Nosso presidente deu, no dia 23 de maio de 1999, uma entrevista para o programa Câmera Aberta da Band com 43 minutos de duração. A entrevista é antológica. Coisa para ser estudada, considerando as atrocidades proferidas por nosso Messias, notadamente pela frase em que afirma, que se um dia fosse presidente, fecharia o Congresso. Mais exatamente, Bolsonaro afirma aos 27 minutos: “Daria golpe no mesmo dia! Não funciona… o Congresso de hoje em dia não funciona.” Não só isso.

Aos nove minutos, afirma que “… o Congresso só existe para dizermos que temos uma democracia”. Assistir a toda essa entrevista é um exercício esclarecedor. Passados 20 anos, nosso presidente, na época deputado federal pelo PPB, pensava exatamente igual ao que pensa hoje. Não mudou uma única linha em seu discurso e suas convicções. Nada do que Bolsonaro fala em suas entrevistas ou escreve no Twitter hoje é diferente do que afirmou na tal entrevista. Ao menos isso temos que admitir, sua coerência.

Há que se ter estômago para enfrentar os 43 minutos da entrevista nos dias de hoje. Mesmo assim, resolvi encarar para destacar algumas de suas principais ideias, que ajudam a entender o atual momento. A afinidade que tem com a morte, por exemplo, que vem demonstrando durante a pandemia onde, para ele, não é grave que alguns morram, fica evidente em outra de suas falas famosas.

A afirmação de que a ditadura “deveria ter matado mais uns 30 mil, começando pelo FHC”.

Aos 16 minutos, afirma que “sonega tudo que pode”.

Aos 17, que “votaria no Lula porque ele é honesto”.

Aos 26, que “o Planalto seria um ótimo lugar para fazer o teste de uma bomba nuclear”.

Está tudo lá. Há mais de 20 anos.

Os absurdos são tantos, que suspeito que em qualquer outro país, Bolsonaro teria sua carreira política encerrada ao terminar a entrevista. Aqui não.

Aqui, ao que tudo indica, até ajudou a elegê-lo.

Não posso acreditar que boa parte do país pense como ele.

Prefiro imaginar que é a forma com que ele se expressa que apela ao eleitor menos questionador.

O conteúdo, quero crer, o brasileiro médio sequer se importa.

Bolsonaro foi eleito num momento onde boa parte do país estava indignada.

Indignada com o PT, com a corrupção, com os escândalos que se sucediam.

E Jair Bolsonaro tem esse discurso de político antigo que fala gritando e gesticulando, que pode ser lido como indignação, se você não prestar a atenção no que está dizendo.

Além disso, moldamos a democracia ao nosso jeitinho.

Por aqui, impeachment não é um último recurso.

É apenas uma das etapas de um mandato.

Nossa forma de governo é o Presidencialismo de Impeachment.

Não temos treino, nem cultura, nem vontade para perder tempo escolhendo um presidente.

Então elegemos aquele que grita mais alto e depois a gente vê no que dá.

Collor, por exemplo, era conhecido apenas no Nordeste.

E mesmo sem ser conhecido por boa parte do país, aterrissou no Planalto.

Deu no que deu.

Dilma idem.

Uma ilustre desconhecida alçada ao cargo máximo do país.

Deu no que deu de novo.

Bolsonaro estava longe de ser um desconhecido, pois sua performance nas eleições em que foi candidato a deputado lhe deram enorme notoriedade.

Para quem pesquisou ou assistiu apenas essa entrevista, nada do que ele diz hoje, surpreende.

Mesmo assim, a Nação está surpresa com seu comportamento.

E, como mandam as regras do Presidencialismo de Impeachment, 29 pedidos já estão nas mãos, ou na gaveta, de Rodrigo Maia, para que a nossa democracia tupiniquim siga seu curso.

Dizem que esse nosso comportamento são as dores de crescimento de uma jovem democracia.

O problema é que antigamente doía. Hoje, mata.

São tantos os absurdos ditos por Bolsonaro naquela entrevista, em 1999, que suspeito que, em qualquer outro país, teria sua carreira política encerrada ao terminar o programa. Aqui não