O chefe do governo espanhol em exercício, o socialista Pedro Sánchez, apresentou ao Parlamento nesta segunda-feira (22) um programa com claro viés social e progressista, com o qual ele espera convencer a esquerda radical do Podemos a apoiá-lo em um governo de coalizão.

“Temos a possibilidade de levar adiante tudo aquilo com que concordamos: a promessa da esquerda, um progresso ambientalmente sustentável e a distribuição justa deste progresso”, afirmou Sánchez na sessão de posse.

Depois de três meses de bloqueio seguido às eleições legislativas de 28 de abril, o discurso de Sánchez acionou a contagem regressiva para seduzir um Congresso, onde seu partido, o PSOE, conta com apenas 123 de 350 deputados.

Os 42 deputados do Podemos, juntamente com o apoio e a abstenção de pequenos partidos regionais, são a fórmula mais factível para que garanta os votos antes da quinta-feira, quando terminará o debate pela investidura.

Por isso, apresentou um leque de propostas claramente escoradas na esquerda: aumento do salário mínimo, que está em 1.050 euros mensais desde janeiro, além de reindexar as pensões pela inflação e dedicar 5% do PIB para a Educação. Tudo isso – garante ele – mantendo as metas de redução do déficit e da dívida em 2% e 95,8% do PIB, respectivamente, até o fim do ano.

Também prometeu a revogação de uma polêmica lei de segurança, a legalização da eutanásia, o controle dos aumentos de aluguel, ou uma lei para combater as mudanças climáticas.

O candidato socialista, no poder desde junho de 2018, disporá de duas oportunidades: a primeira em uma votação na terça, quando precisará da maioria absoluta, e a segunda na quinta-feira, quando necessitaria apenas de uma maioria simples.

– Tensões com o Podemos –

No entanto, o debate evidenciou que o pacto se antecipa distante. As boas relações entre o PSOE e o Podemos no curto primeiro mandato de Sánchez viraram desconfiança.

“Não vamos nos deixar pisotear, nem humilhar por ninguém”, advertiu o líder do Podemos, Pablo Iglesias, após um tenso debate com Sánchez, onde chegou a dizer que se não aceitar um governo conjunto, “não será presidente nunca”.

Uma coalizão hipotética, inédita na história recente da Espanha, não seria do agrado do líder socialista, que se inclinava a um governo solo, com o Podemos como sócio.

A situação se desbloqueou na sexta-feira, quando Iglesias recusou-se a entrar no Executivo, uma das exigências de Sánchez para pactuar uma coalizão.

Depois de dois dias de negociações discretas, estas parecem paralisadas nas funções que a esquerda radical irá assumir.

“Não nos proponham ser uma mera peça decorativa no seu governo porque isso não podemos aceitar”, disse Iglesias.

“Vão dificultar muito as coisas para nós” mas “estou disposto a correr este risco”, declarou o candidato socialista.

Se a investidura fracassar e não se formar um governo nos próximos dois meses, o país se lançaria na convocação antecipada de eleições legislativas, as quartas em quatro anos.

– Plano B: abstenção da direita –

Diante desse cenário de instabilidade, Sánchez voltou a propor uma fórmula alternativa à coalizão com o Podemos: uma abstenção do outro grande partido espanhol, o conservador Partido Popular, e do centro-direitista Ciudadanos para poder governar sozinho.

“Não peço que votem a favor, que aplaudam, o único que lhes peço é que facilitem a constituição de um governo na Espanha”, insistiu o socialista.

A proposta desconcertou o Podemos – “está demonstrando que só está negociando conosco porque não lhe resta outra saída”, criticou Iglesias – e tampouco teve efeito na direita.

“Como vou dar carta branca àquele que tem cumplicidade com quem quer destruir a Espanha?”, questionou o líder conservador Pablo Casado em alusão ao diálogo iniciado por Sánchez com os líderes separatistas da Catalunha.

Assim, o socialista parece condenado a obter os meios apoios que o levaram ao poder em junho de 2018 em uma moção de censura contra o conservador Mariano Rajoy: Podemos, nacionalistas bascos e separatistas catalães.

Pelo menos um dos partidos separatistas catalães se inclina a facilitar sua investidura se pactuarem um governo de coalizão com o Podemos.

Mas os socialistas preferiram não depender do seu apoio depois que, em fevereiro, coincidindo com o início do julgamento dos líderes catalães implicados na tentativa de secessão de 2017, os separatistas derrubaram seus orçamentos e precipitaram a convocação antecipada de eleições.