melhor neste caso – que não se envergonham de atacar os nordestinos.

Felizmente, por outro lado, a maioria absoluta – e absoluta significa absoluta! – dos judeus, não apenas não tolera como combate qualquer forma de preconceito étnico, religioso, político e/ou de gênero, vide notas oficiais de entidades judaicas e representantes de escolas e federações de judeus por todo o País. Nessa hora tão triste e dramática, o “lugar de fala” resulta em importância ainda maior, por isso, pessoalmente, pois não falo nem represento nada nem ninguém além de mim mesmo, venho expressando preocupação e solidariedade, bem como apoio incondicional a quem sofre tamanha barbárie, infelizmente, ainda impune no Brasil.